Caio se afastou sem graça e quase derrubou um copo que Joaquim pegou.
- Essa foi por pouco. - Ele riu.
- O que está fazendo aqui? - Amanda perguntou se aproximando dele, enquanto Caio terminava de secar a louça.
- A gente ia fazer música juntos, lembra? - Joaquim olhou o relógio e se alarmou. Havia esquecido da hora, estava se divertindo tanto com o Dudu e com Caio que nem se ligou que estava tarde. - E você demorou a aparecer.
- Ah, foi mal... Tive uma emergência com a minha amiga. Ela está... Doente. Olha, eu sinto muito. Mas agora que estou aqui...
- Agora é tarde, eu tenho que ir pra casa. - Ele tirou o celular do bolso. - Quinze chamadas perdidas da Paloma. - Bufou.
- Foi mal, Jojo. Me desculpe. Eu devia ter ligado, eu...
- Devia ter ligado mesmo. Odeio quando as pessoas me dão bolo.
- Não foi um bolo... Eu só me atrasei um pouquinho...
- São quase nove da noite, Amanda! Isso é um pouquinho?
- Nossa, por que você está sendo tão grosso comigo?
- Sei lá, Amanda... Ultimamente não sei o que pensar sobre você. Anda tão estranha, tão distante e eu...
- Eu não sou estranha! - Ela olhou pra Caio que estava ali, na opinião dela, atrapalhando eles dois.
- Ah, eu... - Ele largou a louça. - Melhor eu ir ver como o Dudu está.
Caio foi até a sala e viu Dudu dormindo no sofá. Ele riu, pois o pestinha parecia mesmo um anjinho dormindo. Só mesmo ficando com febre para as crianças se acalmarem. Caio olhou para Arnaldo e o chamou:
- Vem, amore! Vamos levar seu dono para a cama.
Assim ele pegou o irmão no colo e foi subindo as escadas. Ele olhou na direção da cozinha e tentou não ficar tão chateado.
Quer dizer, é claro que Amanda e Joaquim tem um relacionamento... Um tipo estranho de relacionamento. E talvez ele estivesse errado em gostar dele, porém ele estava errado sobre muitas coisas, também. Ele pensou na conversa que teve com Joaquim, que disse que não podia deixar nada e nem ninguém impedi-lo de realizar seus sonhos. E não era exatamente isso o que Caio estava fazendo? Deixando que Suzana o impedisse de viver sua vida e correr atrás de seus sonhos? O que Pedro havia dito mesmo? Que só ele tinha o poder de deixar os outros o fazerem se sentir inferior...
Mas ele não podia fazer isso com seus amigos... Podia? Do que adianta realizar seus sonhos se os seus amigos estariam com seu futuro arriscado? E o pai de Sabrina... ele precisa dessa cirurgia. Caio não poderia trair a amiga desse jeito.
Caio colocou Dudu na cama e o cobriu. Ele alisou a sua cabeça e deixou Arnaldo subir na cama do menino e se aconchegar ao seu lado. Dudu acordou e sorriu. Caio sorriu de volta.
Sua maior raiva naquele momento a respeito de Suzana, não era ela fazer com que ele sofresse ao deixar Amanda fingir que sua voz era a dela e sim porque ela teve coragem de ir viajar pra um eventozinho qualquer e deixou o filho ali, daquele jeito... Que mãe negligente que ela era! Ele já sabia que ela não ligava para os filhos. Não dava amor e carinho, como eles mereciam. Até Amanda que tem mais da atenção dela sofre pela ausência da mãe em sua vida. Talvez seja por isso que Dudu seja desse jeito, sempre aprontando... Pra chamar atenção dela, que não liga pra ele. Dudu mal lembra do pai dele, ele devia sentir muita falta de estar com essa grande figura masculina pra se espelhar, um amigo, alguém com quem poderia contar sempre e fazer as coisas de menino que ele sempre fazia... Porém Caio sabia que seu pai estaria ocupado demais trabalhando pelo futuro dele, que provavelmente seria tão ausente como Suzana.
