Capítulo 13

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Aprimeira ferrovia do Brasil foi construída por Irineu Evangelista de Sousa, o Barão de Mauá, e inaugurada em 30 de abril de 1854 por D. Pedro II. O trecho inicial tinha catorze quilômetros e meio,  e saía da Baía da Guanabara, na cidade do Rio de Janeiro, em direção à cidade de Petrópolis.

O café foi a causa do surgimento das primeiras ferrovias no Brasil. Sendo o produto a base de sustentação da economia brasileira da época, melhorias no sistema de transporte eram necessárias para facilitar o seu escoamento e para diminuir o tempo de transporte entre as fazendas produtoras e os portos de onde era exportado.

O Barão de Boa Fé almejava construir uma nova linha férrea em sua fazenda; este foi o motivo de sua ida ao encontro político no Rio de Janeiro. E para tratar do assunto de suma importância, alguns dias foram necessários na capital federal. Mas, tendo o seu pedido negado, o Barão e seu filho Arutes retornaram à fazenda decepcionados e decididos a não mais participarem da política.

A primeira coisa que Arutes fez ao chegar à fazenda foi procurar por Gertrudes. Já era quase noite e ao ser comunicado que a moça não mais estava no casarão, foi até a casa dela para vê-la; a saudade era tamanha que não conseguiria dormir sem antes conversar com ela.

Alguém batia na porta. Gertrudes estava certa de que seria Teodoro.

— Estou indo, meu bem. — A italiana gritou.
— E tomou um susto quando viu o filho do Barão.
— Arutes?! O que você faz aqui? — Perguntou espantada — Pensei que fosse meu pai. — Disfarçou.
— Eu precisava vê-la. — Ele sorriu — Não me convida para entrar?
— Talvez não. — Respondeu com frieza — Acredito que não tenhamos nada para conversar.

Arutes não esperava por aquela resposta.

— Não estou entendendo! Passo dias longe e quando retorno você acha que não devemos conversar? O que está acontecendo? — Ele questionou surpreso.
— Quantas perguntas! — Gertrudes suspirou — Mas farei questão de respondê-las. Primeiro você recebe a visita da sua futura noiva. Em seguida, viaja sem ao menos se despedir. Eu sei que não tenho direito algum de lhe cobrar nada, afinal, nada me foi prometido, mas acreditei em suas palavras. Você se aproveitou do meu sentimento, da minha sinceridade, do meu bom coração. — Despejou com tom de voz triste.
— Pois a senhorita está muito enganada! Será que posso me defender de suas acusações? Posso entrar? — Ele insistiu.
Demorou alguns segundos para Gertrudes decidir o que responder. — Sim, entre. — Ela finalmente consentiu.

Arutes correu os olhos pela humilde casa onde a moça morava.
"Como podia caber três moradores ali?" — Questionou-se em pensamento. E, constrangido, não esperou que Gertrudes lhe convidasse a sentar. Ali, em pé junto à porta, Arutes começou a falar:
— Tudo é um grande mal-entendido. Antes de partir, procurei por você para avisá-la sobre a viagem, como também para falar-lhe sobre a visita de Alicinha. Mas não a encontrei e, como estávamos atrasados, não tive tempo de me despedir. Quanto ao que se refere como minha futura noiva, quero deixar claro que eu não tenho, nem nunca tive, nenhum envolvimento amoroso com a senhorita Alice. Ela acabou alimentando falsas esperanças, mas já cuidei em esclarecer tudo.
— E o que deveria ser esclarecido? — A italiana perguntou curiosa.
— Que meu coração finalmente se encantou por alguém. — Ele segurou-lhe a mão — Gertrudes, durante toda a viagem sua imagem estava fixa em minha memória, sem desaparecer nem por um segundo.

A moça não esperava aquela declaração. Até pouco tempo, acreditava que Arutes estava planejando seu noivado com a filha do Prefeito!

Ele continuou:
— Depois do que vivemos, é impossível fingir que nada aconteceu! Eu jamais teria me aproximado de você se minhas intenções não fossem as melhores. Não sou homem de brincar com os sentimentos de alguém. Você os confiou a mim e eu os cuidarei bem, assim como confio os meus a você.
— Ah, Arutes! — Gertrudes suspirou sentando-se na cadeira da sala — Foi tão difícil pensar que você poderia estar com outra mulher! E mais difícil ainda foi ver o entusiasmo de seus pais com a possível união entre Alice e você. Estão certos de que ela é a mulher perfeita para nora.

Arutes estendeu a mão para Gertrudes, fazendo-a levantar novamente.

— A mulher perfeita é a mulher que eu desejo. Essa escolha cabe apenas a mim. Certa vez, você me falou: "cabe apenas a você decidir o caminho que deseja trilhar", lembra? Eu decidi. E, quanto aos meus pais, você não precisa se preocupar, eles se acostumarão com a ideia.
— Pensa em comunicá-los sobre nós? — A moça perguntou surpresa.
— Não acha que terei um relacionamento às escondidas, acha?
— Não. Sei que é um homem muito bem resolvido...
— Todos saberão que você é minha namorada. Quer dizer, se você
quiser sê-la. Isso você não respondeu ainda.
— Mas você esqueceu de fazer a pergunta... — Ela brincou.
— Achei que o pedido estivesse subtendido entre as palavras que acabei de falar.
— Prefiro a clareza das coisas...

Arutes sorriu sem jeito.

— Você aceita ser minha namorada?
— É o meu maior desejo. — Ela respondeu aproximando-se dele.

Arutes a beijou.

— Preciso da permissão de seu pai. — Disse ele.
— Certamente, precisa. Todavia, prefiro que comunique primeiro aos seus pais. Eles precisam ser informados antes, para não correr o risco de ficarem sabendo por terceiros.
— Agora mesmo vou contar-lhes a novidade. Mas agora temos um grande problema.
— Qual?
— Sabendo que está aqui tão perto, como conseguirei ficar longe de você? — Disse abraçando-a.
— Um dia estaremos juntos o tempo todo. — Ela sussurrou.

Gertrudes o acompanhou até o alpendre da casa e, enquanto o casal se despedia com um beijo apaixonado, Teodoro surgiu bem à frente deles.
— O que está acontecendo aqui?! — Ele perguntou nervoso.
—Teodoro! — Gertrudes exclamou desconcertada. E, voltando-se para o novo namorado, falou — Arutes, deve lembrar-se de Teodoro, não?
— Claro. Tudo bem, rapaz?

Atônito, o italiano saiu dali sem nada dizer.

— O que há com ele? — Indagou o filho do Barão.
— Não se preocupe. Ele é um pouco temperamental. — Gertrudes tentou justificar.
— O pobre rapaz parece não estar tendo um dia bom.
— Infelizmente nem todos podem ser felizes. Mas o importante é que nós podemos. — Foi a resposta de Gertrudes.

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