Velho conhecido

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Era começo de tarde no presídio Garcia Central e os detentos deixavam suas celas, rumando para o almoço no refeitório e aquele dia em especial, Gabriel notara mais cochichos que o normal quando passava pelos outros e não sabia o motivo.

Decidido a ignorar, Gabriel pegou sua bandeja e passou pela fila onde fora servido da comida nada apetitosa da prisão, depois seguiu para a mesa onde seu colega de cela estava sentado. O chamavam de "Perna" pela sua forma manca de caminhar. Ao se juntar a ele, Biel notou que ele também estava diferente.

-Qual foi? O que aconteceu? -Perguntou más o rapaz continuou comendo. -Todos estão cochichando quando eu passo e agora você está com essa cara, o que foi? -Insistiu.

-Por que não me contou que conhecia o Cobra? Pensei que já fôssemos amigos. -Disse o cara parando de comer, Gabriel só riu. -Tem algum palhaço aqui?

-Foi mal cara, relaxa. De onde tirou que eu o conheço se você quem me contou dele, e ele está na solitária desde antes da minha entrada aqui? -Questionou estranhando.

-Eu não sei como ele ficou sabendo que está aqui, na verdade eu até sei por que tem guardas aqui que trabalham para ele e o mantém informado de tudo.. -Disse.

-Legal ele ter guardas do lado dele depois de esfaquear um, com uma chave de fenda. -Fez uma observação.

-O pessoal cochicha quando você passa porque o Cobra deixou um recado. Todo mundo está comentando que ele disse que tem assuntos do passado para tratar com você, e está ansioso para revê-lo. -Contou.

-Eu nunca vi esse cara, não tem assunto nenhum a ser tratado. -Disse Biel sem dar muita importância em seguida, deu a primeira garfada em sua comida.

-Estão achando que você vai morrer. -Disse o homem manco, mordendo sua maçã, fora esse um dos comentários que ouviu.

-Eu não o conheço. -Voltou a lembrar. -Ele com certeza quer por medo em mim, como fez com vocês. -Biel deu outra garfada.

-Eu não tenho medo eu o respeito. -Corrigiu.

-Sei, claro. -Biel riu.

-É questão de bom senso, cara. Ele tem apoio da maioria dos caras aqui, tem até guardas do lado dele, sou grande más não sou burro. -Disse.

-É e se ele é tão bom assim por que não matou o guarda?. -Ele se referia ao guarda ferido com a chave de fenda. -Entre os presos isso seria muito bem visto.

-Ele não quis matar o guarda, aquilo foi um aviso e é justamente isso que estou tentando dizer, toma cuidado com ele porque o cara é perigoso. Saiba que já tem até apostas rolando, estão tentando adivinhar de qual forma você vai ser morto. -Avisou.

-É? E qual é o seu palpite? -Biel ainda não levava aquele assunto a sério.

-Depois não diga que eu não avisei, se eu fosse você pensava em algo para me defender porque ele deixa a solitária hoje. -Avisou se levantando com sua bandeja vazia e o resto de sua maçã.

-Agradeço pela informação e os conselhos. -Disse Biel que continuava comendo despreocupado.

...

Ao terminar seu almoço, Gabriel voltava para o bloco onde ficava sua cela e por cada grupinho que passava tornava a ouvir cochichos, se não fosse a promessa que fez a Anna na visita, já teria partido para cima de alguém.

Gabriel tinha um novo hobbie, a leitura. Em casa ele mal tinha tempo livre e como na prisão é o que ele tem de sobra, aproveitava os livros que tinham à disposição para os presos, na biblioteca da prisão.

Ele ia saindo da cela outra vez, com intenção de pegar outro livro quando dois caras entraram antes que ele pudesse sair, o encurralado dentro da cela. Qualquer um dos dois davam o dobro de Biel facilmente só que ele não estava sozinho.

Haviam duas beliches na cela e três das camas eram ocupadas. Uma por Biel, outra por Perna e mais uma por um outro cara e era justamente ele quem estava ali.

-Aí, pode sair. -Pediu um dos caras que entrou ao companheiro de cela de Biel que o encarou más saiu. Agora sim se acontecesse uma briga ali, Gabriel estava perdido.

