Joaquim procurou Amanda na escola no dia seguinte, que estava bastante calma pintando as unhas de suas amigas no pátio. Ela lhe explicou que se assustou e achou que a avó tinha falecido, mas ela só tinha caído do banheiro novamente. Mesmo relutante, Joaquim engoliu a história e disse a ela que não havia se esquecido da promessa que ela fez dos dois fazerem uma música juntos.
- Tudo bem. - Disse ela se levantando e indo até ele. Ela deu um sorriso largo. - Eu vou adorar! Porque você não passa lá em casa por volta das seis. Essa hora devo ter voltado do meu treino de natação.
- Você faz natação? É mesmo uma garota eclética. - Ele sorriu.
- Pois é! - Ela deu uma risadinha um pouco exagerada e depois um beijo na bochecha dele.
Assim Joaquim foi embora pra casa. O garoto ainda não tinha noção do que estava acontecendo, mas já estava sem esperanças de que encontraria a menina de sua festa. Havia conseguido imagens da câmera de segurança com um funcionário bem gentil da Casa de Festas, mas não deu em nada. Stalkeou as redes sociaisvde todo mundo da escola e até do Colégio antigo e... Nada. Tentou ser discreto e fez perguntas por aí... Ainds semprestas.
Com Caio o evitando, ele preferiu deixar as coisas com Amanda rolarem. Aparentemente ela entendia mesmo de música e se fazia aulas, deveria ser uma boa cantora. Com certeza havia uma explicação lógica pra tudo isso.
Foi quando ele passou por Caio no corredor e seus olhos se cruzaram, que seu coração bateu e por um segundo ele desejou que tivesse encontrado ela...- Caio, eu não estou me sentindo muito bem. - Disse Dudu assim que Caio entrou pela porta da frente da casa.
- Como assim não está se sentindo bem? - O irmão mais velho se alarmou, pois ele havia notado que Dudu andava estranho. Foi quando Dudu vomitou bem na sua frente. - Ah, droga! Vem aqui... Eu vou limpar isso depois.
Caio sentou seu irmão no sofá e Arnaldo se aproximou esfregando o focinho nele. Deixando a mochila de lado, Caio pôs a mão no pescoço e no peito do moleque que ardia em febre.
- Tenho que te levar no médico.
- Não! Não quero ir pro médico! - Dudu resmungou.
- Querido, eu sei que você detesta, mas você está pelando. Precisamos ir ao médico ver o que está acontecendo com você agora. Cadê sua mãe, ela já voltou do trabalho?
- Ela acabou de sair. Foi para um evento em São Paulo. - Contou Dudu.
- O quê? Não disse a ela que estava passando mal?
Dudu não respondeu e Caio bufou de raiva, se controlando pra não soltar um palavrão. Como ela pôde?, pensava. Ela deixou o filho doente para ir pra São Paulo ficar na mordomia.
- Ela é mesmo uma bruxa! - Caio deu um tapa na própria testa. O último pensamento havia sido alto demais. - Desculpa, não deveria falar isso da sua mãe.
- Tudo bem, ela é uma bruxa.
- Olha, garoto! Querendo ou não ela é a sua mãe, não fale assim dela. Agora venha, vamos nos vestir pra ir no médico.
- Por favor, Caio. Eu faço qualquer coisa. Até tomo um remédio horrível, mas não quero ir no médico!
- Não é como se você fosse tomar uma injeção, Dudu. Vai ficar tudo bem. Só vamos ter certeza do que está acontecendo e aí a gente volta pra cá, fica vendo uns filmes na tevê, debaixo da coberta quentinha, com nosso querido Arnaldo.
- A gente vai poder tomar sorvete? - Perguntou o menino com os olhinhos brilhando.
- Dudu, você está com febre! Não se pode tomar sorvete com febre!
- Já está passando.
- Ah, mais um motivo pra não tomar. Você quer continuar assim?
- Então, a gente toma o sorvete e depois vai no médico. - Sugeriu Dudu.
Caio soltou uma risada e fez o garoto se levantar pra trocar de roupa. Uma hora e meia depois, eles voltavam da clínica com todos o xarope e a receita de Dudu.
- Que saco ficar assim numa sexta. - Ele disse. - Quer dizer, se eu melhorar antes da segunda, ainda vou ter que ir pra escola. A não ser que eu tome um sorvete.