- Sente falta do papai? - Dudu perguntou.
Caio se surpreendeu que ele estivesse acordado, mas se sentou e acariciou sua cabeça.
- Muito. - Caio sorriu. - E você?
- Eu não me lembro muito dele, mas minha mãe disse uma vez que tenho os olhos dele.
- Você tem mesmo... - Caio concordou.
- Eu queria ter tido mais tempo com ele...
- Ei, ele ainda está aqui com você. - Caio tocou no peito do irmão. - Entendo que sente falta dele e tudo mais, porém ele precisou ir pra ser seu anjo da guarda... Isso foi meio piegas, né?
- Sim... - Dudu riu. - Mas eu entendi o que quer dizer.
- Ele amava muito você, espero que saiba disso.
- Eu sei... Você sente falta da sua mãe, também?
- Mais do que tudo nesse mundo. Ela foi o meu primeiro amor, sabe... Eu a olhei nos olhos assim que nasci e senti uma conexão com ela. Acho que foi ali que foi predeterminado a minha vontade de cantar... - Caio riu com sua forma de pensar. - Ah, eu falando bobagem de novo!
- Não, você falou bonito. - Dudu ficou pensativo e depois olhou pro irmão mais velho e perguntou: - Você me acha insuportável mesmo?
- Maninho, foi da boca pra fora. Eu juro que amo muito você e você foi uma das melhores coisas que me aconteceu.
- Sério?
- Sim. - Caio o beijou na testa. - Eu adorava cuidar de você quando era só um bebezinho e você sempre foi um pestinha. Foi piorando enquanto crescia. Mas não faz ideia do quanto é horrível te ver assim ao invés de incendiando a casa inteira.
Novamente Caio sentiu raiva de Suzana e reprimiu um palavrão. Ele não podia enfrenta-la a respeito de sua voz, mas a enfrentaria por causa do filho dela.
- Canta pra mim? - Ele pediu.
- Dudu... Eu...
- Por favor. Eles nem estão ouvindo...
Caio olhou pra trás e ficou pensativo por uns segundos. Ele respirou fundo e olhou para o irmão. Sorriu novamente e começou a cantarolar "Se Eu Não Te Amasse Tanto Assim" baixinho, com cautela pra que Joaquim não o ouvisse e mesmo assim Dudu ainda achava sua voz linda. Ele adormeceu e Caio beijou sua testa.
Deixou o quarto do irmão e foi arrumar os brinquedos dele e guardar seu video game. Terminou de limpar a louça, não sabia onde Amanda e Joaquim estavam, porém não teve pensamentos pra eles, porque precisava terminar de arrumar tudo e ir descansar. Pensou em dormir no quarto de Dudu, caso ele acordasse no meio da noite... Quando estava voltando da sala de jogos e passou pela varanda do quintal, ele viu Joaquim e Amanda se beijando.
Por um tempo, ele ficou paralisado, olhando aquela cena, sem reação... Foi quando a ficha caiu: Ele realmente era apaixonado por Joaquim e aquilo partia seu coração.
Caio começou a correr. Saiu pela porta da frente e correu. Correu sem parar, sem pensar num rumo, num caminho pra seguir. Parou no meio da rua e segurou a barriga, sentia uma dor no estômago e deixou as lágrimas rolarem. Depois se recompôs e correu novamente. E foi pra casa de sua Fada Madrinha...
Deitado no sofá da casa de Pedro, Caio tentava se acalmar. Achou que já tivesse esgotado a cota de lágrimas, pois já não havia mais uma gota pra derramar. Cansado, ele apenas suspirou e tentou não pensar. Contou tudo para o seu padrinho e o fez prometer que não iria tentar tirar satisfações com Suzana, pelo bem dos seus amigos.
- Não posso demorar. Tenho que voltar pra cuidar do Dudu. - Ele disse se levantando quado Pedro apareceu com um chá pra ele.
