Dez

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- Você está bonita. - Disse Joaquim enquanto os dois caminhavam entre os arbustos.
- Como sabe que estou bonita se você nunca me viu antes? - Caio perguntou passando as mãos pelas plantas
Joaquim assentiu, ela tinha razão. Eles entraram no jardim que estava muito mais bonito esta noite. Caio prendeu o fôlego, admirando as flores, as luzes e os vaga-lumes piscando ao redor. A imagem era linda e romântica, como num filme.
- Você é convidada do meu pai? - Joaquim quis saber.
- Não conheço seu pai. - Caio estava tranquilo em ser sincero, ele viu aquilo como um jogo, achou divertido estar sendo misterioso e ele não conseguia tirar um leve sorriso dos lábios fechados.
- Então você veio com algum convidado?
- Digamos que sim.
Joaquim encarou a menina com curiosidade.
- Eu conheço você? Quer dizer... Você me parece familiar.
- Talvez tenhamos nos conhecido... Em um sonho. - Caio andou mais a frente e parou num espaço aberto onde havia um balanço.
Suspirou e se sentou nele. Joaquim decidiu se aproximar pelas suas costas e empurra-la. A menina, no caso o Caio, ria alegremente enquanto ia pra cima e pra baixo no balanço. Joaquim tinha agido por puro instinto. Ele a acompanhou nas risadas até que se cansaram. Joaquim não estava mais vestido com a fantasia de marinheiro, tinha vestido a segunda, de Pequeno Príncipe e não pode deixar de pensar que a situação era cômica e estranha. Caio achava que combinava com ele, talvez por ele ser loiro, mas Caio nunca o achou tão lindo quanto esta noite.
Os dois riram um pouco e depois Caio ficou de costas para Joaquim, passando os dedos entre as flores e admirando a beleza da cerejeira ali a sua frente. Enquanto isso, o Pequeno Príncipe foi até o outro lado e tirou uma flor e se ajoelhou, arranco mais risada de Caio ao se virar.
- Oh, bela dama! Por favor, tire a máscara para que eu contemple o seu belo rosto. - Disse Joaquim de forma dramática.
Caio apenas balançou a cabeça negativamente. Joaquim se levantou, chateado e voltou a olha-la nos olhos.
- Pelo menos me diga o seu nome. - Pediu.
- Não importa como me chamem. - Caio deu de ombros. - Mas essa noite, eu sou a sua Cinderela.
- Então você é tipo uma espiã que se disfarça todas as noites e vai para festas investigar adolescentes alienados?
- Quê?
- Gosto de adivinhar coisas sobre as pessoas.
- Claro! - Caio revirou os olhos e riu.
- Por que tão misteriosa?
- Digamos que eu acredito que podemos ser o que quisermos ser.
- Boa... - Joaquim tentou advinhar.
- Mas e você? Se você pudesse ser outra pessoa por uma noite, quem seria?
O loiro colocou a mão no queixo como se estivesse pensando e Caio riu. Depois, Joaquim realmente ficou pensativo, até que abriu um sorriso largo e disse:
- Eu seria o Harry Potter.
- O Harry Potter? - Caio ergueu uma sobrancelha e Joaquim assentiu. - Por quê?
- Ué, ele tem poderes, é um dos maior bruxos de Horgwarts...
- Dumbledore era o maior bruxo de Horgwarts. O Harry só não pode ser morto pelo Voldemort e isso rendeu sete livros de perseguições.
- Não gostei desse argumento. - Joaquim amarrou a cara. - Sério, eu estava pensando em me casar com você.
Caio riu ainda mais e depois passou em volta dele.
- Não pode se casar com alguém que acabou de conhecer.
- Mas nós nos conhecemos! Você mesmo que disse... Num sonho. - Joaquim se aproximou dela e deu seu sorriso charmoso que arranca suspiro das fãs quando vão curtir uma nova foto no feed do Instagram. E agora arrancava suspiros de Caio.
- Você devia voltar. Seus amigos devem estar te procurando... - Caio disse, desconcertado.
- Tenho assuntos mais importantes a tratar.
- Comigo? - Caio voltou-se pra ele de novo.
- Lógico... Tipo, você não gostar do Harry Potter! Eu tenho que te fazer mudar de ideia quanto a isso.
- Eu não disse que não gosto do Harry Potter. Você confundiu as coisas.
