- Deixe de bobagem Emy, a notícia é maravilhosa! Lembra daquela reunião que você foi com Eric em Paris? – Rachel pergunta, felicíssima.
- Claro! Ou você acha que alguém consegue se esquecer de que esteve em Paris? – respondo com sarcasmo.
- Certo, o pessoal de lá me ligou, e eles querem fechar contrato com você. Querem comprar sua marca. Isso não é fantástico? – ela diz com um entusiasmo muito exagerado.
- Sim, é fantástico, mas era algo que eu já imaginava.
- Só acho que você não imaginava as condições para isso ser feito – ela diz arqueando uma sobrancelha.
- Que condições? Se eles querem exclusividade, não vou fechar, pois tenho muitos outros clientes, e o maior deles é Eric, eu não posso simplesmente...
- Emilly – Rachel grita – me escuta. Eles não querem exclusividade, eles querem que você abra uma filial do ateliê em Paris. E mais, querem, que você se mude para lá, e cuide pessoalmente dos desfiles, e tudo mais.
É bastante coisa para processar. Eu nunca imaginei chegar tão alto assim. Eu queria apenas desenhar minhas roupas, e ganhar algum dinheiro com isso. Mas, me mudar para Paris, fechando um contrato desse nível? Isso traria ainda mais prestígio para mim, e eu poderia fazer o que sempre sonhei, cuidar de tudo pessoalmente. Sem contar as noites de gala, tapetes vermelhos. Rachel pode cuidar das coisas por aqui. Eric e eu podemos dar um jeito. Isso é fantástico mesmo, mas, porque eu não consigo ficar entusiasmada de verdade com essa notícia?
- Emy? – Rachel chama, pegando minha mão.
- Preciso pensar um pouco antes de tomar uma decisão.
- Pensar no que? Essa é a chance da sua vida! – Ela diz indignada.
- Eu sei, só vou falar com Eric primeiro. Te vejo mais tarde, pode ser? – digo, me levantando, sentindo um leve tremor nas pernas.
- Mas você nem almoçou... – escuto ela dizer, enquanto caminho para a rua, com um destino certo.
Não demoro um minuto para conseguir um táxi. Percebi a muito tempo que se você for mulher, e se ainda por cima for bonita, conseguirá muitas vantagens na vida. Digo o endereço automaticamente para o motorista e me afundo no banco em busca de mais lembranças, as mesmas que estão me consumindo.
Não consigo me lembrar de momentos tristes, da época em que namorei com Jack. A não ser pelo fato de minha vida escolar ter se tornado um inferno. Jéssica estava determinada a acabar comigo de alguma forma. Ela se juntou com mais algumas meninas, que me odiavam, sem eu sequer saber o motivo, e tornaram meus dias na escola bem difíceis. Elas me perseguiam, insultavam, quebravam minhas coisas, faziam o que estava ao alcance para me atingir. Nunca contei isso para Jack, pois sabia que ele iria ficar furioso, e iria falar com elas. Mas no fim, se eu tivesse feito isso, só teria provado que de fato, elas estavam me atingindo. Depois de alguns meses de pedidos inúteis, meus pais finalmente cederam e deixaram eu ir com Jack em seus shows. As noites de sexta – feira nunca mais foram as mesmas, eu ansiava por elas. E não era só porque ver Jack no palco, era incrível, pela maneira como ele interagia com o público, a maneira como ele se transformava ao tocar sua guitarra e cantar as mais diversas canções, sempre com o olhar fixo em mim. Eu ansiava por elas, porque nesses dias, após os shows, a gente escapava de todos, entrava em seu velho Jipe, e fazíamos amor. Olho meu reflexo pelo retrovisor do taxi, e vejo que estou sorrindo. Logo me sinto culpada, pois tenho um namorado. É uma espécie de traição, ficar pensando em quando você fazia amor com outro cara. Mas eu sinto falta disso, de fazer amor. Não que Eric não seja ótimo na cama, ele é realmente demais. Só que a nítida diferença, é que nós não fazemos amor. Nós fazemos sexo. Quando eu me entregava a Jack, era como se a cada toque, cada movimento, eu chegasse um pouco mais perto do paraíso. Eram momentos tão íntimos, tão surreais. Mas tinham vezes melhores que outras, e as melhores, eram quando nós fazíamos amor, no esconderijo de Jack. Todo dia 10, nós íamos até lá, naquele lugar que fora seu refúgio, para comemorar. As horas voavam, e eu tentava aproveitar ao máximo cada segundo ali. Tudo estava seguindo perfeitamente bem, tirando o fato de Jéssica não desistir de me atormentar toda vez que eu encontrava com ela. Eu havia terminado o ensino médio, trabalhava com minha mãe na biblioteca, iria para a faculdade da cidade vizinha cursar administração, e tinha uma relação maravilhosa com Jack. Até que Rachel apareceu. Com suas roupas diferentes, e um papo estranhíssimo sobre moda. Ela estava na cidade, a trabalho, para concluir uma enquete, ou algo do tipo. Ela passava horas nas ruas observando, conversando com as pessoas, e na biblioteca, utilizando um dos poucos computadores que haviam lá. Logo viramos amigas, e ela me contou que estava no segundo ano da faculdade de moda, e que estava fazendo