PARTE 1 - SEI

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PARIS, Dezembro de 2018

Charles POV

Estamos correndo. Muito rápido. Marin corre como se tivesse asas nos pés e talvez tenha, pois ela já está alguns metros a minha frente. Faço uma nota mental de voltar a treinar para ter mais disposição. Nessas férias eu não mexi um músculo na academia.

Meu telefone vibra no bolso constantemente. Deve ser Arthur, mas não irei atender. Seja lá o motivo das pessoas estarem gritando Marin entendeu alguma coisa a mais que eu e por isso está correndo. Ela para perto de um árvore e estica a mão pra mim, eu a alcanço quase colocando a língua para fora.

- Tudo bem? - ela pergunta me puxando para perto dela e para o escuro.

Apenas balanço a cabeça afirmando que sim. Meu coração parece saltar do lugar e minha respiração está ofegante, ela coloca a mão no meu peito e me olha e começa a inspirar e expirar, eu acompanho sua respiração até que me acalmo.

- O que aconteceu? - eu digo olhando para trás, não vejo nada.

- Acho que o grupo Neo Nazista S.O.S está atacando de novo. - ela diz normalmente. - Os vi mais cedo perto de uma cafeteria quando estava com Aaron, ele me disse para tomar cuidado caso voltasse muito tarde para o hotel.

- Não entendo. - eu digo a olhando. - Se é perigoso qual o motivo de estarmos aqui?

Marin me olha e parece querer me explicar o segredo do universo, mas não temos tempo. Então ela pega o celular e liga para alguém, começando a falar num espanhol calmo e num tom de voz bem baixo e acho que está dando a localização de onde estamos. Ela está ligando para a polícia. Tenho quase certeza, mas se estamos em Paris qual o motivo dela estar falando em espanhol?

Ela encerra a ligação e  quero puxá-la em direção aos meus braços e protegê-la de qualquer coisa, mas ela já se afastou de mim e está abaixada observando alguma coisa. De onde estou não vejo nada.

Há um silêncio enlouquecedor agora que até uma folha caindo perto pode ser ouvida. Então há uma risada alta de escárnio e um choro baixinho de uma mulher. Marin fica nervosa ao meu lado e pela primeira vez tenho total percepção que estamos nos envolvendo em algo perigoso, automaticamente tento afastá-la para dentro das sombras que as árvores ali nos oferece e enquanto me mexo acabo pisando em alguma coisa e faço um barulho alto.

- Quem está aí? - uma voz agressiva pergunta.

Marin me olha e segura minha blusa, parece me dizer para não ir até lá, mas eu sinto que preciso fazer alguma coisa e então ando em direção a luz. E vejo os dois caras que estão ali: todos com roupas pretas, pesadas e coturnos. Tatuados com símbolos nazistas e atrás deles duas mulheres com véus no rosto e muito medo no olhar. 

- Perdeu alguma coisa? - um deles dizem. O sotaque é carregado e não consigo entender de onde ele possa ser.

- Não sei... - eu digo tentando parecer tranquilo. - Talvez eu tenha vindo buscar as moças que estão atrás de vocês...

Sorrio de forma charmosa, mas os caras não aceitam meu sorriso e cruzam os braços.

ESCOLHA ERRADA DE PALAVRAS CHARLES. ESCOLHA ERRADA DE PALAVRAS!

Percebo que as garotas estão mais apavoradas que antes e os caras parecem não estar gostando nada do que eu disse. Eles se olham por um segundo e depois me encaram, acho que virei o alvo. Olho para trás em busca de Marin, mas ela não está no meu campo de visão. Os dois brutamontes andam em minha direção e entram embaixo da luz da lua, eles são maiores do que eu, suas botas são pesadas e na ponta estão pontas de ferro. Eu não quero apanhar desses caras.

Eles falam alguma coisa entre si e depois apontam para mim. Começo a suar frio. É quando vejo que Marin atrás dos caras. As mulheres estão se afastando sem fazer nenhum barulho, andando em direção as árvores lá atrás, elas estão assustadas e eu também estou. Mas não Marin, ela parece saber exatamente o que está fazendo. Eu começo a recuar e os caras começam a avançar na minha direção. E então um deles olha pra trás e vê Marin. Ela está com os braços atrás das costas e parece agora preocupada, o cara da direita que carrega uma cicatriz enorme no rosto também vira seu rosto em direção a Marin e sorri. Ele gosta claramente do que vê.

