Thoughts

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Abri meus olhos quando senti um pequeno peso pressionando minha barriga, a peluda gata laranja havia se jogado por cima do meu corpo. Calamity me olhava com seus enormes olhos amarelos, como quem esperava alguma atitude positiva da minha parte. Rolei minha cabeça para o lado, e me deparei com seus cabelos em tom alaranjado caindo sobre seu rosto.

Merda.

O primeiro pensamento que tive. Levei minhas mãos até as laterais da minha cabeça, massageando delicadamente onde a dor pulsava. Senti a língua áspera da gata no meu queixo, seguido por um miado arrastado e suave. A mulher ao meu lado se remexeu, e eu senti meu corpo inteiro congelar. Ela pousou a mão sobre o próprio peito, e voltou a ter a expressão serena em seu rosto. Segurei delicadamente Calamity, e a coloquei no chão ao meu lado da cama. Com movimentos que mais pareciam ensaiados, fui me retirando debaixo da coberta. Meu corpo arrepiava conforme o lençol gelado escorregava por ele. Eu precisava ir embora e não queria que ela acordasse antes disso. O que eu iria falar? Como as coisas ficariam agora? Milhões de questionamentos habitavam a minha cabeça, e eu não tinha resposta para nenhum deles.

Na ponta dos pés, recolhi as peças de roupa. Minha calcinha estava jogada no corredor, e eu não fazia sequer ideia de como ela havia parado ali. Antes de fechar a porta do quarto devagar, me permiti encarar a ruiva adormecida na cama, com apenas metade do seu corpo coberto. Definitivamente ela era linda. Eu não poderia negar isso. Um sorriso se formou na lateral do meu rosto quando comecei a recordar da noite passada. Um erro que eu estava evitando pensar naquele momento. Com dois pequenos pulos, consegui encaixar a calça no meu corpo. Minha camisa arruinada, ainda estava jogada no sofá da sala. Inclinei meu corpo para alcança-la quando mirei na outra ponta do sofá a camisa que ela havia escolhido pra mim a noite. Segurei as duas camisas nas mãos, e instintivamente levei a sua em direção ao meu rosto. Deduzi que ela provavelmente havia usado aquela camisa recentemente, pois seu perfume estava grudado nela. Fechei meus olhos enquanto permitia que o cheiro invadisse meu interior, enchendo-me novamente de lembranças. Puxei o ar com toda força que eu tinha, e por fim guardei de qualquer jeito minha camisa manchada dentro da bolsa. Colocando a sua camisa em meu corpo.

Na cozinha, eu procurava o pote de ração da gata que deslizava entre meus pés. Após encontrá-lo no armário debaixo da pia, preenchi seu pequeno pote. O som de pequenos passos adentraram na cozinha, e ao erguer meu olhar angus estava se espreguiçando logo na entrada.

- Bom dia, garoto. – Acariciei a lateral das suas orelhas, e em resposta ele lambeu minha mão, deixando um rastro de baba nela.

Na entrada, segurei firme a maçaneta da porta, tendo consciência de que provavelmente aquela seria a primeira e última vez que eu estaria ali. Com longos passos, logo alcancei meu carro. Encarei a casa a minha frente, e procurei capturar cada detalhe, para que futuramente eu não esquecesse daquele lugar. Girando a chave na ignição, respirei fundo e dei a volta no gramado. Voltando a realidade.
***

Quando os pneus entraram na garagem de casa, o som dos cascalhos me trouxeram paz. O dia ainda estava amanhecendo, e só naquele momento me dei conta do quão cedo ainda era. O relinchar dos cavalos dentro do celeiro tiraram minha atenção. Desci do carro e tentei perceber se já havia algum movimento no interior da cozinha, mas tudo estava silencioso. Eu tentava respirar fundo a casa passo que eu dava, mas minha mente inteira borbulhava. Em vão, procurei as chaves de casa dentro da bolsa e só então percebi que tinha esquecido. Droga. Eu estava trancada do lado de fora da minha própria casa, que perfeito, não? Eu não tinha outra escolha a não ser esperar que uma alma caridosa acordasse e me deixasse entrar.

Decidi então que faria companhia aos cavalos. Tirei meu tênis e acabei calçando as botas de Doc que estavam apoiadas na escada. Me sentia um pato dentro delas, e eram terríveis para caminhar, mas eu não queria arruinar mais uma peça de roupa minha. O celeiro estava limpo, o que me deixou impressionada e deduzi que Doc havia feito uma boa limpeza ontem a noite. Com o ruído do portão abrindo os cavalos se aproximavam um a um, erguendo suas cabeças para fora dos estábulos. Afaguei com carinho o focinho de todos, um por um.  Romeu, era um valente puro sangue inglês, com sua pelagem escura que brilhava mais que meu cabelo depois de um dia de hidratação. Pirata era um paint horse marrom com branco, parecia um dálmata, igualmente estabanado como um, mas forte e altamente versátil. Nos estábulos ao final do celeiro, ficavam as éguas. Que por motivos óbvios, eram mantidas separadas dos machos.  Capitã era uma égua árabe, a primeira que Doc ganhou de um velho amigo. Sua cor amarelada tinha um charme especial. Doc contava que ela era furiosa no começo, e que foi por pouco que eles conseguiram construir uma amizade. Ele contava essa história impressionado com o fato de que eu apenas me aproximei dela uma única vez, e ela baixou a cabeça em direção a minha mão, esperando o afago. E hoje não foi diferente, ao me aproximar do seu estábulo capitã ergue o focinho, esperando ganhar atenção.

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