Sorte

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Pov. Valério

Tudo começou a desandar quando meu pai descobriu que tínhamos visto a Lu, por uma falha nossa ficamos tempo demais na visita e ele acabou nos vendo voltando do quarto dela. A reação dele não poderia ter sido pior, me arrastou pela camiseta para o lado de fora do hospital e novamente me tratou como um lixo.

Foi tudo tão rápido e humilhante, que eu nem sequer me lembro das palavras exatas, ele me tratou tão mal que no fim eu só consegui sentar no meio fio com lágrimas nos olhos. Só de pensar que eu já tinha chamado ele de pai e que por toda a minha vida tinha tentado agradá-lo eu me enchia de raiva, ele nunca se importou comigo ou com a Lu, o mais importante como sempre eram as aparências. Fui tolo de pensar que isso pudesse ter mudado depois do que aconteceu com a filha dele.

Eu não era mais bem-vindo na sua casa e não receberia mais nada dele, estava oficialmente deserdado, pela primeira vez na vida ele admitiu o que eu sempre soube: meu pai nunca me amou ou se importou realmente comigo.

Acabaram os anos de distância física, mas bastante dinheiro, ele não queria mais nada comigo e eu tinha duas opções: voltar para o Chile para minha mãe, que era outra que nunca tinha realmente ligado para mim, ou arrumar um jeito de continuar ali perto da Lu. Não queria abandoná-la agora, não depois do que eu já tinha feito e foi a única coisa que eu consegui dizer para o Samuel quando ele me perguntou se eu estava bem.

- Eu só sinto que não posso deixá-la de novo. E a única pessoa que me resta está no Chile.

- Você não vai, ok? Vamos dar um jeito.

- Que jeito? Eu não tenho para aonde ir, e dinheiro nenhum, você ouviu o que ele disse.

- Você pode ficar na minha casa por um tempo e quem sabe fazer o que nós os meros mortais fazemos, arrumar um emprego...

- Obrigado, Samuel, de verdade, você não tem ideia de quanto significa para mim, ficar.

- Acredite eu entendo, não quero que a Lu te perca de novo.

- Acha que Carla vai conseguir outra visita depois disso?

- Honestamente acho difícil e fico preocupado. Lu não está nada bem e não acho que seus pais entendam isso.

- Eles nunca entenderam nada. Vamos ter que encontrar um jeito.

Mas não encontramos. Carla ainda tentou negociar uma próxima visita, mas o diretor se desculpou dizendo que por exigência dos pais nenhuma outra visita estava permitida e ele era obrigado a acatar. Aparentemente senhor Montesinos tinha criado um grande caso pelas duas visitas anteriores e tanto eu quanto Samuel estávamos proibidos de estar até no mesmo corredor que a Lu. Era isso ou um processo em cima do hospital, no fim o diretor não teve escolha e nós também não.

Não contei da minha preocupação para os outros, eles não entenderiam, dormir e passar o dia era muito difícil. Samuel ia para escola e eu ficava em casa, sem dinheiro precisava encontrar uma vaga em uma escola pública e ainda não tinha tido cabeça de buscar isso. Resumidamente eu passava o dia todo pensando nela e tentando encontrar um modo de entrar em contato. Tentei ligar e mandar mensagens para o seu celular, mas estava desconectado. Pensei em subornar uma enfermeira, mas com que dinheiro? Eu não tinha mais nada... E nenhum dos amigos ricos parecia disposto a fazer isso.

Toda a preocupação com Lucrecia me deixava com ainda mais vontade de usar, estava sempre agoniado e elétrico demais, querendo e sabendo que precisava me livrar desses velhos hábitos, porque precisava me livrar desse vício. Não era como antes que eu tinha crises de abstinência fortíssimas, ultimamente elas estavam mais brandas, mas se continuasse nesse estado de constante alerta era bem provável que piorassem.

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