Pov. Lu
Eu e Val temos momentos incríveis, ainda não tínhamos transado desde minha volta do hospital, tínhamos sim feito muitas coisas, mas transar mesmo essa foi a primeira vez. Tínhamos concordado em ir devagar com nossa relação, mas ver Valério daquele jeito me fez voltar a velhos hábitos.
Foi assim que nosso relacionamento começou, como uma distração, não aguentava mais ouvir os comentários maldosos sobre meu peso da minha mãe e acabei no quarto do Valério, quase implorando por um esquecimento. Val tinha fumado maconha esse dia e acabei usando também, fui eu quem o beijei, porém o modo como ele reagiu não foi nem um pouco inocente.
Sempre fomos muito solitários e encontramos um no outro o consolo e amor que nossos pais tinham nos negado. Quando todo o resto era intragável tínhamos um ao outro para esquecer e lidar com o que quer que estivesse acontecendo, nunca estávamos sozinhos. E por mais que isso fosse lindo era também tóxico, nos tornamos dependentes um do outro e destrutivos para nós mesmos.
Não posso deixar que voltemos a esse mesmo lugar, penso nisso enquanto estou abraçada e encostada no seu peito. Estar com ele é uma das sensações mais puras e naturais para mim, me faz sentir mais leve e mais eu.
Meu meio-irmão sabe me tocar como ninguém, me conhece melhor do que qualquer outra pessoa, sinto mais prazer do que podia me lembrar de ter sentido em muito tempo. Nos minutos em que Valério esteve dentro de mim e me tocando era como se não existisse mais nenhum outro problema no mundo, mas agora que tudo acabou a realidade voltou e sei que se não lidarmos com o vício do Valério e pararmos de fugir dos nossos problemas estaremos para sempre presos nesse ciclo vicioso.
Fazê-lo esquecer tudo foi ótimo, porém sei que precisamos encarar o que quer que tenha acontecido. Algo aconteceu e se ele não for honesto comigo não chegaremos a lugar nenhum.
– Quer me dizer o que houve, Val? – Falo com cuidado nunca tivemos o hábito de conversar sobre qualquer um dos nossos problemas, mas acho que é hora de mudar isso. Valério engole seco e fica em silêncio me encarando como se estivesse tomando coragem para dizer alguma coisa.
– Fui demitido. – As lágrimas que vejo em seus olhos me desesperam um pouco, Val odeia chorar na minha frente e quando faz isso é sempre sinal que chegou no seu máximo.
– Tá tudo bem, Val. Vamos dar um jeito. – O abraço com força e dentro do meu abraço ele chorar por muito tempo antes de me contar o que mais aconteceu.
– Ele simplesmente me mandou embora, porque não lavo os pratos rápido o suficiente sendo que ninguém lá lava mais rápido que eu. E agora o que vamos fazer Lu? Temos que pagar suas consultas, seus remédios, comprar comida...– Valério parece muito nervoso e eu mentiria se dissesse que também não estou. Não sei o que seria de mim sem os remédios, isso sem falar dos remédios para o coração que eu sigo precisando tomar.
– Vai ficar tudo bem, Val. Essa não é a única empresa e nem o único emprego do mundo, e talvez seja uma coisa boa vai que você acha um lugar melhor. Você vivia reclamando do seu chefe, né? Quem sabe não encontra um melhor?– Falo sem muita segurança sei que não é tão simples arrumar um emprego.
– É, pode ser. – Ele sorri, mas o sorriso não chega aos olhos. E não consigo culpá-lo, não queria ter colocado tantas responsabilidades em cima dele, Valério é só um garoto, não deveria ter que pensar em mim como se fosse meu pai.
– Vou te ajudar a procurar um emprego novo quando voltar da psicóloga. O que acha? Talvez Samuel saiba de alguma coisa, posso procurar um emprego também. Duas pessoas procurando devem ter mais sorte que uma só. – Sugiro sabendo que ele não vai gostar, mas honestamente já tá na hora dele pensar nisso. Não sou uma imprestável e se achasse um emprego aliviaria um pouco as coisas tanto para ele quanto para o Samuel, ainda não temos condições de pagar pelo aluguel, mas isso pode mudar mais se dinheiro começar a entrar.
