"Oi mãe, já cheguei"
Enviei a mensagem. Ela era enfermeira em um hospital que ficava há duas horas de distância da nossa casa e só chegava de volta lá pelas oito horas da noite. Meu pai, por sua vez, trabalhava em obras e estava sempre fora.
Durante a tarde eu tinha a casa só para mim, e meus estudos agradeciam... ou não. Talvez nem sempre, mas eu me esforçava.
Peguei um pacote de miojo dentro do armário, coloquei água em uma panela e preparei meu rápido almoço ao mesmo tempo que levava o notebook do quarto para a cozinha, conectando-o na tomada como se fosse um computador de mesa - pois ele necessitava de mais energia que eu - e abria uma apresentação em branco.
A casa inteira costumava ter paredes brancas, mas minha mãe começou a dizer que estava com cara de hospital e, assim, meu pai foi obrigado a trocar tudo radicalmente por cores vibrantes. Agora, a cozinha era amarela, a sala era azul e o quarto deles era, nada mais nada menos que... laranja.
Meu quarto era lilás, fruto dos meus 13 anos de idade quando eu quis ser rockeira, mas meus pais não deixaram eu pintá-lo de roxo e preto. Ainda bem.
Em poucos minutos eu estava sentada e meus dedos se revezavam entre segurar o garfo para levar a massa à boca e digitar rapidamente os seis principais motivos pelos quais Felipe deveria deixar para lá essa história de ficar com a garota dos seus sonhos, pois ela só lhe traria problemas e tudo se transformaria em um pesadelo.
Foi assim que cheguei em oito lâminas de apresentação.
Eu era uma ótima amiga, não é? Eu sei que provavelmente ele ficará um tanto puto no início, mas nós fizemos um pacto há um ano atrás, exatamente um ano depois do dia que marcou o início da nossa amizade.
Era uma tarde das férias de inverno. O dia lá fora estava cinzento e frio, não nevava porque não estávamos em um filme Norte-Americano, mas como vivemos no Sul do país a sensação era como se estivesse.
Eu tinha acessado um site de conversa com estranhos pela primeira vez, e ele pela terceira. Estávamos atirados no sofá da sala, ele estava sentado e eu, escorada em seu ombro enquanto mandava mensagens aleatórias para as pessoas antes de elas encerrarem a conversa - e assistíamos Jogos Vorazes na televisão. Foi quando Felipe recebeu notificação de uma garota de lá o adicionando em uma rede social que eu tive a ideia:
— Precisamos de um pacto. — Disse automaticamente, sem dar tempo para que ele sequer pensasse em enviar mensagem para a garota de cabelos loiros e olhos azuis que parecia uma versão saudável da Barbie. Me sentei no sofá, mas mantive as pernas em cima das dele.
— Um o quê? — Felipe questionou, passando a mão onde outrora esteve minha cabeça.
— Um pacto! É brilhante, sabe, todos os melhores amigos precisam de um.
— E um pacto sobre...? — A pergunta pairou no ar, enquanto eu sorria olhando para ele.
— Namoros, é claro.
— Não vem com aquela de nos casarmos se nada der certo para nenhum dos dois, não quero ser amarrado numa casa contigo, minha vida já vai ter dado errado, não preciso de mais punição.
Soltei um "ah" de surpresa e soquei seu braço.
— Babaca!
Ele riu, e o sol que entrava pela janela começava a baixar, escondendo-se entre as nuvens aos poucos, manchando o céu de tons alaranjados. Deve ter sido esta a visão que inspirou minha mãe a pintar o próprio quarto de laranja alguns meses depois.
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Estrelas que nos guiam
JugendliteraturSempre ouvimos falar que amizade vem antes de namoro, certo? Isso para Amanda sempre foi muito bem definido: nunca deixar os amigos por conta de um possível namoro, mas para Felipe - seu melhor amigo - as coisas não eram bem assim, sua crença nas pe...