AMANDA
Eu finalmente conseguia respirar de novo. Um peso saiu das minhas costas, peso este que eu nem percebi que estava tão dolorido. Ele se assentava em meus ombros, deixando meus músculos rígidos e me causava dificuldade em respirar - parecia que minha caixa torácica estava apertada demais para os órgãos que comportava.
E agora estou aqui. Um pouco menos tensa, mas ainda com os músculos doloridos, tomando sorvete com minha mãe, um momento após seu turno terminar, em uma sorveteria da cidade - com cinco sacolas de roupas que compramos para aliviar nosso stress.
Estávamos comemorando algumas coisas, como a medida preventiva, o divórcio e o fim das minhas provas. Também era a última semana de aula e em breve eu estaria usando toga na formatura do Ensino Médio ao lado do meu melhor amigo que eu tinha voltado a conversar.
As coisas estavam se encaminhando, finalmente. E, bem na verdade, eu não sei o que vai acontecer daqui pra frente, mas espero que dê tudo certo.
É pelo que eu torço.
Pelo menos com meu pai as coisas se encaminharam. Ele aceitou assinar o papel do divórcio e, apesar de ter ligado chorando para a minha mãe diversas vezes, ela não cedeu. Sua voz nem tremia e isso fez com que eu percebesse a mulher forte que ela sempre foi. De alguma forma, acho que uma nova Amanda brotou dentro de mim ao ouví-la tão confiante, senti que eu também poderia ter uma voz. Ser ouvida. Me manter de cabeça erguida, sabe?
Não sei, me senti decidida.
Talvez tenha sido o peso que me saiu dos ombros, permitindo que eu os erguesse pela primeira vez em muito, muito tempo.
Após as provas, pude dizer ao advogado que não, eu não queria centavo algum de meu pai. E sim, eu poderia muito bem explorá-lo por tudo o que ele fez com minha mãe, mas eu não queria receber nada de alguém que agrediu a própria esposa. A mulher em que depositava beijos ao chegar em casa, para quem ele dizia que amava... um embrulho no estômago surge toda vez que lembro de nossos momentos em família. Toda vez que lembro que parecíamos perfeitos juntos, sem complicações além das contas para pagar e das discussões por futebol.
Eu já tinha decidido minha parte em tudo isso, se minha mãe tivesse dificuldade em manter a casa daqui para frente, eu me responsabilizaria por começar a trabalhar. Se entrasse na faculdade já poderia procurar por um estágio na área e tudo daria certo. Estaríamos juntas nessa, foi a minha decisão inicial. E final.
Eu me recusei a vê-lo. Não queria olhar para seu rosto e enxergar um agressor naquele que outrora me levava ao cinema, à praça e me comprava pipoca doce na área de refeição do shopping da cidade.
Ele agora precisava ficar distante de minha progenitora, mas essa foi a sua única punição por todo o dano que fez com nossa família. E por todo o dano que traria para a sua próxima família.
Minha mãe tinha medo. Medo de que ele fizesse o mesmo com a nova mulher e com a criança. Mas ela não podia mais fazer nada, estava fora de seu alcance. A mulher já sabia de tudo o que tinha acontecido e, ainda assim, por algum motivo não o dispensou. Apesar de sabermos que é errado, algumas coisas não são possíveis de nossa interferência.
Tudo o que poderíamos fazer no momento era isso. Divórcio. Distância e Seguir em frente. Sermos fortes. Termos fé.
E ter fé de que eu conseguiria entrar na faculdade também, pois não sei se aguentaria um ano inteirinho sem fazer nada, ou estudando novamente. Mesmo que arrumasse um trabalho, poderia não ser fácil assim de conseguir. Só de imaginar já fico desolada. Não posso passar por mais essa, acho que enlouqueço de verdade.
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Estrelas que nos guiam
JugendliteraturSempre ouvimos falar que amizade vem antes de namoro, certo? Isso para Amanda sempre foi muito bem definido: nunca deixar os amigos por conta de um possível namoro, mas para Felipe - seu melhor amigo - as coisas não eram bem assim, sua crença nas pe...