Oito

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Caio chegou exausto em casa e ainda tinha que limpar o cocô de Arnaldo que estava espalhado pela casa inteira. Aparentemente, aquele cachorro ainda não tinha aprendido a fazer cocô na rua e Dudu não estava cumprindo bem a promessa de adestra-lo. Depois que terminou tudo, viu Amanda saindo com um sorrisinho do escritório da mãe e ficou intrigado. Depois que ela sobe as escadas pro quarto, Suzana põe a cabeça pra fora e manda Caio entrar.
Ele não se senta e cruza os braços a encarando.
- O que pensa que está aprontando? - Suzana o encara aborrecida.
- Do que está falando?
- Não tente me fazer de idiota, Caio! Sei que você anda querendo contar a verdade pra todo mundo. E agora parece que você está de amizade com aquele garoto fútil que a Amanda está saindo. E por acaso, ele é filho do Humberto Manfrenatti.
- Olha aqui, Suzana...
- Olha aqui você, Caio! - Ela se levanta e fica bem de frente pra ele. - É melhor não se esquecer das consequências caso você tentar me derrubar. Me testa pra você vê se não vai se dar mal nessa.
- Quem vai se dar mal nessa aqui é você, Suzana. Uma hora todos vão descobrir a verdade. Uma mentira nunca dura pra sempre.
- Só se você for idiota demais pra falar alguma coisa.
Os dois praticamente brincam de "Quem pisca primeiro" e Caio não consegue sustentar o olhar intimidador da madrasta, por isso o desvia e fica sem jeito.
- Você não vai nessa festa sábado. - Ela declara.
- Mas...
- Mas nada! Você vai ficar naquela droga de Café, cuidando do Karaokê e eu vou estar lá pra te vigiar. Me certificar de que você não vai a lugar algum. - Ela voltou pra sua mesa e depois começou a mexer no papel. - É só isso, agora vaza.
Caio não ousou chorar. Apenas terminou de catar as caquinhas de Arnaldo e quando Dudu apareceu querendo implicar com ele com o seu lazer vermelho, Caio não aguentou e explodiu.
- Me deixa em paz, sua peste! - Ele gritou. - Será que não dá pra você crescer? - Depois correu pro seu quarto, ainda tentando manter o controle, pois não valia a pena deixar uma lágrima escorrer de seu rosto por causa daquelas duas.
Mal sabia ele que havia deixado um menininho de oito anos super triste com poucas palavras.

- Fala galera! - Joaquim ergueu o celular falando com a câmera em seus stories do Instagram. Já era o terceiro? Ele nem sabia.
Depois de agradecer a mais uma permuta, ele finalmente poderia se afastar de todo mundo. Paloma o seguia lhe dizendo o que faltava fazer e verificando a agenda pra confirmar se ele participaria do evento Geek que correria na próxima quinta-feira e Joaquim teve que dizer "sim", já que não lhe restava muita escolha. Depois que finalmente ficou sozinho em seu camarim ele pegou o seu violão e começou a tocar a melodia com a qual sonhou na noite anterior. Enquanto tocava, ele sorria. Ele sentia a música. Ele era a música. Joaquim já não sentia mais saudade da mãe, porque ela estava dentro dele e ele tinha certeza de que aquela música era pra ela. Alguém bateu na porta o interrompendo.
- Joca, querido. - Disse Paloma. - Não demore a terminar de se arrumar. A gente tem que voltar pra Casa de Festas.
- Já estou indo! - Gritou e revirou os olhos. Depois suspirou colocando o violão de lado e encarando a fantasia de marinheiro. - Argh... - Bufou.

