– Precisamos conversar – Falou o homem entrando com tudo na casa de Cristiane.
– O que houve Luan? – Perguntou Cristiane assustada com a atitude do homem.
Aqueles que conheciam Luan sabiam o quão calmo ele era. Era amigo próximo de Breno desde a adolescência, vindo a conhecer Cristiane depois, acompanhando o namoro, noivado e casamento do casal.
– É sobre a morte do Breno.
– Sim, o que houve?
– Algo está errado, a promotoria, a mídia, todos cairão em cima atrás de um culpado pela morte dele, então eu preciso saber, você teve algo haver com a morte dele?
– Como é? Você está me acusando de ter matado meu marido?
– Claro que não, eu te conheço Cristiane, sei que você jamais faria isso. Mas eu sou advogado e você pode precisar de uma defesa.
– Eu não tive nada haver com a morte do Breno. Aliás, ainda nem sei ao certo como foi que ele morreu, nem mesmo a perícia sabe.
– Mas eu sei que vocês não estavam se dando bem ultimamente, você estava infeliz e...
– Luan! – interrompeu – Eu tomei dois calmantes agora a pouco, estou morrendo de dor de cabeça e sinceramente não estou a fim de conversar sobre isso agora. Você poderia respeitar o luto de uma viúva e me deixar descansar um pouco.
– Você está mesmo de luto Cris? – Perguntou Luan enquanto saia.
– Meu querido, não pense que o fato de eu estar tendo um caso com você faz com que eu não tivesse sentimentos pelo meu marido, certo? Boa noite – disse fechando a porta.
Foi até seu quarto e trocou o roupão por uma camisola. Seu quarto estava sem colchão, retirado na parte da tarde por alguns amigos que não queriam que Cristiane se submetesse a ficar vendo a mancha de sangue que demoraria a sair. Ela foi até o quarto de hóspedes e se deitou. Começou a pensar em quando ela e Breno se conheceram na faculdade de medicina, ela com 22 anos e ele com 23, começaram a sair e com menos de um mês já estavam namorando sério.
Seus olhos cansados não aguentaram mais ficar abertos, ela se virou na cama a fim de encontrar uma posição boa para ficar. Estava se perguntando mentalmente se ela seria mesmo acusada de ter assassinado o marido.
Sentiu uma fina gota de água acertar seu rosto, sendo seguida por diversas outras gotas. O colchão da cama de hóspedes começou a dar levesvfuradinhas no seu rosto. Abriu os olhos e viu o verde. Olhou para cima e viu o cinza.
THUIM, THUIM...
Escutou o barulho vindo ao seu lado e ao olhar reparou que ali na grama tinha uma ferrovia em miniatura onde um trem de brinquedo dava voltas. Levantou-se e foi olhando lentamente ao seu redor e percebeu que estava em um parque. Foi vendo gangorras, escorregas e vários outros brinquedos espalhados na grama.
A nuvem cinza havia passado, levando consigo o chuvisco e deixando o céu negro sem nenhuma estrela. No fim do parque havia uma árvore. Cristiane não pôde acreditar naquilo que via. Na árvore grande e verde estavam várias crianças penduradas. Todas elas mortas, algumas com uma corda em volta do pescoço, outros de ponta cabeça com a corda amarrada em um dos pés. Ver aquelas crianças fez Cristiane se lembrar do sonho que tivera antes, onde foi atacada por uma criança morta numa sala de aula.
"É isso!" pensou "Isso com certeza é outro sonho!" Infelizmente, para Cristiane, ela estava certa.
Começou a andar por aquele imenso parque coberto por brinquedos, tentando se afastar o máximo possível da árvore de crianças mortas. Era noite, estaria tudo completamente escuro não fossem as luzes de alguns postes em volta daquele parque. Seus olhos vislumbravam o vazio daquele lugar. Todos os brinquedos abandonados, velhos e coberto de poeira. Aquele sonho começou a fazer Cristiane se esquecer da morte do marido, remetendo suas lembranças para sua infância, tão vazia quanto aquele parque.