-Posso saber o que querem? -Perguntou Biel aos caras com os punhos cerrados.

-Tudo bem, galera. Já podem sair, quero conversar sozinho com meu ex funcionário, barra ex cliente, barra ex genro. Como prefere que eu o chame, Gabriel? -Perguntou um homem um pouco mais alto de bigode, cabelos um pouco grisalhos, postura de mal e um palito de dentes na boca que era um tanto ridículo.

Os dois homens que chegaram primeiro, saíram da cela más ficaram na porta, certificando de que ninguém entraria para interromper a conversa.

-Então você, pai da Lorena, é o Cobra. -Gabriel riu sem humor. Seria engraçada se não fosse trágica a maneira como Lorena ainda está ligada mesmo depois de morta a vida de Gabriel.

-É só a vida fazendo o papel dela, Lourinho. -Cobra relembrou um dos apelidos que deu a Biel. -Você me passou a perna duas vezes, acha que seria justo você viver por aí como se não me devesse nada? -Perguntou puxando uma cadeira de aço que tinha ali para então se sentar na mesma.

-Eu não lhe devo nada!. -Gabriel reafirmou.

-A não? Senta ai que eu vou relembrar, caso tenha esquecido. -Pediu más Gabriel não saiu do lugar. -Senta, só estamos conversando. -Pediu  tirando um cigarro e isqueiro do bolso. -Quer  um? -Ofereceu depois de se livrar do palito que tinha na boca.

-Não, obrigado. -Recusou o cigarro e se sentou em outra cadeira cruzando os braços.

-Vamos começar relembrando da primeira vez que me passou a perna.  -Disse acendendo o cigarro, depois de feito, ele guardou o isqueiro no mesmo bolso de onde o tirou. -Primeiro, você começou a comprar as drogas que eu forneço, comprava o bastante para você e mais três amigos rappers seu. Me surpreende que não tenha tido nenhuma overdose. -Brincou.

-Saúde de ferro. -Gabriel respondeu no mesmo tom. Cobra deu uma tragada no cigarro para logo em seguida liberar a fumaça pela boca.

-Aí você aumentou drasticamente o número de compras para manter suas festinhas com seus amigos drogados. Você era um dos que mais consumia minhas drogas e eu não via problema desde que me pagasse e você me pagava, bom, pagou os primeiros meses e depois parou. Continuou pegando e pedindo para pagar depois. Eu não costumava deixar más você era um cliente especial. -Tragou mais uma vez o cigarro e liberou a fumaça.

-É eu te trazia bastante lucro. -Biel disse, ele tinha consciência que o ex sogro lucrava bastante com seus pedidos extravagantes.

-E me deixou um prejuízo enorme. Sabia que a sua dívida chegou a quase dois milhões? Um milhão e novecentos mil para ser mais exato. Você comprava em excesso e das melhores drogas. -Disse e Biel apenas observava. -Sua carreira estava um lixo naquela época e você estava se perdendo em dívidas, lembra do que aconteceu depois? -Questinou.

-Comecei a trabalhar para você, buscando as armas que chegavam de outros países de forma ilegal para tentar quitar minha dívida. -Lembrou.

-Isso mesmo, olha aí sua memória voltando. -Zombou, deu mais uma tragada no cigarro e continuou falando. -Eu era muito bom com você, lembra que eu propus outro acordo quando você quis sair? -Perguntou e Gabriel suspirou impaciente, sabia que ele estava falando da proposta que Biel aceitou de sair com Lorena e depois o deixou na mão quando sumiu com Anna.

-Onde quer chegar com isso? -Perguntou ele.

-Você vai me fazer um favor. -Disse Cobra.

-Ah eu vou? -Gabriel zombou.

-Vai, vai sim. -Se levantou. -Porque você ainda me deve, então ou você quita essa dívida de vez ou eu vou caçar sua família até o inferno, e você sabe que eu vou mesmo já não tenho mais nada à perder. -Ameaçou jogando seu cigarro o chão, pisando no mesmo até que apagasse.

-O que eu tenho que fazer? -Perguntou Gabriel vencido e disposto a acabar de vez com essa pedra nada pequena que insistia em ficar em seu caminho.

...

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