Capítulo V - O pedido

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Audrey não precisou abrir os olhos completamente para descobrir que os machucados não sumiram enquanto dormia. Seu corpo demorava a se recuperar: ela concluiu de imediato; ignorando o fato de que nenhuma pessoa no mundo poderia apresentar recuperação tão rápida quanto a que esperava.

Gemendo de dores, remexeu-se na cama buscando fugir do clarão que entrava pela janela. Apesar do frio, ironicamente o sol ardia lá fora.

— Maldito seja! — Esbravejou, antes mesmo de tirar o rosto das almofadas. Mal acordara e já amaldiçoava o provável céu limpo que surgiu quando não podia aproveitá-lo. Pareceu que o dia se regozijava por deixá-la de fora.

Os mal dizeres prevaleceram, até resolver aceitar que merecia aquilo, toda a situação: o pescoço dolorido por provavelmente ter dormido de mau jeito, a presteza com que Deus brincava e desdenhava dos seus pedidos...

Uma enferma, podendo nem andar! Faltava-lhe essa para completar a melancolia de passar o verão distante de Sprilow. Decepções maiores que as que vinham se arrastando, provavelmente ocorreriam ao decorrer do dia. Não esperava por menos. A não ser que continuasse a fingir dormir sempre que Caroline entrasse no quarto. Ou então, imóvel, muda e surda, far-se-ia de estátua diante de todas as frustrações jogadas sobre si. Mas seria absolutamente impossível se manter calma e indiferente as acusações da Srta. Hall, pois esta, apesar de esbanjar um rosto tão belo e quase angelical, quando desejava conseguia ser insuportável.

De forma alguma Audrey se julgava no direito de desmerecer as acusações de Carol, afinal o baile a ser oferecido no Castelo certamente seria o evento mais excitante e posteriormente comentado de Northumberland; no entanto, não conseguia deixar de frustrar-se com isso. Precisava enfrentar a prima, mas gostaria de adiar esse encontro por toda a eternidade.

Sem perceber quem estava do outro lado do quarto, mas muito querendo ver o que perdia e, consequentemente, martirizar-se, ela sentou na cama, voltada para a janela. Se ninguém a visse, com alguns esforços conseguiria se movimentar, subir no peitoril e apreciar a vista. Suspirou, em um impasse. Aqueceu as mãos, um tanto frias, e então as usou para soltar o cabelo parcialmente preso.

Uma voz áspera, vindo por trás dela, fez-se ouvir:

— Quando libertos, dão-lhe um ar silvestre, peculiaridade esta que não gosto de ver em moças. Mas a senhorita, mesmo em sua indocilidade, possuí beleza e delicadeza, algo que muito aprecio.

Audrey reconheceu o interlocutor destas palavras, o timbre e a rouquidão eram inconfundíveis; portanto, ficou petrificada. Estava relativamente acostumada com a indelicadeza do Duque, mesmo assim não se sentia confortável quando ocorria. Tomando o conhecimento das implicações da presença dele, respirou fundo antes de virar-se para encontrá-lo e vê-lo nas de praxe vestes pretas e botas de montaria.

As feições de Robert, apesar do que acabara de dizer, nada mais demonstravam que um extremo desinteresse. Porém, estava inseguro, e deixou-se arrancar um baixo e imperceptível suspiro de alívio, ao receber atenção dos olhos verdes astutos da dama a sua frente, e notar as bochechas dela em tom saudável. Quando a resgatou em estado tão fragilizado, temeu verdadeiramente pela saúde dela, de modo que precisava vê-la recuperada urgentemente ou correria sérios riscos de ser envenenado pela preocupação. E para ser honesto, não compreendia por que se sentia assim, apenas sabia que era inevitável, alguma coisa nela o puxava, precisava vê-la todos os dias, por mais que apenas a admirasse de longe. Mas hoje, especialmente hoje, depois de tudo que ocorrera na noite passada e, principalmente, depois de ter sentido o corpo dela tão junto ao seu, observá-la de longe ou ter notícias por meio de terceiros não seria suficiente.

A Srta. Morse também o analisava as escondidas, Robert sabia disso, muitas vezes seus olhares se cruzaram furtivamente, e embora sempre tenha percebido mesclas de piedade e incompreensão nos olhos verdes, ele encontrava algum conforto neles. Esse mesmo conforto aquecia-lhe o peito enquanto aguardava uma palavra dela.

O Duque CampbellOnde histórias criam vida. Descubra agora