- Mesmo desse jeito, você continua um pestinha, ein! - Caio bagunçou o cabelo do irmão e os dois pararam na entrada. - Joaquim? O que faz aqui?
- Oi! - Disse o loiro esfregando a nuca, como sempre faz quando fica nervoso. - Foi mal, eu vim me encontrar com a sua irmã.
- A Amanda? Vocês tinham um encontro, hoje?
- Mais ou menos. - Ele mostrou o violão. - Íamos compor juntos.
- Amanda? Compondo? Isso é a coisa mais... Ai! - Dudu esfregou o braço que Caio beliscou.
- Ele quis dizer que minha meia irmã é uma compositora incrível. Ela deve estar no treino de natação. Quer esperar aqui dentro?
- Ah, se vocês não se incomodarem.
- De jeito nenhum. Entra. - Caio se adiantou para abrir a porta. - Você mocinho, vai direto pro quarto, tomar um banho quente, com muito vapor pra tirar esse catarro do peito.
- Você disse que eu poderia ver filmes! - Dudu protestou.
- Depois do banho. E não demora, vou fazer sopa pra você.
- Eu quero pizza! - Dudu subiu as escadas com Arnaldo logo atrás, que ficou feliz em ver que o dono havia voltado.
- Eu acho que estou atrapalhando aqui... É melhor eu ir. - Se adiantou Joaquim.
- Não! Quer dizer... Pode esperar a Amanda aqui. O Dudu vai ficar bem, ele é mais forte do que se pensa.
- Eu percebi. Foi ele quem te trancou pelado pra fora de casa outro dia, não foi?
- Ah, por que você foi lembrar disso! Eu quero morrer! - Caio escondeu o rosto nas mãos.
- Que isso, é uma das minhas lembranças favoritas. - Disse Joaquim.
Eles se encararam por um tempo e depois Joaquim se tocou no que disse e ficou sem graça, vermelho como um tomate.
- Bem, eu acho que é melhor eu ir fazer sopa pro Dudu. Você me ajuda enquanto a Amanda não vem?
- Ah... Tá. Beleza, vamos lá. - Joaquim o seguiu até a cozinha e Caio pegou os legumes e os separou, depois pegou o frango que havia descongelado.
- Vamos fazer o seguinte. Você corta os legumes e eu tempero o frango. - Sugeriu.
- Não sei cortar legumes...
- Todo mundo sabe cortar legumes! Foi mal, riquinho... Vai ter que descer do seu trono hoje e se juntar a cozinha.
- Não me chame assim. - Joaquim amarrou a cara. - Fica parecendo que sou um garoto mimado.
- Então me prova o contrário. Anda, logo! Corta tudo! Vai! - Caio brincou.
- Nossa, parece o Cozinhando Sob Pressão. Me dá mais uns minutos, Chef!
- NÃO! - Então Caio começou a rir e Joaquim gargalhou.
Depois que Joaquim havia cortado tudo, Caio separou o frango picado numa panela e começou a refogar.
- Hum... O cheiro já está bom. - Comentou o loiro.
- É... Mas ainda falta bastante até que fique bom.
- Você sempre gostou de cozinhar?
- É claro que não! Eu sempre gostei de comer. - Ele disse e os dois riram. - Mas, fazer o que se fui obrigado a aprender a cozinhar? Aqui nessa casa, eu sou a empregada.
- Como assim?
Caio o encarou e ponderou se devia ou não se abrir sobre seus serviços domésticos para o namorado de sua meia irmã. Ele poderia confiar em Joaquim?
- Deixa pra lá.
- Droga. Eu achei que tivesse descoberto o seu talento. - Joaquim disse.
- Bom, é porque eu não tenho talentos. A talentosa da família é a Amanda. Ela quem sabe fazer tudo!
- É... Ela é incrível. - Joaquim não sabia se ele acreditava em suas palavras. Se encostou no balcão de braços cruzados olhando pra frente.
Caio ficou um pouco chateado. Estava ali, bem na sua frente, o garoto de quem ele gostava, mas ele não podia te-lo. Porque claramente Joaquim gostava de Amanda. Ele disfarçou seu nervosismo e tentou se concentrar na sopa.
