Curvo minha costa e sinto minha coluna vertebral estalar. Estico meu braço, pareço um gato assustado. Acomodo-me na cadeira, pego a caneta e volto a escrever no Daniel - o diário -. Heyoon me fez voltar a fazer terapia e, consequentemente, tenho que escrever nesse diário idiota. Minha médica insiste nessa palhaçada. Ok, talvez isso me faça bem, mas é bastante constrangedor.
Transcrevo cada filosofia maluca que habita em minha cabeça para as folhas de papel. Exponho cada pensamento. Detalho a angústia instalada dentro de mim. Transcrevo também os poucos motivos de felicidade que tenho vez ou outra. Palavra por palavra, vou montando textos enormes e, de certa forma, construtivos para a minha saúde mental.
Acabo percebendo que a palavra mais citada entrelinhas é "Noah". Não sei se isso é bom ou ruim, está tudo tão confuso na minha mente.
Toc. Toc. Toc.
Ouço o som de alguém batendo na porta e, ridiculamente, ainda penso que vai ser o Noah. Argh. Acordo todos os sentidos do meu corpo, forço-me a levantar da cadeira e arrasto-me até a entrada do apartamento. Abro a porta e vejo Heyoon estacionada em frente.
- Vamos sair! - ela diz.
- Não, não vamos - aviso de antemão.
- Quero te apresentar alguém...
- O quê? - ela mal termina a frase e meus nervos já ficaram a flor da pele - Por favor, não me diz que está tentando fazer com que eu esqueça o Noah conhecendo outra pessoa?
- O quê? Não! - ela diz atrapalhada - É apenas uma garota que eu conheci, ela vai estudar aqui ano que vem. Você vai gostar dela, vamos?
- E você quer sair pela universidade comigo, euzinho, me, I, myself? - pergunto desconfiado.
- Qual o problema?
- Não se faz de sonsa!
- Apenas diga se você vem ou não.
- Não!
Ela me empurra carinhosamente para dentro de casa, mas antes de ela fechar a minha porta vejo a do apartamento da frente abrir. Vejo um cabelo bagunçado e os lindos olhos verdes que também se prendem aos meus agora. Respiro fundo, estou imóvel. Esse é um daqueles momentos que apenas um olhar vale mais que mil palavras. Qualquer um que visse-nos ali, tristes, amargurados e deteriorados pelas noites sem dormir, perguntaria porque não simplesmente voltamos a nos falar e assim voltamos a ser feliz. Tenho a impressão de que tem algo maior, talvez um egoísmo ou a sensação de que não vai dar certo, acho que isso faz com que ele não venha pedir desculpas.
Sou arrancado de meu transe quando a porta é fechada por Heyoon. Suspiro alto. Sinto a mão dela em minha costa.
- Vai ficar tudo bem. Dê tempo ao tempo...
- Eu vou me arrumar - digo com a voz fraca.
Eu segurei a vontade de chorar na frente da Heyoon, mas agora, no banheiro, sinto as gotas quentes cair sobre o meu rosto. Gosto de pensar que lágrimas são uma maneira de se livrar da tristeza e angústia, assim nosso corpo fica mais leve e tem lugar pra felicidade. Então não, eu não me importo de chorar de vez em quando, afinal, eu também sou humano.
Assim que visto a minha calça preta apertada e uma camiseta estampada qualquer, olho no espelho e vejo que minha cara melhorou bastante com apenas um banho. Terminando de me auto-adimirar saio do quarto e vejo a Heyoon com meu diário.
- O que você está fazendo com o Daniel? - pergunto desesperado pra tirá-lo da mão dela.
- Você deu um nome pro seu diário?
- Não interessa... Quem mandou você pegá-lo?
- Sua psiquiatra - ela responde firme.
Apenas tiro-o da mão dela e guardo dentro da gaveta.
- Vamos? - pergunto.
- Ela disse que acabou de chegar na lanchonete - Heyoon conta -. Então sim, vamos.
Pego as chaves da casa e caminho até a porta, seguido por minha coleguinha asiática. Descemos as escadas - o que me faz pensar em Noah, nas tantas vezes que passamos por aqui juntos -, e quando me encontro do lado de fora, dou um longo suspiro. Sinto o ar fresco invadir meu pulmão e depois sair. O dia está bonito.
Talvez eu seja louco por gostar de observar as pessoas, é um hábito que tenho desde criança. Gosto de ver suas ações, seus sorrisos, as caras de deboche, raiva, etc. Os humanos muitas das vezes são seres completamente previsíveis até serem postos em situações que pra eles nunca iriam acontecer - assasinatos, traições, vinganças -. As pessoas mostram suas verdadeiras faces em momentos difíceis, então olho cada pessoa ao meu redor e tento imaginar como ela agiria em alguma situação aleatória. Eu estava prestes a imaginar a moça, da mesa ao lado, matando o marido dela depois de descobrir que estava sendo traída, mas Heyoon me atrapalhou...
- Seu pedido chegou, Josh.
- Oh, muito obrigado - falo para uma garçonete que, surpreendentemente, não é a Sabina.
Direciono meus olhos para a garota simpática sentada à minha frente. Percebo seu hábito de mexer no belos fios castanhos de seu cabelo a cada dez segundos - alerta de hipérbole -. Ela, provavelmente, percebeu meu olhar e direcionou seu olhos, por baixo das lentes do óculos roxos, para mim.
- Então, você tá sofrendo por amor? - ela pergunta.
Me pergunto como ela sabe disso, mas acho que no fundo não me surpreendo muito. A Universidade toda deve estar sabendo do que aconteceu à essa hora. Fofocas correm mais rápido do que deveriam, mais rápido até que a veracidade. Decido não me importar com a pergunta, prefiro responder e meio que desabafar um pouco. Agora ela que aguente minhas reclamações...
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ᴀᴜᴛᴏ ɪɴsᴜғɪᴄɪᴇɴᴛᴇ ✰ ɴᴏsʜ/sᴀʙɪʟᴇʏ/sʜɪᴠɪɴᴀ ❖ Now United
FanficJosh Beauchamp e Noah Urrea são estudantes de uma universidade de São Paulo. Josh é uma pessoa auto-insuficiente ao contrário de Noah que se dá muito bem consigo mesmo. E apesar das diferenças, eles têm a mesma forma de se livrarem de pessoas e pens...