Capítulo 4 - Fim do constrangimento

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Já se passou uma semana e eu ainda não arrumei um apartamento pra mim. Isso é tão constrangedor! Eu estou atolada de serviço... Ser chefe do Trauma é cansativo, todo mundo me pede pra cobrir e eu tenho que ir, senão é o meu setor que se passa por ruim. Estou trabalhando por dois e dormindo por um. Quando chego na casa do Jackson eu durmo assim que deito na cama e já acordo atrasada para vir pra cá.

Mas isso acaba hoje. Vou explorar um desses internos para procurar um lugar para mim.

- Eu preciso ir embora da casa do Jackson! - Falei olhando para a Teddy fazendo alongamento na sala dos atendentes.

- Ué, ele tá te expulsando já?

- Não. Ele é um excelente anfitrião. Nunca nos vemos, mas ele sempre deixa pão e queijo para mim e eu faço café todo dia antes de sair. Temos uma boa dinâmica invisível, o problema é quando a gente se vê.

Comecei a me lembrar do dia em que ele chegou em casa quando eu estava lavando umas blusas ao som dos melhores covers de Glee. Eu estava cantando Total Eclipse of the Heart com todo o coração e quando viro ele estava lá, parado, me observando com um sorriso contido no rosto.

- Ai, Teddy, foi muito constrangedor. A gente mal se conhece e ele já me viu errando aquela nota aguda do refrão.

Altman e eu rimos. Era engraçado no fundo, mas isso precisava se resolver.

- Doutora O'live, pronta para as visitas? - DeLuca apareceu na porta me chamando para as minhas rondas e fomos juntos.

A primeira a visitarmos foi a Jenny, a paciente que teve um choque anafilático.

- DeLuca, poderia fazer as honras?

- Claro. - Ele pegou o prontuário e começou a ler. - Jennifer Stuart, 26 anos, deu entrada à uma semana por causa de um choque anafilático. Iríamos fazer uma lavagem, mas o procedimento foi mudado após descobrirmos que o pulmão dela estava danificado por causa das pequenas doses de cloro que ingeria indiretamente no dia a dia.

- Jenny, pelos exames 10% do seu pulmão está comprometido com um tecido inflamado. Estivemos administrando doses de antibióticos durante esse dias, mas não têm dado resultado. Eu sugiro uma cirurgia para remoção da parte danificada e substituição por um enxerto.

- Tudo bem, Doutora, mas isso não vai acontecer de novo? Se essa minha condição é crônica, isso não vai se repetir sempre que eu entrar em contato com o cloro?

- É o mais provável, por isso preciso indicar uma mudança no estilo de vida. Vai precisar checar todas as águas que entrar em contato. Esse aparelho aqui mede os níveis de cloro presente. - Apresentei o colorímetro para ela que torceu o nariz. - E essa aqui é uma caneta de epinefrina, para caso aconteça uma situação de extrema necessidade.

- Mas eu não quero viver desse jeito. Não tem uma solução para essa alergia? - Ela questionou.

- Eu posso indicar um tratamento que vai diminuir os efeitos, mas ainda não existe uma cura definitiva, Jen, sinto muito.

Saímos da sala meio tristes.

- É bem pesado você ter alergia à algo que está sempre presente na sua vida. - DeLuca comentou.

- É verdade... - Falei pensativa. Ainda queria arrumar uma solução para ajudar a paciente.

- Vai me deixar participar da cirurgia não é, Doutora O'live? - Acordei do transe e entendi a oportunidade batendo na minha porta.

- Vou sim, claro que vou. - Fiz uma pausa. - Ao menos que eu não consiga achar um lugar para ficar antes do horário da cirurgia. Ficaria muito triste e precisaria escolher outro interno para me ajudar.

- Pode deixar comigo, Doutora! Vou arrumar seu palácio.

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Eu estava pesquisando sobre tratamentos para alergia na sala dos atendentes quando Jackson entrou arrastando DeLuca pelo colarinho do jaleco. Essa não.

- Eu estou pessoalmente ofendido por você ter mandado um interno procurar uma casa pra você.

- Me desculpe, eu sei que ele deveria está aprendendo, mas é que ele estava a meu serviço hoje e...

- Não acredito que você acha que eu ligo pra ele. - Falou incrédulo balançando a cabeça em negação.

- Então o que houve? - Perguntei. Ele fez sinal para que o DeLuca saísse e então fechou a porta e sentou no sofá.

- Se estava se sentindo tão mal lá em casa, podia ter me falado que eu melhorava as instalações, sei lá.

- O quê? Não, Jackson, o problema não é a casa. O problema é que... - Fiz uma pausa para analisar as expressões faciais dele. Nada bom. - A gente mal se conhece. Eu não sei nada além do seu nome e sobrenome e agora nós somos colegas de casa e também nem nos vemos direito. Eu tô morando com um estranho e minha mãe falou expressamente para eu não fazer isso.

- Espera, acha que eu sou perigoso? Por que aceitou ficar lá então?

- Perigoso? Não, claro que não. Você compra pão e queijo para mim, não te acho perigoso. Eu só não sei nada sobre você e isso me deixa incomodada. Fico querendo me mandar logo para não ter que ficar em uma situação constrangedora sempre que nos esbarrarmos em casa.

- Então tá certo. Eu sei como podemos resolver isso.

- Vai me ajudar a achar um lugar?

- Quê? Não, se vira. Mas eu não vou mais ser um estranho para você, Camille O'live. - Fez uma cara de suspense e apontou para mim. - Hoje, às 19h, na cozinha, você e eu faremos um jogo de perguntas e respostas. Vou levar a bebida! - Ele falou e foi saindo com os polegares apontando pro alto em aprovação.

- Eu não bebo! - Falei mais alto enquanto ele se distanciava.

- Não é pra você. - Ele retrucou.

Eu ri. Não esperava essa do Jackson, acho que estou começando a me enturmar em Seatle. Como diriam em New Haven: massa!

A nova chefe do TraumaOnde histórias criam vida. Descubra agora