Enquanto Amanda se arrumava com as amigas no quarto, Caio se sentava no banco de trás do carro de Suzana ao lado de Dudu, que não estava falando com ele fazia três dias. Caio já estava com saudades até mesmo de gritar com o irmão, mas Dudu nem mesmo olhava pra ele. Isso deixou Caio muito mal.
Amanda colocava a fantasia de coelhinha. Lola colocou a sua fantasia de gatinho, enquanto Mariana se vestiu de ratinho. Uma referencia ao filme favorito das meninas. Se fosse a festa, de que Caio se fantasiaria? Ele ficou sonhando acordado no banco de trás do carro da madrasta a caminho de mais uma noite no trabalho. Pelo menos ele estaria ao lado dos amigos, mesmo que sendo vigiado pela bruxa. O mais chato disso tudo é que não poderia cantar. Murmurando uma melodia desconhecida, na qual ele sonhou a noite anterior, ele olhava as ruas passando pela janela do carro. Suzana se irritou e mandou que ele se calasse.
- Lembre-se, é melhor você não tentar cantar hoje. - Ela vociferou.
- Sim, sinhá! - Caio disse só para provoca-la.
Suzana suspirou e tentou não se enfurecer.
Ao chegarem na Elias', Caio ficou encantado com a decoração. Dudu correu pro escritório da mãe, pra jogar video game no celular, porque achava Karaokê entediante. Já tinha uns clientes lá e a expectativa de todos estavam em alta. Enquanto ajudava Sabrina a se maquiar, Caio pensou em Pedro.
- Está tudo bem com você? - A amiga o perguntou.
- Não, Sabrina... Não, está.
- Não acredito que aquela bruxa o obrigou a trabalhar hoje.
Ele desviou o olhar da amiga, pra que ela não enxergasse a verdade em seus olhos. Não contou tudo a ela, apenas que Suzana ameaçou não lhe pagar e ele precisava do dinheiro.
- Não aguento mais aquela mulher. Sabrina cruzou os braços. - Se meu pai não estivesse doente e eu tivesse que ajudar com a cirurgia, eu já teria pedido demissão!
- Não pense nisso. Tenho certeza de que seu pai vai sair dessa e você ainda tem a sua faculdade.
- Não sei, não. - Ela baixou os olhos. - Preciso cuidar dele. Somos só eu, ele e minha irmã, tá ligado? Somos só nós por muito tempo e eu não sei o que eu faria se... - Sabrina não conseguiu terminar de dizer.
Caio pensou em dizer que entendia o que ela queria dizer ou "sinto muito", mas ele odiava a piedade dos outros quando ele sentia falta da mãe e imaginou que a última coisa que a amiga precisaria seria isso.
- Ei, vamos sorrir um pouco, ok? - Ele tentou anima-la. - Vamos focar no presente e depois a gente pensa no amanhã. Sua gata tá aqui pra ver você arrasar cantando pra ela.
- Acha que seria demais dedicar um pagode pra minha ruivinha?
Caio riu.
- Arrasa, nega!
- Você poderia fazer dupla comigo. A gente pode cantar pra ela juntos, que tal?
- Ah, não posso cantar hoje. Quer dizer... - Ele desviou o olhar dela. - Estou com dor de garganta.
- Sério? Quer um remedinho? Eu devo ter um na minha bolsa...
Caio iria dizer que não precisava, mas Suzana os interrompeu aparecendo na sala dos funcionários.
- O que foi, sinhá?
- Pare de me chamar assim! - Ela esfregou a testa cansada e Caio deu uma risadinha. - Olha, eu tenho que ir até a loja de Ipanema. Houve um problema lá, uma inundação, sei lá! Não saia daqui, ouviu bem? O Dudu vai me contar tudo se você por algum acaso quiser se aventurar por aí. - Ela apontou dois dedos pros olhos e depois pra ele, como quem diz que "Estou de olho" e depois desceu as escadas.
Caio bufou e revirou os olhos e tentou ignorar mais uma vez as notificações no celular.
Pra continuar a farsa de que não podia cantar, Adriano ficou encarregado de apresentar quem iria cantar, enquanto Caio apenas servia o pessoal. Quando Diana apareceu na loja vestida de Chapeuzinho Vermelho, Caio riu e foi até a amiga.
- Você está...
- Incrível? É, eu sei! - Ela deu uma voltinha.
- E quem é o seu lobo mal?
- Presente! - Diz Zack entrando pela loja vestindo de lobo sexy. - Oba, bolinhos! Posso?
- Pode pegar, por minha conta. - Caio gesticulou com a cabeça e Zack foi até o balcão. - Então, vocês já estão indo pra festa?
- Não, nós estamos indo a festa. - A amiga disse e demorou um tempo pra que Caio percebesse que ela o incluía quando disse "nós".
- Não posso ir, esqueceu?
- Claro que pode. A Sabrina falou que a bruxa não está aqui.
- E daí? O pestinha do meu irmão está me vigiando.
- Já prometi dar a ele os brownies que ele adora. - Sabrina falou se apressando. - Estou em contato com a Juliana, ela teve que substituir um funcionário que foi demitido da loja de Ipanema, ela está lá. E vai me dizer se a bruxa deixar a loja e eu ligo pra você.
- Perfeito! - Diana bateu palmas comemorando. - Então?
- Não, gente! Nem pensar... Olha, eu...
- Olha nada, Caio. - Sabrina o encarou séria. - Você tem que ir a essa festa. O Joaquim já te ligou duas vezes.
- É. - Diana falou. - Ele me mandou mensagem pra se certificar de que você vai.
- Mandou? - Caio não conseguiu evitar sorrir.
- Viu só? Você quer ir! Seu príncipe está lá esperando por você e você vai mesmo dá o cano?
- Não é isso... Quer dizer, ele já tem a Amanda.
- Mas ele quer você! - Sabrina quase gritou.
Eles se distraíram vendo as pessoas baterem palmas e a namorada de Sabrina subiu no palco.
- Essa vai pra você, meu amor! - Disse meio tímida e logo a música começou a tocar.
Era uma música do Ferrugem e Sabrina deu um sorriso largo de orelha a orelha.
- Viu só, Caio? - Ela disse para o amigo. - Quantas vezes essas coisas acontecem na vida? Estar apaixonada é tão... - Se virou para ele e o encarou. - Bom! E só se você for burro pra não perceber que aquele garoto gosta mesmo de você. Todo mundo vê o jeito que ele te olha.
- Pois é, a gente ver. - Cleyton passa por eles levando lixo pros fundos.
Diana e Sabrina olham pro amigo com expectativa.
- Vai mesmo deixar aquelas bruxas vencerem? Você sempre faz o que elas querem, nunca vive de verdade. Sei que se preocupa com esse lugar, mas tem que viver a sua vida, Caio. É isso que seus pais iriam querer.
- Não dá, Diana! - Caio olhou para a amiga meio cansado de discutir. - Não dá pra ir...
As meninas abaixaram os olhos irritadas, até que o ouviram dizer:
- Não sem fantasia.
- Ah! - Diana gritou e o abraçou.
- Isso aí, amigo! - Sabrina o abraçou, também. - Ok, agora vou ver a minha gata cantar. Licença. Arrasa, meu amor!
- Não se preocupe com a fantasia. - Diana sussurra pra ele. - Já pensei nisso.
- Como...
- Tudo bem, eu sei que demora pelo menos três horas pra eu ficar incrível desse jeito. Mas eu sei maquiar rápido! - Pedro diz na porta de entrada da Elias.
Mas ele não é Pedro. Essa noite ele está vestido como Rose Williams.

Um Diferente Conto Da Nova CinderelaOnde histórias criam vida. Descubra agora