Então os dois ficaram um longo tempo conversando sobre Harry Potter, falando de outras histórias e até de alguns filmes. Joaquim já nem se importava mais de ir encontrar sua banda e tocar. Há tempos que não conversava com uma garota legal que tivesse os mesmos gostos que ele. Depois de uma longa risada a respeito de um vizinho de Joaquim se parecer com o Dobby, o olhar dos dois se encontraram.
Caio ficou desconcertado e depois se lembrou que ele só estava encantado com o vestido, com a maquiagem e a peruca de cabelo castanho e ondulado... Joaquim não fazia ideia de que a Cinderela era Caio e mesmo assim, eles praticamente acabaram de se conhecer. Como Caio poderia ser algo pra Joaquim se eles nem sabiam quem era um e outro até minutos atrás, supostamente falando.
Joaquim estava tão desconcertado quanto. Ele se sentia encantado por aquela garota, mas mal a conhecia. Na verdade, suas feições pareciam familiares. Ele precisava saber quem ela era. De repente, involuntariamente, ele fez algo que sempre faz quando está nervoso: Cantou. Ele cantou Once Upon a Dream.
- I know you...
- Por favor, não cante a música da Bela Adormecida. Este é um conto diferente. - Caio pediu rindo.
- Ah, é mesmo... Qual era a música da Cinderela
A Dream Is A Wish Your Heart Makes, Caio pensou. Ele achou que Joaquim começaria a cantar esta quando inspirou fundo novamente, mas então ele começou a cantar:
- Salacadula, mesticadula. Bibidibobidi Bum. - Pegou Caio pela mão e os dois rodopiaram. - Se isso é magia acredite, então. Bibidibobidi Bum!
Quando parou, Caio segurava a barriga.
- Você vai me fazer ter um ataque de tanto rir, garoto! - Caio se sentou num banco recuperando o fôlego depois de tanto rodopiar.
Joaquim se sentou ao seu lado e os dois ficaram em silêncio por um tempo, olhando pra cima, aonde viam as estrelas.
- Esse é o meu conto de fadas preferido. - Joaquim quebrou o silêncio. - Cinderela...
- Você curte Conto de Fadas? - Caio sorriu olhando pro garoto que ainda encarava as estrelas
- Sim. - Ele se virou pra Caio. - Não tem problema com isso, não é
- Claro que não. - Caio sorriu ainda mais.
- Bom. - Joaquim riu. - Embora, eu faria um pouco diferente dela. Não esperaria por um milagre ou... Uma Fada Madrinha pra me ajudar a realizar um sonho. Correria atrás
- É... Eu devia aprender alguma coisa com você. - Caio baixou a cabeça.
- Como assim?
Caio não respondeu e Joaquim pensou que ele estivesse querendo ser misterioso mais uma vez, mas acontece que Caio não estava a fim de admitir que havia perdido a coragem de lutar pelo o que queria: O sonho de cantar. E talvez, ele ainda estivesse esperando por um milagre.
- Minha mãe gostava muito de Cinderela, também. - Joaquim falou. - Talvez seja por isso que eu curta a história. Gosto praticamente de tudo que ela gostava, ultimamente. Talvez seja uma forma de me conectar a ela.
- Mas ela está aqui. - Caio tocou em seu peito. - Acredite em mim. Sei o que é sentir saudade... Dói muito. Mas eu sei que meu pai ainda está em meu coração e eu o sinto a todo instante.
- É... eu sei disso. Só que não é tão fácil. Eu praticamente brigo com o meu pai o tempo todo. No fundo, acabo fazendo o que ele quer por medo de perde-lo. Mesmo que de forma insensível, eu ainda o tenho. Acho que sinto mais falta do relacionamento que eu tinha com ele do que da minha mãe. - Joaquim pensou no que disse e arregalou os olhos. - Isso foi uma coisa ruim de se dizer.
- Não. - Caio sorriu. - É normal, é humano... É como se sente. Sei que amava muito sua mãe.
- Amo, sim... - Ele olhou para as estrelas. - E você tem razão. Ela é o meu anjo da guarda agora.
- É... - Caio olhou pra cima de novo.
Joaquim abaixou os olhos. A menina podia estar usando máscara e mesmo assim, ainda era linda. Ele não sabia ao certo dizer o que despertava esse interesse nela. Talvez devia ser o brilho que ela emanava, naturalmente. Uma autoconfiança ou seu carisma. Devia ser o seu mistério... Ele não sabia dizer. Mas sabia que a queria. Sabia que a conhecia e ele desejava saber mais. Ele queria mais dela.
