Jantar

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Não ouvia som de musicas, ou vozes de homens embriagados. Era silêncio absoluto como se tivessem esvaziado os castelos. O mesmo homem que me tirou sangue, foi até lá me buscar.
- Pra onde tá me levando? E a minha criada?
- Ela não é importante.

Em outros tempos eu já teria desistido. A verdade é que a noite sempre lutou por mim em quanto eu apenas corria. O homem me arrastou todos os corredores até me levar aos aposentos do rei. Nos aposentos do mesmo estava só ele, e a noite.

- Cadê a minha filha Noite.
- Quem é Noite ? - Perguntou Miguel se virando pra mim.
Ao me olhar eu senti, senti como se estivesse naquele barco balançando de um lado pro outro, senti minhas pernas tremerem, e minhas mãos estavam frias. Me veio vergonha, vergonha de estar naquela situação, vergonha das marcas de queimaduras no meu rosto.

- Mas eu achei que...- Antes mesmo que Miguel terminasse de Dizer a noite o interrompeu.
- Sim, eu disse que tinha feito um feitiço para mudar a aparência, mas eu menti, ta. Ali sua amada, não sou eu. - Deu uma risada sarcástica. - Solte ela - Ordenou para o soldado.
- Então se o interesse não é da Maria que a nossa filha seja herdeira do trono, por que é seu ?
- Ela é uma bruxa Miguel, ela quer fazer um ritual satânico com a nossa menina, eu não quero que ela seja rainha eu quero que ela seja feliz.
- Quanta melancolia vocês dois. Calem - se. Senta lá plebeia.
A noite então se aproximou de mim e me jogou na cama. E o mesmo fez com Miguel.
- Senta lá magestade.
Em seguida arrastou um espelho para o meio no quarto e iniciou uma espécie de ritual.

As mãos de Miguel ainda eram as mesmas, quentes, grandes e macias. E quando ele tocou as minhas eu ainda senti as mesmas coisas.
- Você foi embora, e eu ordenei que era a vontade de Deus te deixarem em paz.
- Eu não podia ficar. Você me queimaria de novo.
- Me conte da Isabel, como ela é ?
- Você não teve filhos? Onde está sua esposa?
- Minha esposa faleceu a três dias.
- Coencidência - Pensei dizendo baixinho.
- Ela não era fértil, não segurava o bebê na barriga, sempre morriam antes de nascer.
- Sinto muito. Isabel é linda, tem os meus cabelos, mas é determinada como você, gosta do povo, é sempre boa, nunca faz nada que não seja pensando em outra pessoa.
- Ela vai ser uma boa rainha, me perdoa ?
- Chega vocês dois. Como podem se perdoar? Você queimou a mulher viva , e você ? Fez sexo com o primo dele, sempre gostou mais do poder do que do homem. Chega. Levantem - se.

Um espelho, desenhos místicos no chão. Ossos de porcos. Eu já tinha visto aquilo em algum lugar, mas quando a porta se abriu eu tive certeza.
- Augusta? - Perguntei sem acreditar.
- Eu disse que você ia pagar. - Respondeu ríspida, quando Isabel saiu de trás dela.
- Isabel ?
- Gabriele...- Respondeu a menina indo abraçar a mãe. - Eu senti sua falta, desculpa por ter saído assim. Mas que bom que chegou bem. Vamos morar aqui agora?
- Shiuu- Eu a abracei tão forte que sentia seus ossos estralarem. Era tão bom estar ali naquele abraço. Ela estava linda, linda como nunca esteve.
- Maria ? - Uma voz de criança disse. Quando direcionei o meu olhar não acreditava. Ele se lembrava de mim.
- Temerez ?
A filha de Augusta logo veio e me abraçou, o que ninguém entendia era como ela se lembrava de mim.
- Você está linda.

- Vocês conseguem transformar tudo em romance. Vamos Augusta acenda o fogo.

E assim Augusta acendeu um círculo de chamas. A noite começou a dizer palavras em línguas antigas, e no espelho apareceu um homem. Ninguém ali já havia visto um ritual de tamanha precisão, os restos mortais do porco foram se posicionando sozinho. Tragam- me o sangue e a veste.
Noite se despiu diante do espelho, ficando totalmente nua. Pegou o primeuro cantil e se banhou com o sangue do rei, e apanhou o outro, e se banhou com o sangue da Maria. Os homens trouxeram- lhe as vestes, semelhante as que estavam no baú de Cecília Amaralles. Eu reconheci logo quando vi. Ela era a Cecília, ela era a dona das mechas ruivas, ela era uma ancestral minha.
Ela se vestiu e virou - se para nós.
- Venha pequena.
- Não va filha fique aqui.
- Sansh - Ordenou e o homem logo colocou sua espada em meu pescoço.
- Eu vou Gabriele, e eu vou ficar bem, a noite me ensinou a fazer o sol nascer, então não vai acontecer nada comigo.
Augusta parecia paralisada. Puxou sua filha pelo braço e ficou ali, olhando com ódio nos olhos, e agora eu sabia o que ela sentiu quando eu saí pela porta de sua casa com seu bebê. Lembro me até hoje, de olhar para a Isabel, e sentir suas mãos deixando de tocar as minhas. Ela me deu um sorriso lindo, pra ela tudo estava bem e tudo era leve, tudo ia dar certo.
- Filha, mata ela - Lembro de dizer em voz baixa. - Se você matar ela, ela não pode te dar para o homem do espelho. Mata ela.
- Eu te amo mamãe.
Eu chorei tanto naquele momento que lembro de Miguel em sua profunda inutilidade, envolvendo seu braços a minha volta.
- Venha minha rainha - Disse o rosto de fumaça no espelho.
Logo me lembrei de tudo, de todas as mágoas que causei por ser diferente. Olhei aquelas chamas no círculo do chão e me lembrei o quanto era incentivada a pular. Soltei a minha mão do Rei, e como nos sonhos me lancei no fogo, tomei a espada do soldado, passando em meu pescoço, e antes de cair lembro - me bem de crava - la nas costas da minha pequena Isabel. Minha visão escureceu e eu escutava apenas os gritos, todos que estavam ali gritavam, gritavam alto, desesperados, sem parar. Só ouvia gritos em meio a escuridão.

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