- Já está ficando quase bom...
- Há quanto tempo a Amanda faz aulas de canto? - Joaquim perguntou, deixando Caio nervoso.
Felizmente, ele não precisou mentir.
- Já faz uns quatro anos. Ela faz muitas atividades extracurriculares pra elevar seu currículo. Não sei se ela já te contou que participou de uns concursos de Miss...
- Sim, ela me falou. - A voz de Joaquim saiu arrastada, ele parecia cansado das mesmas histórias que Amanda insistia em contar.
- Pois é... Ela adora cantar, sempre cantou. - Muito mal, mas sempre cantou. Caio pensou.
- Ela tem uma linda voz... Nunca ouvi alguém cantar com tal emoção.
- É... Eu... Eu também nunca ouvi alguém cantar desse jeito. - Disse Caio, nervoso.
- Você acha que ela tem potencial pra ganhar o concurso?
- Não sei... Tem tanta gente talentosa...
- Mas você concorda que ela é uma cantora maravilhosa?
- Sim... eu...
Joaquim pareceu pensativo e se aproximou de Caio.
- Deixa eu te fazer uma pergunta: Você guardaria um segredo dela se ela te pedisse?
- Bom... Não somos tão chegados. - Nisso Caio não mentiu. - A gente mal se fala e eu não acho que ela confiaria em mim.
- Mas você guardaria, caso ela pedisse?
Caio hesitou. Já era difícil ouvir elogios para sua voz direcionado a outra pessoa e agora ele se sentia pressionado. Joaquim estava praticamente fazendo um interrogatório.
- Provavelmente, não...
Ele estava bastante nervoso, pois Joaquim estava bem perto e o encarando com uma expressão que Caio não conseguiu decifrar. Seu coração batia freneticamente.
- Como foi a noite de Karaokê? - Joaquim continuava a perguntar.
- Foi maravilhosa...
- Queria que você tivesse ido a festa...
- Queria? - Caio se surpreendeu com esse comentário.
- A sopa já está pronta? - Dudu os interrompeu.
Sem graça, os dois se afastaram. Caio desligou o forno.
- Está sim... Vai lá ver filmes e daqui a pouco eu levo pra você. - Disse.
- Eu quero jogar video game. - Pediu Dudu.
- Tudo bem, vai lá jogar.
- Você também joga? - Dudu perguntou pra Joaquim.
- Claro... O que você tem aí?
E os dois se afastaram pra sala de jogos e Caio ficou ali, enterrado em seus pensamentos e em seus sentimentos. Estava a ponto de beija-lo. Ele queria beija-lo. Como o destino pode ser tão cruel. Desejou que Joaquim fosse feio, sem talento e uma pessoa muito chata. Entretanto, ele acreditava que mesmo assim ainda seria apaixonado por ele.
Caio conseguiu convencer Joaquim a comer um pouco da sopa com eles e o cara gostou muito. Ele elogiou Caio que ficou bastante sem graça e até surpreso, porque Dudu, também concordou.
- Ele só não cozinha melhor que a Rosário. - Disse Dudu.
- Quem é a Rosário?
- Ela trabalhava aqui cozinhando... - Caio começou a contar, mas se interrompeu.
- E não trabalha mais? Por quê?
- Porque a mamãe ficou sem grana pra pagar a ela... - Contou Dudu.
- Dudu! - Caio o repreendeu.
- Foi mal, eu que não devia ser tão intrometido. - Comentou Joaquim.
- Não é nada. É só uma situação chata que estamos enfrentando, mas vai ficar tudo bem. - Caio assegurou e depois entrou numa discussão com Dudu que não queria comer as cenouras.
Depois de um bom tempo jogando video game com Joaquim que se divertia a beça, Dudu se cansou e tez Caio jogar com ele.
- Não sou muito bom nesses jogos. - Avisou Caio.
- Ah, espero que não seja um plano pra me fazer achar que não sabe jogar e depois mandar ver e acabar me derrotando.
- O Caio bom em video game? - Dudu debochou. - Esse aí só jogaria bem se o jogo fosse sobre a Rihanna.
- Ah, você é fã da Rihanna?
- Sim, ele até chorou quando foi no show dela no Rock in Rio.
