A CINCO PASSOS DE....

23• Sem pulso

   Acordando numa daquelas conhecidas macas de hospital, Estela não estava comigo...
  Eu tento me mexer mas era como se eu estivesse preso...

-Dana! - Chamo tantas vezes que eu acho que estava sozinho, ninguém me responde...

  Quando eu novamente acordo eu não estava mais na maca, eu estava numa cadeira de uma fila de espera, no mesmo hospital, mas num lugar que eu quase não ia...
  A fila de espera, a espera de quem morre, a espera de milagre, a espera de...

-Will, Estela vai ter que fazer uma cirurgia as pressas...

  Eu nem tento conter quando uma lagrima desce pelo meu rosto e cai no chão.
  Dana abre um sorriso, um sorriso que eu nunca compreenderia se todos não estivessem sorrindo...

-Ela...

-Houve um acidente de carro... a motorista morreu... e ela...

-Estela vai....

-A motorista tinha exatamente a compatibilidade da Estela.

  Sinto a vida dentro de mim voltar, a vida que tinha ido embora quando eu vi Estela inconsciente...
  Minha mãe entra fazendo um barraco, falando que isso era um absurdo, que eles tinham que fazer o transplante pra mim e não pra ela...

-MÃE CHEGA! VOCÊ TEM IDÉIA DO QUE TÁ FALANDO? EU NÃO LIGO SE O TRANSPLANTE É PRA ELA! EU AMO A ESTELA.

  Era a primeira vez que eu gritava com a minha própria mãe, mas bem... Também era a primeira vez que eu admitia em voz alta que amava a Estela.
  E eu nunca, nunca, trocaria a minha vida pela dela...
  Eu peço pra entrar na sala, mas eles não deixam por causa da minha bacteria. A minha fibrose tinha tido um impacto com o gelo, aumentou pra estágio 5.
   Eu espero, volto pro meu quarto arrumar os remédios, enquanto escuto as discussões descabidas da minha mãe com as enfermeiras, ela queria que eu voltasse pra Amsterdã, ela queria que eu fosse pra longe, bem longe de Manhattan.
 
-Will...

-An?

-Sua mãe ela...

-NÃO VAI MUDAR A MINHA DECISÃO!

-Ela está indo embora.

-Fala com ela que eu peço desculpas e que eu não quero mais depender dela.

  Eu estou sendo queimado vivo nesse hospital, mas eu quero ser queimado vivo num lugar em que eu tenha amigos...
   Dana vai embora e sem querer eu acabo por não tomar os remédios, hoje não era um dia de ficar parecido com um zumbi e andar feito idiota pelo hospital.
   Mas é exatamente isso que eu faço.
  Começo a vagar pelos corredores, feliz, a dois segundos atrás Estela estava basicamente morta, totalmente sem pulso... e agora, está livre... livre de mim... e da fibrose....
  Cai a fixa, só agora cai a fixa, nós não vamos mais poder ficar juntos.... nunca mais...
  Eu visto uma daquelas roupas de cirurgião, coloco as máscaras e tudo mais e vou pra sala em que ela estava, atravesso a cortina e me sento na cadeira mais proxima a maca que ela estava.

-Então é só isso, você vai me deixar?

Ela fica quieta, tão quieta que eu diria que está dormindo...

-Vai me largar,  e eu não vou poder fazer nada, que droga!

-Eu não vou. - Ela diz abrindo os olhos e sorrindo abertamente.

Também abro um sorriso, mas a expressão dela fica tensa...

-As enfermeiras vão ver você, vai Will.

-Você sabe que não vamos poder mais...

-Vai Will!

  O sorrido dela tinha virado uma lágrima solitária no canto dos olhos... caindo e dando lugar a outra e repetindo essa mesma sequencia um monte de vezes até acabar...
  As enfermeiras entram por um canto da cortina e eu saio pela parte oposta, ninguém vê, eu  não faço a menor idéia do que vai acontecer, só sei que eu não me importo, não mais.