- Hei, docinho, - ele diz apontando pro seu parceiro e depois apontando pra mim. - Vem cá. Eu posso te acalmar de um jeito que você vai gostar...

Sinto nojo do que ele disse. Só de pensar nesse cara tocando Marin meu sangue ferve, ela me olha por um milésimo de segundo e quero dizer para ela não fazer isso, mas eu não consigo dizer nenhuma palavra. Nesse momento eu não estou ajudando em nada.

Os ombros de Marin relaxam um pouco e ela começa a vir na minha direção, os brutamontes sorriem e esquecem que estou ali. Eu aponto com a cabeça o caminho que viemos, talvez aquele portão ainda esteja aberto e possamos fugir. Marin só precisa passar por esses caras e corremos. Ela parece entender e então sorri nervosa. Agora está mais próxima do que antes dos caras, um deles ainda está de olho em mim desconfiado e o outro com a cicatriz se aproxima dela.

Ele toca seu rosto de forma bruta, os dedos passando pela lateral do seu rosto até que ela estremece. Sinto uma ânsia de vômito enquanto observo a cena, me sinto incapaz de cuidar dela ou fazer alguma coisa. Estou fechando os olhos e criando impulso para pular no cara mais próximo quando ouço um grito e então Marin está vindo na minha direção correndo loucamente. Ela estende a mão em minha direção, seus dedos estão próximos dos meus e então estamos correndo juntos, de mãos dadas e atrapalhados, eu olho para trás para entender o que aconteceu.

O cara da tatuagem agora está se levantando e sua cabeça está sangrando, o seu amigo nos olha com raiva. E no chão há uma garrafa de cerveja quebrada.

- Você quebrou uma garrafa na cabeça do cara? - eu pergunto correndo em direção ao portão que entramos, o mesmo ainda está aberto.

Me jogo em direção ao portão e bato meu ombro na grade para abri-lo, fazendo um barulho alto. Marin passa logo em seguida, com as mãos trêmulas ela pega o cadeado que estava ali e tranca o portão. Se afasta preocupada e olha os caras chegando, mas o portão é alto e o cadeado não é fácil de abrir.

Eu olho pra ela e ela dá de ombros, como se fizesse isso todos os dias.

- Você está bem? - ela pergunta tocando meu rosto.

- Eu estou ótimo. - eu digo me aproximando dela. Seu rosto está sujo e consigo ver vestígios de tinta no seu rosto, onde o cara passou a mão. Ela engole em seco e olha pras suas mãos, uma delas está suja de sangue. - O que acont...

Mas não termino a frase pois os dois caras que puxamos briga chegaram ao portão e estão furiosos. Eles chutam, gritam e falam coisas ofensivas. Seja o que for que digam Marin treme ao ouvir aquilo, quantas línguas ela sabe falar? Estou prestes a perguntar isso quando um dos caras se afasta e começa a correr em direção ao portão.

Estou satisfeito que ele não conseguirá abrir o portão quando percebo que ele se joga no ar, se pendurando na grade do portão e começa a escalar. Seu parceiro começa a fazer a mesma coisa.

- Desgraçados. - eu digo.

- Se prepara para correr, Charles. - Marin diz sem me olhar e se afastando da grade. - Corra para salvar sua vida.

E então corremos de novo. Dessa vez há um zumbido alto no meu ouvido e sinto gosto de sangue na minha boca, estou sendo guiado por adrenalina e medo. Em nenhum momento eu pensei que poderia morrer dessa forma, mas correndo agora pelas ruas de Paris eu percebo que minha vida corre muito mais perigo do que em qualquer corrida de Fórmula 1 que eu tenha feito.

Quando viramos a primeira esquina ouço o barulho de botas pesadas alcançando o chão. Minhas pernas estão tremendo, preciso correr mais. Faço isso pela minha vida e pela vida de Marin.

ALMOST IS NEVER ENOUGH - CHARLES LECLERCOnde histórias criam vida. Descubra agora