O espelho

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Se eu soubesse que o casamento do meu pai resultaria nisso, não teria apoiado.
"CLAIR" elas gritam para que eu as sirva sem um agradecimento. Talvez não seja 100% culpa delas, a minha madrasta que as criou para serem cruéis... embora tenha sido uma escolha delas ser má, eu não tento decifrar a mente delas, não mais.
Volto para a realidade quando ouço um xícara bater na mesa, meu olhar muda da janela para os olhos de minha madrasta.
— O chá está frio.
— Estava quente quando fiz mas vocês demoraram para acordar.
— Você deve estar se achando muito para me responder.
— Desculpe, eu achei que queria uma explicação.
— Você não da explicações, apenas desculpas. De um jeito nisso.

🌒

Amanhã é meu aniversário, completo 19 anos. Não é uma data especial a muito tempo, gostava de comemorar quando criança já que meu pai sempre me fazia um bolo enorme e cantava uma canção... agora preferia manter em segredo, sempre faziam questão de me humilhar mais no dia do meu aniversário.
Não converso com outras pessoas já faz muito tempo. Costumo escrever tudo que eu penso em um papel para não guardar para mim e depois o jogo no lago. Os animais têm sido os mais calorosos.
A minha vida não é tão ruim, outros vivem pior com certeza. Não culpo meu pai, fazemos coisas por amor que vão além da lógica ou da razão... talvez eu o culpe por morrer e me deixar sozinha aqui. Será que fiz algo para merecer tudo isso? Acredito em justiça, é uma das poucas coisas em que ainda acredito e deve haver uma razão para tudo isso... mesmo já tendo perdido a fé, quero algo melhor para mim.

🌒

O sol adentrava a janela, incomodava meus olhos e então os abri. Era hora de levantar.
Deixei a água ferver tanto que ela evaporou quando me dei conta, será que tudo daria errado?
Assim que coloquei a xícara na bandeja escutei um barulho. Parecia passos, alguém estava se escondendo. Peguei uma faca e sai da cozinha em busca da pessoa. Talvez eu devesse ter pensado melhor nessa ideia mas o que poderia acontecer de pior?
Os animais estavam no mesmo lugar, não tinham sido roubado ou feridos... devia procurar outra coisa. Continuei andando cautelosamente olhando para todos os lados.
— Olá Clair.
Tomei um susto tão grande que acabei caindo no meio do feno. Era uma senhora, por suas vestimentas ela parecia uma mendiga mas era articulada.
— Como sabe meu nome?
Ela estendeu a mão para me ajudar e eu aceitei.
— Eu vim aqui por você, para ajudar.
— Desculpe mas deve estar me confundindo com outra pessoa.
— Passou tanto tempo com pessoas ruins que deixou de acreditar nas boas?
Ela tinha um olhar sereno e parecia sábia, como se soubesse tudo da minha vida e dos meus sentimentos.
— Trouxe esse presente para você, pelo seu aniversário.
Ela tirou de sua pequena bolsa um espelho de mão.
— Obrigada.
E o peguei e coloquei debaixo do braço.
— Olhe para ele.
— Eu já o vi, é bonito.
— Olhe para ele, querida.
Aquilo parecia um pouco suspeito, será que dava para entrar e nunca mais a ver?
Peguei o espelho e olhei para ele, me via... olhos escuros e cabelos escuros sem graça. Rosto magro e bochechas sem cor. Desgrenhada e um pouco suja.  Parecia que eu não me via a séculos. Desviei o olhar de mim, não queria mais me torturar e...
Olhava pelo espelho e tudo ao meu redor branco e brilhante. Estava ficando doida?
A luz foi tanta que acabei deixando o espelho cair e esfreguei os olhos porque ardiam. Quando abri eu fiquei boca aberta. Não estava mais no quintal da minha casa, estava em um parque. Sentia a grana com a ponta dos meus dedos e o cheiro de ar puro era poesia. Um lago reluzente com patos e Cheio de pessoas com roupas estranhas, vestidos longos e cheios e cabelos presos com chapéus. Homens de terno e palitó acompanhando as moças e senhoras. As propriedades pareciam tão delicadas e preciosas...
— Com licença senhorita, você está bem?
Ouvi uma voz que me distraiu de olhar para tudo ao meu redor que estava mudado.
Era um homem, alto, cabelos escuros e olhos escuros, quem eu queria enganar? Ele era lindo, forte e... meu deus parecia um príncipe que saiu de um conto de fadas.
— Me ouviu? — se virou para a mulher ao seu lado — Será que ela sofreu algum acidente e não ouve bem?
— Onde estou?
Foi a única coisa que consegui dizer. Minha cabeça girava e estava difícil de respirar. Tudo ficou preto.

Perdida nos Bridgertons Onde histórias criam vida. Descubra agora