uma matéria para uma revista. Ela me apresentou a um mundo que eu nunca havia imaginado existir. A paixão por essa profissão me tomou de imediato. Eu não queria mais ter uma profissão sem graça como a de meus pais. Não tinha talento para música como Jack. Mas Rachel me ajudou a descobrir que eu tinha talento para desenhar. Quando ela voltou para Londres, deixou a semente plantada em minha mente. Aos poucos, fui pesquisando mais sobre isso, e só achava coisas magnificas a respeito. Glamour, prestígio, luxo. A ambição em mim se acendeu, e eu decidi, eu ia ser uma designer de moda. Fiz secretamente a inscrição na faculdade de Rachel, e quando recebi a carta dizendo que fui aceita, não consegui acreditar. Contar minha decisão para meus pais não foi fácil. Mas contar para Jack, foi ainda pior. Ele simplesmente não aceitou. Ele não queria que eu me mudasse para Londres. Ele dizia saber, que as luzes, a agitação de uma cidade de verdade, iriam me mudar. Ele estava certo. Na primeira semana aqui, eu já me senti diferente. Meus pais, iriam me apoiar, mesmo a contra - gosto. Mas Jack... Nossas únicas brigas, giraram em torno desse assunto. Talvez ele soubesse que iríamos pertencer a mundos diferentes, quando eu alcançasse algum sucesso. Eu fui adiando minha decisão, até restar apenas um dia, para eu me apresentar na faculdade. Arrumei minhas malas, fazendo pausas para controlar o choro. Liguei para Jack, que foi para casa imediatamente. Sentado, no sofá da sala, onde passamos tantos momentos felizes, ele chorou como se eu estivesse indo em direção a morte. De certa forma, era um fim. Do nosso relacionamento.
Nós subimos para o meu quarto, e fizemos amor intensamente.- Sabe Emy, se você for mesmo para Londres, não tem como a gente continuar junto, você sabe disso – ele disse, com seus olhos violetas pela primeira vez, apagados.
- Mas Jack, nem é tão longe assim, é só outra cidade. Eu volto pra casa aos finais de semana para te ver. A gente não tem que terminar – eu supliquei.
- Você não entende. Com o tempo, você não terá lugar para mim em sua vida. Você é brilhante, vai chegar ao topo, e eu não tenho a ambição de te acompanhar. Não quero ser enxotado da sua vida aos poucos. Se for pra isso acontecer, que seja de uma vez.
Essa foi nossa última conversa. Eu não tive argumentos para confrontar o que ele disse. Algo que com o tempo, eu vi ser verdade. Meus pais me levaram até a estação. Eles estavam felizes, e tristes ao mesmo tempo. Eu estava apenas triste. Choramos um pouco, eles me abraçaram até quase me sufocar, e depois com relutância, partiram. Minha mãe fez eu prometer que eu viria para casa todo final de semana. Eu quebrei essa promessa a muito tempo. Eu estava na bilheteria, quando meu celular tocou. Era uma mensagem de Jack.
“Eu te amo Emy. Não posso desistir sem lutar. Adia essa viagem, e fica comigo. Você sabe que dia é hoje? Estou te esperando, no lugar que só a gente sabe.”
Eu havia me esquecido que dia era. Tanto stress, tanta indecisão. Era nada menos, que 10 de junho. Estávamos completando 4 anos de namoro. As lágrimas brotavam sem parar em meus olhos. Demorei meia hora para ter coragem de entrar na estação. Dentro do trem, eu sentia meu coração ficar cada vez mais pequeno. O nó na garganta ficando cada vez maior. Quando ele começou se mover, apaguei a mensagem de Jack, com um gemido de dor, e quanto mais velocidade ganhava o trem, mais eu queria ir para os braços dele. Mas não tinha mais volta. Eu tinha tomado minha decisão.
- Adeus Jack – sussurrei para mim mesma, tirando ele da minha vida de uma vez, enquanto eu avistava as luzes de Londres, e o que seria uma nova vida.
O taxi parou em frente ao grandioso prédio, eu entreguei o dinheiro ao motorista, e desci do carro enxugando minhas lágrimas. Não que eu sinta saudade, ou arrependimentos. É que doeu muito na época. Doeu agora quando me lembrei. Passo pela portaria, e nem me dou ao trabalho de dar nome, ou ser anunciada, pois todos sabem quem sou eu. Entro na sala de Eric, e quando ele me vê, se levanta surpreso.
- É, oi – digo, me sentindo esquisita ali, de repente.
- Emilly, o que faz aqui? Está tudo bem? – ele pergunta, me analisando.
- Está sim, tudo ótimo. É que... Eu...
Não consigo terminar a frase. Quando me dou conta, estou em seus braços, as lágrimas me engolfando.
- É que eu recebi uma proposta maravilhosa – digo, em meio aos soluços, com Eric afagando meus cabelos. Choro ainda mais, quando finalmente aceito que esse choro não é de emoção, muito menos de felicidade.
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E se...?
SachbücherQuem nunca pensou sobre o que poderia ter acontecido se tivesse feito escolhas diferentes na vida? Emilly Foster é uma designer bem sucedida, e seu namorado Eric é a personificação da perfeição. Porém, ela se sente incompleta, sente que algo falta e...