1. o início da queda

139 22 72
                                    

O INÍCIO DA QUEDA

AMANDA

2013

— Amanda Nogueira — Chamou a professora de Português.

— Aqui! — Gritei de volta, para me fazer ser ouvida por cima de todo o barulho que minha turma teimava em fazer, separada em grupos. Juro que cada um berrava mais que o outro.

— Acho que se tu respirar fundo mais uma vez, vai acabar se queimando com o fogo que está prestes a sair dessas narinas. — A voz calma, porém irônica, de Felipe soou perto do meu ouvido, o único jeito possível de ouvir alguma coisa dentro daquela sala de aula.

Fingi uma risada de escárnio.

— Tá me chamando de Dragão? — Interroguei, o rosto quase grudado de frente para o dele. Meus olhos encarando o marrom escuro que refletia meu rosto como uma grande angular. Esperava que meu olhar transmitisse o quanto eu estava emputecida, junto com os braços cruzados na frente do corpo.

— Visto que agora eu sou o alvo da fúria, tenho meus direitos. — Ele sorriu e seus dentes eram claros o suficiente para ele ser garoto propaganda da Colgate. Nem precisaria de tratamento digital. Isso que dá não beber dois litros de café por dia.

— Ah, cala a boca!

Me sentei de frente para a classe e deitei com minha cabeça exatamente no meio do livro didático que estava aberto.

Senti sua mão tocando meu cabelo, separando as mechas escuras com os dedos. Felipe sabia o tanto que eu não aguentaria mais um ano letivo naquela escola e, com a graça de Deus, era o último!

Ou assim eu estava fazendo de tudo para ser.

Estudava mais do que a escola exigia de mim, apenas para ter a total certeza de que, após o final do ano letivo, eu não precisasse colocar meus pés dentro daquela escola por mais uma hora sequer.

É assim que você se sente após passar todos os dias da sua vida, com exceção de férias e finais de semana, dentro de uma mesma escola - dos 5 aos 17 anos.

Felipe, meu melhor amigo, felizmente teve a sorte grande de trocar de instituição três vezes ao longo de sua jornada acadêmica... quisera eu ter pais que se mudassem de cidade a cidade como os dele. Saindo do interior para a cidade grande em alguns muitos passos.

— Lindinha, tá tudo bem? — Perguntou ele, ainda acariciando meu cabelo.

Fechei a cara e, vagarosamente, levantei o rosto para fitar seus olhos. Alguém realmente usa essa palavra? Não sei, é tudo graças à Stephenie Meyer que escreve "fitar" pelo menos dez vezes por parágrafo, acabei aderindo ao meu vocabulário após ler os cinco livros por mera curiosidade. Juro!

Para mim, Felipe sempre seria sinônimo de calmaria. Seus olhos me transmitiam paz, o que era extremamente bizarro.

— Tudo ótimo, docinho. — Dei um sorriso forçado. Apesar de ele me trazer essa paz estranha, detestava do fundo do meu coração que ele usasse palavras fofas para me chamar, meu sangue fervia. Logo, ao mesmo tempo que ele me trazia paz, ele fervia ela em um caldeirão bem grande e temperava com pimenta.

— Acho que precisamos de alguém para ser a Florzinho. — Ele fez uma cara de pensativo, enquanto o som da turma ia diminuindo conforme os grupinhos finalizavam seus assuntos.

Eu detestava eles.

Todos eles.

A falsidade de cada um me fazia querer vomitar no lixo da sala de aula e deixar ali, para que, com o tempo, todos começassem a sentir o cheiro podre e terem a mesma sensação que eu tenho toda a vez que eles lançam sorrisos uns para os outros.

Estrelas que nos guiamOnde histórias criam vida. Descubra agora