Capítulo 4

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           Amanheceu e o dia se iniciava com muito trabalho pendente. Era tempo da colheita; os milhares de pés de café estavam recheados, esperando para serem esvaziados.
Joel caminhou apressado para o cafezal e Teodoro se dirigiu ao celeiro. Gertrudes o acompanhou.
         Era tarefa do jovem italiano levar lenha à cozinha do casarão todos os dias ao amanhecer. Naquele dia, Gertrudes quis acompanhá-lo até o celeiro, utilizando-se do pretexto de desfrutar um pouco mais da sua companhia. Lá chegando, ofereceu-lhe ajuda, pegando parte da lenha, a quantidade que seus braços suportavam. Mas, quando já estavam a caminho do casarão, Teodoro lembrou que não havia fechado a porta do celeiro e pediu que Gertrudes prosseguisse sozinha.
        A bela moça caminhava em direção à porta lateral do casarão, que dava acesso à cozinha, quando viu um rapaz magro e alto andar em sua direção. Era José Arutes, o filho do Barão. Ela estremeceu.

— Moça, isto deve estar muito pesado! — Exclamou Arutes, detendo-a —Quero saber de quem foi a ideia de fazê-la desempenhar esta tarefa! Vamos, deixe-me ajudá-la. — Estendeu os braços.
— Por favor, senhor, não precisa se preocupar. Consigo fazer sozinha. — Gertrudes respondeu sem jeito.
— Vejo que consegue. Mas, onde existir braços masculinos, mulher
não deve utilizar-se de suas forças. Poupe-as para afazeres mais delicados. Agora solte a lenha. — Ordenou.
— Mas está tudo bem. — Ela respondeu agarrada à carga.
— Como você é teimosa! — Reclamou Arutes.

Neste momento, Teodoro chegava apressado para deixar o restante
da lenha na cozinha.
— Rapaz, faça-me o favor de retirar esse peso dos braços da moça. - Arutes pediu.
— Sim, senhor. — Respondeu o italiano. — Dê-me isso, Gertrudes.
— Teodoro pediu, recolhendo a lenha dos braços dela e seguindo para a cozinha em seguida.
— Então você se chama Gertrudes? — Perguntou Arutes.
— Sim, Gertrudes Bertolini.
— Muito prazer, sou Arutes.
— Eu sei quem é o senhor. Muito prazer, senhor Arutes. — Ela disse, encarando-o com seus encantadores olhos castanhos.
— Aparento ter tanta idade para que me trate por senhor? — Ele questionou intrigado.
— Ah, não! Percebe-se que está no ápice da juventude! Quero apenas demonstrar-lhe respeito.
— Pois saiba que há outras maneiras, bem melhores, de se demonstrar respeito.

A moça sorriu.
— Há quanto tempo você está na fazenda, Gertrudes?
— Oito meses.
— Não me recordo de tê-la visto antes. — Arutes não costumava ter contato com os empregados da fazenda, pois trabalha com números, trancado em seu escritório.
— Encontramo-nos algumas vezes.
— Certamente você não estava ajudando com a lenha, senão eu teria evitado! — Arutes brincou.
— Não, eu não estava. — Respondeu com um sorriso largo. — Mas costuma levar lenha à cozinha?
— Não, não. É tarefa do Teodoro, ele é meu parente e mora comigo e meu pai. Apenas lhe ofereci ajuda.
— Ele errou em permitir que um trabalho tão grosseiro fosse feito por uma moça.
— Minha capacidade vai muito além disso. Mesmo assim, obrigada por se preocupar.
— Eu não quero mais vê-la carregando peso. E entenda isso como uma ordem! — Falou em tom de brincadeira.

Gertrudes novamente sorriu e respondeu:
— Tem minha palavra!

Arutes meneou a cabeça e se retirou.

        Desde a chegada da família Bertolini à Fazenda Boa Fé, os dias seguiam todos iguais. Aquela tinha sido a primeira vez em que Gertrudes sorria tantas vezes seguidamente. O tratamento que ela recebera de Arutes fez com que uma semente de esperança fosse plantada em seu coração. A serenidade transmitida por ele de alguma forma a tranquilizou. E, naquele dia, ela não mais se maldisse de estar ali.

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