- Espera, espera, espera! – disse Isaac super embasbacado.
Já era madrugada de segunda-feira, estávamos discutindo sobre Augusto ser filho de José Augusto Bittencourt que se chamava também José Fisher, que já se envolveu com tia Gertrudes e fingia-se ser alemão quando na verdade era brasileiro até o último fio de cabelo. Discutíamos também sobre como tramaríamos uma emboscada juntamente à polícia. Nesta altura, logo após o Isaac ter contado sobre nossa descoberta, a polícia já devia estar indo atrás de Augusto com um mandado de prisão. Eu expliquei para Isaac que seria muito imprudente chegar assim, exigindo explicações, até porque ele era totalmente inocente. Augusto vivia na Alemanha praticamente sozinho, ele me contou que via o pai raramente em jantares de fim de ano, confraternizações, reuniões de negócios, coisas do tipo. Mas Isaac tratou de me explicar que ele não seria prontamente intimado. Por eu ter aberto minha boca grande e ter dito que ele era profissional no ramo de sadomasoquismo, a polícia trataria de plantar uma loira bonita e gostosa para levar o homem à loucura e tirar informações. Não sei como a polícia faria para contatar, rastrear, o José Fisher/Bittencourt, eu só queria saber da prisão de todos, a saudade que eu estava sentindo de Jonas era visceral, capaz de arrancar meu coração.
Ficamos acordados por muito tempo, o sol já se exibia timidamente.
- Conversamos tanto sobre isso que não me contou onde estão seus irmãos. – falei.
Ele roçou o queixo liso.
- Meu irmão está no interior na casa de uma tia próxima de nós. Dois policiais estão na espreita montando guarda. Eu disse para não dar muitos sinais, Jorge é muito esperto, e nada bobo... Quanto a Mariana, ela insistentemente não quis ir, disse que se fosse para o interior morreria de tédio. Tão nova e tão birrenta.
- Eu a vi... Quero dizer, pelo celular. Vi o quanto seu pai a ama. – revelei.
- Mariana é como uma linha tênue, sempre sustentando meu pai à beira do abismo...
- Sabe, Isaac, seu pai ama vocês intensamente, sem favoritismo. Mariana é a única capaz de mantê-lo, até para não perder as estribeiras e desistir do casamento. Ninguém gosta de sentir-se pressionado, acuado, é como ele se sente, ou pelo menos se sentia.
Isaac me escutou atentamente, sem mover-se, o que me preocupou.
- Isaac, tudo bem? – me preocupei.
Ele ergueu o rosto, aclamado por lágrimas.
- Tudo, sim. É que você falando assim, parece que fez o scanner perfeito da vida do meu pai. Fico feliz que ele a tenha. Meu pai estava definhando cada vez mais. Eu sou o único que o compreende, eu acho. Mariana é novinha, Jorge é deslocado, eu sou o mais centrado. – continuou. – Quando ele se atrasou para o jantar...
- Não, Isaac, não o culpe. – pedi. – Ele estava comigo, eu sou a culpa...
- Acalme-se, eu não a culpo, muito menos o culpo. Como disse, eu o compreendo. Estava até para conversar com ele. Iria dizer para seguir em frente. Diria para não se preocupar, afirmando que a Mariana o entenderia mais futuramente.
Aquelas palavras me aliviaram ao extremo. Ele era calmo, via o mundo de uma outra forma. Se fosse outro filho qualquer mimado estaria me cobrindo de ofensas, difamando-me infinitamente. Previ uma amizade perpétua.
- Então... a Mariana ficará com quem?
Ele sorriu, pela primeira vez divertindo-se, e não era algo relacionado a ele.
- É sobre isso que eu queria falar com você.
Espera, quando vem um "é sobre isso que eu queria falar com você" já sabia-se que coisa boa não era. Até suspeitava do que se tratava.
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Garota de Programa
RomanceNão há nada mais precioso em uma criança que sua inocência perante as maldades do mundo. Um acontecimento lamentável acaba por tirar Victória de sua vida e a afasta da família. Anos depois, ela descobrirá que a vida lhe faz propostas irrecusáveis...