Não estou conseguindo mais dormir depois que cheguei do jogo, estou apenas deitado com a mesma roupa e olhando para o teto. Formas se movem sobre meus olhos, formas complexas com filamentos infinitos que imaginamos ver na escuridão. Em minha mente uma sucessão de pensamentos cobre as camadas como uma película, apesar de eu não me concentrar apenas em um pensamento, por que cada um deles possui um significado diferente.
Estou vendo os flashes do jogo cruzando minha cabeça, posso sentir isso até mesmo no ar, como se estivesse distorcendo o espaço-tempo.
Perguntas surgem acompanhando as memórias, questões sobre o motivo de eu tê-lo beijado, ou a atração que eu comecei a sentir por ele. Sim, sinto-me atraído por Ed de uma forma que eu jamais conseguiria explicar, de uma forma que eu jamais sentira por alguém, muito menos por Alisson. Ao mesmo tempo em que tudo parece tão confuso, também sinto as peças movendo-se pelo tabuleiro, elas deslizam e se completam, resolvendo enigmas.
Outro ponto que começa a ser esclarecido é a respeito da minha sexualidade, pois finalmente acho que estou me descobrindo, estou descobrindo como funciona o meu corpo, o que me deixa arrepiado, o que me deixa ruborizado e o que faz meu corpo pegar fogo.
***
Bato a porta do meu armário com força quando fica claro que Eduardo não vai aparecer em seu armário hoje, isso me deixa frustrado em proporções catastróficas. E isso não é bom, considerando que eu tenho aula de geografia agora e o professor Diego é um pé no saco. Literalmente.
Jogo a mochila por sobre o ombro e empurro a porta da sala com o pé, isso acaba atraindo uma indesejada atenção de um professor que se diz autêntico e conservador, seja lá qual merda isso signifique. Mesmo tendo vinte e poucos anos, Diego é um bosta de ser humano. Por incrível que pareça ele apenas balança a cabeça me recriminando pela atitude.
Sento em minha carteira e antes mesmo que ele comece a falar, eu já sinto o sono de uma noite mal dormida chegando. Abro o livro de geografia em uma página qualquer sobre relevos – porque essa é única coisa que eu conheço sobre geografia, e enfio minha cara em cima dele sem me importar com o fato de Diego estar fazendo perguntas aos alunos sobre o conteúdo.
Ouço quando a porta da sala sendo aberta e no mesmo instante reconheço o perfume, mas me esforço para não levantar a cabeça e dar de cara com ele. Eduardo se desculpa pelo atraso e logo chega ao seu lugar bem atrás de mim. Ele não diz nada, não reclama de nada, na verdade eu nem o ouço respirar direito. Resisto ao impulso de querer olhar por sobre o ombro para dizer qualquer banalidade sobre a outra noite ou o que acabou acontecendo em seguida.
Sei que eu deveria odiar Ed provavelmente, por causa de todo o lance que vem acontecendo desde os primeiros dias, mas há uma parte de mim que grita pedindo uma aproximação. Droga, eu mal o conheço!
Perdido em meus devaneios, descubro que Diego já está me chamando pela terceira vez seguida. Levanto a cabeça e ergo minha mão para demonstrar meu sinal de vida.
- Você está prestando atenção na aula?
Não tenho porque mentir.
- É óbvio que não, sua voz é irritante.
Bom, se meu objetivo era cutucar uma fera, acho que eu consegui, pois a fera aperta os olhos numa típica demonstração de ódio.
- Então estava dormindo? – Ele pergunta.
- E sonhando – acrescento. – Você iria adorar meu sonho, eu não estava vestindo nada.
Diego bate o livro na mesa com tanta força que faz minhas têmporas doerem, enquanto isso o restante da turma explode em risos, mesmo Diego ordenando que todos fiquem em silêncio. Ele aponta um dedo para mim, aquele dedo em riste é um grande sinal de que ele fará um de seus monólogos tristes.
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Disforia - Início
Fiksi Remaja"Ele está lá. Parado, rígido, seguro, confuso, obscuro. A metade de um tudo. A expansão do universo. A estrela colapsada em outra estrela. Balanço a cabeça sentindo raiva. Trinco o maxilar tão forte que chega a doer, avanço para cima dele com toda...