🐯 Tefari 🐯

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Antes do nascer do sol, estávamos de pé ao lado da muralha que separa Trivena da Floresta de Escamas, todas trajando pesadas capas escuras para não chamar atenção.

— Achei que Bomani iria conosco.– Jade diz ainda amedrontada com a ideia de s
aventurar-se fora das defesas de Trivena.

— E vai. Ele está bem ali.— aponto com o queixo na direção em que Bomani vem.

Ele guia dois cavalos e carrega uma pequena bolsa de couro.
— Olá, donzelas. Trouxe nossa carona.

— Não vamos pelo céu? Seria mais rápido.– interroga Lisie.

— Como faremos para que não vejam dragões e grifos voando por aí? A cavalo é mais discreto.– Bomani explica.– iremos em dupla, vocês sabem cavalgar?

Bomani se dirige as duas princesas.
— Eu sei, não é tão diferente de um grifo.– Lisie responde pegando as rédeas do animal.

— Conseguiu o mapa?– pergunto a Bomani.

Ele tira da bolsa um pergaminho gasto e abre.
— Sim, foi um tanto caro.–reclama.– mas o importante é que está legível. Tem uma passagem escondida entre a muralha. Logo depois encontraremos uma trilha, o vendedor disse que é estreita então teremos que ir devagar.

— Isso vai demorar muito.– Jade queixar-se.

— Sim, mas se tudo der certo voltaremos pela madrugada.– Bomani explica.

— Se tudo der certo?– Lisie repete intrigada.– o que pode dar errado?

— É uma floresta perigosa, nunca a desbravamos, não sabemos ao certo o que encontraremos além de dragões. Podemos ter imprevistos.– digo encarando as duas, Jade faz uma careta, enquanto Lisie não parece se importar tanto.

— Então vamos logo.– a princesa Lisie monta no cavalo e em seguida Jade faz o mesmo.

Bomani e eu mesmo montamos no outro e seguimos ao lado do muro a procura da passagem guiados pelo mapa.

Calvagamos em silêncio, porém suponho que na cabeça de cada um há um falatório, eu mesma estou tentando me convencer de que vai dar tudo certo. Tem que dá.
Enfrentaremos perigos, certamente, mas temos que correr esse risco.

Não posso me conformar com a ideia de que nasci apenas para ser uma guerreira qualquer, vendo meu povo perecer. Quando eu morrer quero deixar um legado, uma história, não ser uma lenda e sim um fato, quero falem do meu nome, e quando assim o fizerem lembrem que eu fui uma mulher terrena que governou gloriosamente sobre Trivena e Zofa, que mostrou a todos sua força e persistência.
Rainha Tefari, a terrena que fez os celestiais se curvarem em sua presença.
Disseram que seria impossível, mas eu sou a filha do impossível.

— É aqui.– Bomani desperta-me dos meus pensamentos.

Paramos diante de uma estreita fenda no muro.
— Como passaremos com os cavalos? É mui estreito.– argumenta Jade.

—Temos que empurrar aquele lado da parede.– Bomani aponta para a parede esquerda.

Desço do cavalo e vou até a fenda, sem demora empurro a parede para o lado, ouvimos um som abafado de pedra deslizando e de algum jeito a parede empurrada dá espaço para uma larga passagem.

— De onde veio tanta força?– Lisie está com os olhos arregalados.

Sorrio montando no cavalo novamente.
— Corre o sangue de Werra em mim.

Lisie parece desconfiada enquanto atravessamos a passagem.

Empurro a parede para o seu lugar original e seguimos viagem floresta adentro.

A mata é bem densa, com moitas altas e galhos pontudos para todo lado, se não fosse a fina trilha seria impossível atravessá-la. É difícil ver a luz do sol, pois as copas das árvores mais altas impedem a passagem de luz, deixando o clima frio.
Inicialmente fez-se silêncio na floresta devido a nossa presença, mas com o passar do tempo o ambiente voltou a ser preenchido com sons de pássaros, das folhas e galhos de árvores e de alguns animais. Suponho que não nos julgaram uma ameaça.

Cavalgamos lentamente, e de vez em quando somos surpreendidos por galhos tentando nos derrubar dos cavalos.

Apesar da Floresta de Escamas ser conhecida como a floresta dos dragões,  é difícil encontrar um aqui a todo momento. A explicação se dá porque sua morada é nas montanhas logo a frente, a floresta serve como provimento de sua alimentação. Ou seja, corremos o risco de virarmos comida de dragão.
Será que eles nos queimam primeiro antes de nos engolir?

Decido perguntar a Jade, mas mudo de ideia rapidamente quando escuto algo.
— Parem.– sussurro aos outros que me olham intrigados.– temos companhia.

Sei não se tratar de um dragão pois o som não é parecido com o barulho de asas, nem de algo pesado.
Com certeza é algo pequeno e rápido.

De uma árvore de tronco grosso surge três homens.
Quando os vejo quase sinto vontade de rir.
— Piratas?– Bomani tira as palavras da minha boca.

Sim são três piratas. Mal vestidos empunhando espadas. O do meio parece ser o capitão, pois usa uma longa capa verde cheia de fivelas, com cinto carregado pequenos objetos, ele é negro e alto, sua cabeça é rapada nas laterais e no meio uma longa trança. Os outros dois devem ser seus subordinados, um baixo e barbudo ou outro magrelo e ruivo.

— Ora, ora, que bons ventos!– o capitão nos observa com um sorriso malefício.

— Deixo-nos passar em paz e viverão.– Bomani avisa.

Os três riem.
— Acho que é o contrário, camarada. Dêem o que tem de valor e viverão.– ordena o capitão.

— Não temos nada de valor. Deixe-nos passar!– a voz de Jade sai trêmula.

— Os cavalos parecem ser bem valiosos.– o pirata baixo diz.

— O que piratas fazem em terra, afinal? Não deviam estar saqueando navios?– interrogo.

— Nosso navio foi roubado...

O ruivo começa a dizer mas o capitão o interrompe:
—Quieto! Isso não vem ao caso. Em terra firme ou nos mares sempre saquearemos, agora passem os cavalos.

— Vou lhes dar outra coisa.– desimbainho Graciosa no mesmo instante em que surge várias criaturas.

Anões aparecem pendurados em árvore, por entre as moitas e troncos, todos segurando flechas.

— Isso só pode ser alguma brincadeira.– reclamo– o que diabos piratas e anões fazem aqui?

—Como vêem, estamos em maior quantidade. Agora, os cavalos.– o capitão pede.

É lógico que não me intimido com a cena, mesmo que as flechas sejam disparadas posso facilmente pará-las no meio do percurso. Só que outro som me chama atenção, e dessa vez é de algo grande e pesado.

— Um ogro!?– Bomani diz espantado a minha frente.

A fera surge atrás de nós, grande como uma montanha, sua pele é de cor esverdeada, mais parece uma fruta apodrecida, seus dentes irregulares estão expostos e seus olhos externam ódio. Ele grunhe e podemos sentir seu hálito fedido de longe.

Nada pode ser mais estranho que encontrar piratas, anões e um ogro, todos reunidos em uma floresta prontos para nos matar.
Quanta sorte.

Filha Do ImpossívelOnde histórias criam vida. Descubra agora