A reação de Jonas foi inusitada. Achei que ele fosse querer me afastar, viver longe de mim, mas ele era humano demais. Ele estava tão irado com o que eu disse que sua reação foi de querer saber onde o sujeito morava, ele estava disposto a acabar com isso, mas eu o confortei dizendo que não deveríamos sujar nossas mãos.
Há seis meses atrás os sintomas apareceram. E não, não era intolerância, pelo menos não depois de uma semana quando fomos ao médico e ele disse que eu estava grávida. Foi a maior felicidade do mundo saber disso, eu nunca pensei que seria mãe. Mas tenho que confessar que os chutes dentro de mim não costumavam ser muito apreciativos.
Eu queria só mais uma coisa para a minha felicidade ficar completa. Eugênio não podia ficar impune, eu o queria preso mais que tudo. Jonas me disse que a prisão poderia acontecer caso fosse verdade e tivesse provas concretas, mas ai é que estava. E as provas? Eu não tinha como provar.
Eu também queria ver minha família, e eu estava encaminhando-me para lá. Não podia rejeitá-los, não sei como eles não acreditaram em mim, mas guardar rancor poderia deixar-me doente, o coração apodreceria com tanta amargura impregnada.
Tia Gertrudes passou o endereço para Jonas, e nós já estávamos chegando. Enquanto isso eu acariciava meu ventre, uma vida estava ali dentro, eu cuidaria para sempre, até mesmo depois de adulto.
Jonas acabara de entrar numa curva. Ele segurou minha mão com a sua que não estava ocupada, levando até os lábios e beijando-a. Estava vestindo um short jeans bege e uma camisa de flanela. Eu adorava vê-lo assim, despojado.
Os seis meses que estávamos vivendo passaram sem que percebêssemos. Jorge voltou para casa, me recebeu tranquilamente, até beijava minha barriga quando via o bebê mexer.
Mas o pior de tudo foi a notícia da morte da mãe. Isso foi de cortar o coração. Mesmo Blenda sendo uma megera, eles ainda a amavam, pesou mais para a caçula do que para os outros.
Deixamos de lado a causa da morte, talvez não fosse apropriado contar o que a mãe realmente era. Disseram que ela sofreu um acidente de carro, e que perdeu muito sangue. Claro que Isaac quis saber o que aconteceu de verdade, e eu mesma contei a ele. Disse que disputamos uma arma, e que houve um disparo que até hoje eu não sei como ocorreu. Ele não disse nada, apenas me abraçou para confortar a dor que sentia.
- Chegamos. – disse Jonas, puxando o freio de mão. Ele olhou-me, se perguntando se eu estava preparada. – Acha que consegue?
- Acho que sim. – respondi.
- É noite de Natal...
- Não é a mesma depois da minha partida. Tia Gertrudes vinha todos os anos para saber, e de fato tudo mudou. – olhei através do vidro transparente.
A rua estava deserta, alguns piscas espalhados pela rua, algumas casas em harmonia, tocando músicas, talheres tilintando, pessoas felizes. E a única casa fora dos costumes era a minha, ou deles. Não havia nenhum enfeite, nenhum papai Noel, ou renas, ou boneco de neve, mesmo sendo o Brasil com esse clima quente. Nada que dissesse que o natal passou por aqui. Nem mesmo a botinha do papai Noel que eu amava ver meu pai pendurando-a na porta da casa.
Basicamente o natal era a época mais importante para mim durante todo o ano. Eu adorava ir ao shopping, ou a lojas espalhadas pela cidade, comprar roupas, ganhar presentes, comer um delicioso panetone, ver os adultos entupindo-se de garrafas e mais garrafas de vinho. Eu adorava tudo aquilo, até que aconteceu o inesperado.
Durante aqueles seis meses o mais difícil foi conviver com o luto, que eu receei ser perpétuo, do que a gravidez em si. Jorge desmaiou três vezes durante o velório até o enterro, chorando desesperadamente, Mariana não tinha mais lágrimas, e Isaac passou mal, ficou indisposto e se ausentou de todos nós. Hoje ele estava fazendo intercambio nos Estados Unidos, Augusto aproveitou e o levou. Augusto prometeu que cuidaria dele, oferecendo sua casa para ele morar. Como já estávamos em família, Isaac concordou, e eu pedi ao Augusto que fizesse ele se sentir bem, e que cuidasse com toda a sua atenção. Depois de saber toda a verdade, de que Augusto era do F.B.I., Isaac o admirou, deixando a rixa de lado.
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Garota de Programa
RomanceNão há nada mais precioso em uma criança que sua inocência perante as maldades do mundo. Um acontecimento lamentável acaba por tirar Victória de sua vida e a afasta da família. Anos depois, ela descobrirá que a vida lhe faz propostas irrecusáveis...