Pedro estava vestido de Rose essa noite, pois iria trabalhar em alguns minutos
- Tudo bem. Apenas tome o seu chá e tente se acalmar um pouco. Depois vá pra casa, durma e amanhã resolvemos isso.
- Rose, você prometeu que não iria fazer nada.
- Prometi?
- Pelo menos quando estava de Pedro.
- Ah! - Ela abanou a mão em desdem. - Promessas são como vasos de barro: Fáceis de fazer, fáceis de quebrar.
- Marry Poppins. - Caio reconheceu a referência. - Mas é sério. Pelo seu bem e de todos, deixa aquela mulher em paz. Eu vou conseguir driblar essa história, eu prometo.
- Você vai driblar como, Caio? Fazendo exatamente o que aquela safada quer? Um dia você acorda e descobre que tem forças pra enfrenta-la, mas recua no último minuto porque ela ameaça seus amigos...
- Fazer o quê? Sou leal a eles.
- E eles, são leais à você?
- Você não viu todos me ajudando no dia da festa?
- Bom, nisso você tem razão. - Ela se virou pro espelho e retocou o rímel. - Acho que vou passar mais um pouco de iluminador.
Enquanto Rose se dirigia a penteadeira, Caio refletiu:
- Eu quero conseguir fazer algo contra ela, mas não posso... Não posso trair meus amigos assim.
- Você não pode é desistir dos seus sonhos por causa daquela bruxa! Caio, tem certeza de que essa é a única opção ou a que você conseguiu enxergar?
- Como assim?
Rose se virou pra ele suspirando, ao terminar a maquiagem:
- Querido, ás vezes a gente acaba tomando decisões precipitadas pelo desespero de ajudar aqueles que amamos. Não conseguimos ver outra saída e nos convencemos de que não temos escolha. Mas dizer que não tem escolha é a desculpa mais esfarrapada do mundo! - Rose guardou suas coisas e terminou de colocar o vestido. Deu um gole no seu gim, acabando com tudo que tinha no copo e andou até o afilhado. - Eu sei que você pode conseguir tudo o que quer.
- Eu entendo o que você quer dizer, Rose... Mas... Eu realmente não tenho escolha. Já tentei pensar em outra coisa, mas...
- Então você vai continuar sofrendo desse jeito? Deixando a Amanda roubar seu homem, a Suzana roubar seus sonhos e o que mais, ein? Vai deixar que a Elias' feche? É só o que falta!
- Não, eu não posso deixar isso acontecer. Só que eu não sei o que faço, Rose... Eu não sei, Pedro!
- Você acha que não sabe. - Rose murmurou e se levantou. - Se quer ajudar seus amigos, se confia mesmo nele, você precisa demonstrar que confia neles. Tenho certeza de que eles vão poder te ajudar. Mas no final a decisão é sua, meu filho. Não se preocupe... - Disse ao se afastar. - Ainda vou te amar independente se você desistir ou resolver enfrentar a vaca!
Caio suspirou. Ele se levantou e ia pegar suas coisas, mas não estava nem mesmo com o celular, tinha saído de casa no meio de um impulso. Se despediu de Pedro, que deu a ele um dinheiro pra pegar um táxi, pois já estava tarde.
Ao chegar em casa, conferiu se estava tudo bem com Dudu, que dormia tranquilamente. Amanda parecia estar dormindo, também. Joaquim tinha ido embora. Ao olhar o celular, Caio pensou em mandar uma mensagem pra Diana, mas apagou. Ainda não tinha se decidido. E faltava apenas uma semana pro Show de Talentos.
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Um Diferente Conto Da Nova Cinderela
FanficCaio é um jovem negro e gay de dezessete anos que está tentando sobreviver ao último ano do ensino médio. Seu maior sonho é sair de casa e ficar longe da sua madrasta e dos irmãos insuportáveis pra correr atrás do seu objetivo de ser uma grande estr...