Joaquim olhou para Caio como quem diz: "Sério?". Caio queria ser um avestruz e esconder a cabeça num buraco. Ele temia que todo aquele excesso de informações deixasse Joaquim desconfiado.
- Eu vou acabar com você nesse jogo! - Caio disse trazendo Joaquim de volta a realidade e eles começaram a partida de corrida.
Caio perdeu duas de três e então Dudu pediu algo a Joaquim:
- Pode me levar um dia pra assistir o ensaio da sua banda? Eu queria aprender a tocar guitarra.
- Mas é claro! Se quiser eu te ensino a tocar guitarra. - Prometeu Joaquim.
- Sério?
- Aham! Só fique sabendo que sou um professor bem exigente e turrão...
- Acredito nisso. Pessoas com caras de boazinhas nunca são de verdade.
- Eu que o diga! - Comentou Caio se levantando pra ir lavar a louça.
Dudu pegou no sono e Joaquim foi logo atrás dele.
- Não precisa ajudar... - Caio protestou.
- Eu insisto! - Disse Joaquim pegando a esponja.
Os dois ficaram quietos durante uns segundos e Caio acabou pensando em voz alta:
- Não acredito que a mãe dele foi viajar com ele assim... - Depois ele se calou, mordendo os lábios. Ficando sem graça por fazer tal comentário da madrasta para Joaquim.
- Ela parece ser bem durona... Digo, aquele dia em que estive aqui...
- É... Ela é tão mimada quanto a filha! - Mordeu os lábios de novo. - Desculpa, eu sei que você gosta da Amanda...
- Tranquilo. - Joaquim deu uma pequena risada. - É difícil conviver com ela?
- Antigamente não era tão difícil. Porém, de um tempo pra cá... - Caio se interrompeu.
Ele temia estar falando de mais. Joaquim ponderou com a cabeça.
- Acho que eu entendo... Quer dizer, não sei como é ter uma madrasta. O meu pai já age como se a minha mãe nunca tivesse significado algo pra ele e eu... Não sei. Por que os pais são tão complicados?
- Eu que o diga! Quando o meu pai era vivo ele falava para eu colocar meus pés no chão e parar de sonhar. Dizia que queria fazer da Elias' um grande império pra que eu herdasse. Mas eu só queria...
Cantar. Caio se obrigou a ficar calado.
- Meu pai diz sempre a mesma coisa. "Mantenha os pés no chão. Ser músico não dá em nada, você precisa ser um grande empresário." - Joaquim o imitou.
- Será que ele já ouviu falar do Jay-z ou da Madonna? - falou Caio.
- Ou do Roberto Carlos?
Os dois riram e Caio passou um prato para Joaquim seca-lo.
- Mas você... Parece bem confiante. - Foi o comentário de Caio.
- E eu estou. - Joaquim pensou se podia contar a Caio, no entanto, de uma maneira que ele não sabia explicar, ele sentia que podia confiar em Caio e então respirou fundo e disse: - Não conte pra ninguém, mas duas gravadoras entraram em contato comigo.
- Ah, meu Deus! Isso é incrível. Parabéns!
- Pois é... Eu amo cantar, amo o que faço e... Eu não vou deixar ninguém me impedir de seguir pelo meu próprio caminho.
Isso deixou Caio desconcertado. Ele ficou parado olhando pra pia cheia de sabão, ouvindo Joaquim:
- Sabe, eu amo o meu pai... Só que ele não está certo em tudo. É difícil, sim. Porém não é impossível. Olha a quantidade de pessoas que me seguem e curtem o meu trabalho! Vale a pena...
- É claro que vale a pena... - Caio murmurou.
Ele estava quase chorando e Joaquim notou.
- Está tudo bem?
Caio virou o rosto, porém Joaquim queria ve-lo. Ele pegou de leve no queixo de Caio e os dois se olharam.
- Joaquim? - Alguém chamou.
Eles se viraram e perceberam que Amanda estava encarando os dois com uma expressão confusa no rosto.
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Um Diferente Conto Da Nova Cinderela
FanfictionCaio é um jovem negro e gay de dezessete anos que está tentando sobreviver ao último ano do ensino médio. Seu maior sonho é sair de casa e ficar longe da sua madrasta e dos irmãos insuportáveis pra correr atrás do seu objetivo de ser uma grande estr...