Perdera os pais aos 11 anos em um acidente de carro. Ambos morreram na hora, com o impacto da batida causada por um motorista alcoolizado em outro carro. Cristiane estava dormindo no banco de trás, toda equipada com cinto de segurança quando a batida aconteceu e por causa disso não sofreu nenhum dano, pelo menos não físico, mas lembrar-se de abrir os olhos e ver seus pais arremessados pelo para brisa do carro causou nela um trauma enorme de viajar de carro. Sempre que precisava viajar tinha que estar completamente dopada com comprimidos, caso contrário poderia ter uma enorme crise de pânico. O irônico é que apesar de toda fobia por viagens, Cristiane era uma excelente motorista, porém, só dirigia dentro da cidade.
No reflexo da luz do poste que estava a sua lateral direita apareceu uma enorme sombra oval. Cristiane olhou para ver de onde vinha aquela sombra e se deparou com um brinquedo se aproximando dela. O brinquedo tinha formato de ovo com um rosto sorridente. Tinha braços e pernas saindo dos lados e de baixo. Na cabeça um chapéu com uma estrela de xerife de faroeste. Nas costas girava uma manivela, demonstrando que o ovo era um boneco de corda.
Quando o boneco ovo xerife sorridente de corda se aproximou de Cristiane ela pôde reparar que ele batia na sua cintura. A manivela nas costas do ovo parou de rodar, ele deu uma leve risada robótica e ergueu seu corpo oval para frente derrubando o chapéu e depois caindo aos pés da moça.
Cristiane recuou dois passos para trás. Um vento frio passou pelo seu corpo e um calafrio lhe atingiu a nuca. Olhou rapidamente para trás, com uma leve sensação de que estava sendo vigiada. Foi quando sentiu algo segurar seu pé. Olhou para baixo bruscamente e viu a mão do boneco-ovo segurando seu tornozelo.
Em um impulso Cristiane puxou sua perna para trás, mas não conseguiu se soltar. Era como se a mão do boneco-ovo estivesse colada com o seu tornozelo. Começou a sacudir a perna com mais força para ver se conseguia se soltar, mas foi em vão. O outro braço do boneco se mexeu, indo para frente e segurando a outra perna dela que se desequilibrou e caiu.
No chão, ela levou as mãos até o tornozelo, tentando a todo o momento se soltar das mãos do boneco-ovo que mantinha o corpo imóvel com o rosto sorridente virado para baixo. Ao perceber que de maneira alguma conseguiria se soltar Cristiane resolveu girar a manivela que ficava nas costas do boneco, pensando que talvez com corda ele a soltasse.
Girou então a manivela. Uma, duas, três, quatro voltas e esperou. O boneco ovo começou a se remexer no chão com leves espasmos, mas, diferente do que Cristiane pensava, ao invés de soltar seu tornozelo, o boneco-ovo começou a apertar mais forte. A médica levou as duas mãos até a parte superior do boneco, onde a pouco estava o chapéu, e fez força com os braços para empurrá-lo e levando suas pernas com força para o sentido contrário.
O boneco-ovo deu um rápido alavanco para cima, fazendo as mãos de Cristiane escorregar pela sua lisa face sorridente.
Leves rachaduras começaram a aparecer e Cristiane começou a se contorcer rápido tentando a todo custo se soltar das mãos daquele brinquedo, enquanto o aterrorizante rosto sorridente ia se desfazendo com as rachaduras que indicavam que alguma coisa sairia em breve de dentro do ovo.
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Paroníria
HorrorO renomado doutor Breno teve uma misteriosa morte enquanto dormia, ninguém sabe ao certo a causa da morte e várias suspeitas parecem cair sobre sua esposa Cristiane que começou a ter sonhos estranhos desde a morte do marido. Agora, Cristiane deve de...