– Já te falei que não quero que você trabalhe, é cedo para ter tanta responsabilidade.
– Val, entendo que você esteja preocupado comigo, mas estou bem. Você precisa se cuidar, ter um tempo para si, estava trabalhando como um louco e olha o que aconteceu? Não quero mais te sobrecarregar...
– Não estava sobrecarregado...– Ele fala tentando negar o óbvio.
– Val, te amo de verdade, mas você precisa parar de me proteger dos seus demônios. Te conheço e sei que a demissão só trouxe à tona um problema muito maior, se você estivesse bem não teria usado. Você precisa descansar e voltar as reuniões.
– Não tenho tempo pra isso. – Sabia que ele diria isso e dessa vez não cairia nesse papo.
– Não posso lidar com o seu vício, se você também não quiser lidar com ele. Estou com você para o que precisar, mas você precisa me ajudar e se ajudar, Val. Estou muito preocupada com você, já tinha reparado os tremores, mas não quis te pressionar, porque sei que pressão faz o efeito contrário, mas não quero te perder, Val. Você não tem ideia a infinidade de coisas que eu pensei que tinham acontecido com você hoje, fazia tempo que eu não sentia tanto medo e se você não se tratar isso vai virar algo constante e não posso ter isso na minha vida, não no meu estado. Já te falei mil vezes que estou bem, e realmente estou, mas não sei se vou ficar se te perder, e é isso que pode acontecer se você não parar com essas merdas. Elas quase me mataram, Val, duas vezes...
– Não compare o que é completamente diferente.
– É tão diferente assim, Val? Eu fiz de propósito, mas se tivesse feito sem querer teria dado no mesmo. E da mesma maneira que você não consegue pensar numa vida sem mim, eu não consigo idealizar uma sem você, não posso, não sei o que seria de mim sem você e cada vez que você volta para isso só consigo pensar em você morrendo na porra de um beco escuro ou numa boate qualquer. Não quero mais sentir esse medo, de voltar para casa e não te encontrar, é desesperador e me leva de volta para lugares que não quero mais voltar. Preciso que você se cuide, Val, se não por você, por mim e principalmente por nós. Por favor, Val, volte as reuniões, descansa e conversa comigo. Eu posso te ouvir, o que eu não posso é te ver se afundar cada dia mais.
– Não quero te arrastar comigo, Lu. – Val sussurra e o abraço de novo.
– Você não vai.
– Tem certeza? Você acabou de falar que te levei a um lugar que você não quer mais estar. – Val diz olhando para baixo sem me encarar.
– Val, olha pra mim! – Digo segurando seu queixo e o obrigando a me olhar nos olhos. – Não posso te salvar, só você pode fazer isso, como só eu posso fazer por mim mesma, mas estou aqui para te dar força e para ser seu colete sempre que sozinho você achar que não consegue. Mas você precisa lutar contra isso e tentar de verdade, entende? E eu sei que de certa forma é minha culpa ter te deixado se afastar do tratamento, mas não vou mais fazer isso. Nós dois precisamos nos ajudar.
– Não é culpa sua. Te amo, Lu, não quero que sinta que tem alguma responsabilidade nisso. – Dou um selinho nos seus lábios e não digo mais nada sobre isso. Valério pode negar o quanto quiser, mas a verdade é que minha depressão o fez esquecer de si mesmo por tempo demais, então tudo isso é sim em parte minha responsabilidade também.
– Te amo, Val, mais que tudo nesse mundo. Me promete que vai voltar para as reuniões e dar um tempo pra você?
– Prometo. – Ele segura minha mão e a beija. Sorrio para ele, um sorriso que não alcança os olhos, mas que um dia vai alcançar quando Valério estiver bem de novo.
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Hermanos
FanfictionDuas cartas de despedida do Valerio e da Lucrecia após os acontecimentos da segunda temporada. Uma foi enviada e a outra não.