- Quem você vai ser amanhã? - Perguntou. - Supondo que estudemos na mesma escola e iremos nos reencontrar, assim saberei como te achar.
- Que tal focar no presente, gatinho?
- Que tal parar de me deixar agoniado de curiosidade?
- Dá pra ver um pouquinho do meu rosto.
- Não é o suficiente! - Joaquim reclamou e Caio riu alto.
- Ah, você é incrível mesmo.
- O que você quer?
- Como assim? - Caio o encarou.
- Você disse que podemos ser o que quisermos ser.
- Bem, é verdade. Sem fé a gente não chega a lugar algum e eu acho que esse mundo precisa de esperança. - Caio olhou pra frente. - Há tanta maldade... É tão difícil suportar tanta coisa lá fora. Preconceito, injustiças... Falta de respeito. Não saber se vamos voltar pra casa no dia seguinte... - Ele desfez a cara de amargura e sorriu. - Mas temos que seguir em frente.
- Tem razão. - Joaquim não podia estar mais encantado. - Então?
- Então o quê?
- O que você quer? Essa noite eu sou o seu anjo da guarda. Vou te conceder um desejo.
- Ah, entendi... - Caio riu. - Tudo bem. Eu quero... Ah, não. - Balançou a cabeça afastando o pensamento que o ocorreu por um momento.
- O que foi?
- Nada, não...
- Fala.
- Não! - Caio baixou os olhos tristes, mas sentiu o peso do olhar de Joaquim. Suspirou e confessou: - Eu ia dizer que quero cantar.
- Ah. Acha que não canta bem?
- Muitos dizem que eu canto muito bem. - Caio o olhou com um sorriso
- Então cante.
- Não dá. - Amarrou a cara de novo.
- Por que não? Oras, eu te concedi o seu desejo. Cante... Quero ouvir sua bela voz. - Joaquim o olhou com expectativa.
- Não dá... - Caio não quis dizer por um tempo, mas suspirou de novo e contou a ele: - Digamos que fui proibida de cantar
- Por que alguém faria isso?
- Uma bruxa muito cruel me amaldiçoou.
Joaquim pôs a mão no pescoço dela e depois tirou de leve. O leve toque fez as pernas de Caio tremerem e um desejo de que Joaquim o tocasse mais surgir.
- Pronto. Tirei a maldição! - Joaquim disse.
- Você não tem esse poder!
- Quem disse? Cante pra mim! A bruxa malvada não está aqui, minha bela dama. Cante, deixe-me ouvir sua voz e se ela aparecer para nos amaldiçoar, eu retirarei a minha espada e a matarei. - Disse o loiro de forma dramática, novamente.
- Mas o Pequeno Príncipe não é violento.
- Vale a pena ser violento se for pra salvar a minha princesa.
Caio riu e seu coração bateu forte. Ele não resistiu e ele sentia muita falta de cantar em voz alta, não apenas em sua mente. Pensou no que devia cantar, mas não tinha ideia. Até que ela voltou. A melodia com a qual tinha sonhado e que não saía de sua cabeça. Ele começou murmurando-a e depois abriu os lábios. Não disse palavras, mas a cantarolou, de olhos fechados viajando. E nem percebeu que um Joaquim o encarava boquiaberto, surpreso e intrigado.
- Que música é essa? - Ele perguntou cortando a garota.
- Não sei... Eu sonhei com essa melodia noite passada e agora ela não sai da minha cabeça. - Confessou Caio, sorrindo.
Joaquim ficou encarando o nada, tentando entender aquela estranha coincidência, mas não sabia chegar a alguma conclusão. Era estranho demais. Será que aquela música existia? Ele achou que apenas ele tinha sonhado com a melodia e que estava sendo original, mas... E se apenas os dois tiverem sonhado? Quais as chances disso acontecer?
Caio o encarava intrigado e Joaquim se sentiu... Inspirado. Ele não acreditava em destino, sorte, conto de fadas ou mágica. Mas aquilo não podia ser uma simples coincidência. Ele sonhou com aquela melodia e aquela garota, linda ali... Estranhamente familiar, conhecia aquela música. As letras começaram a brotar em sua mente. Pensou na mãe e no momento que compartilhava com aquela menina. E no tom da mesma melodia ele cantou:

Um Diferente Conto Da Nova CinderelaOnde histórias criam vida. Descubra agora