Capítulo 12

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A claridade comprimiu as pupilas de Beatriz tão rápido que a mesma teve que levar as mãos em direção ao rosto para proteger os olhos daquela forte luz. Tinha acabado de sair de um imenso escuro. Esperou um tempo e foi abrindo os olhos devagar, se acostumando com a luz do ambiente. Olhou em sua volta, mas não conseguiu encontrar a porta de onde acabara de passar. Suas vestes também haviam mudado. Estava agora com uma calça jeans, um all star vermelho e uma camiseta também vermelha com a foto dos quatro integrantes da banda The Beatles, seguido pela frase "A Hard Day's night". Estava no meio de uma floresta, rodeada por árvores e acima de sua cabeça um céu, tão vermelho quanto sua camiseta, acusava que o cenário de seu sonho estava prestes a escurecer. Beatriz ficou nervosa. Não conseguia imaginar se seria pior ficar no escuro ali naquela floresta, ou no corredor do museu que acabara de sair.

Começou a caminhar apreensiva por uma pequena trilha de terra entre as árvores. A terra estava molhada e bastante escorregadia. Logo nas primeiras passadas viu seu all star entrar com tudo na terra fofa, dando a sensação que a mesma estava atolando. Ficou pensando em quantos sonhos normais já havia passado por aquela situação de estar fazendo alguma coisa em um lugar e do nada mudar de local e continuar o sonho de forma normal. Nunca parara para pensar nessas coisas até aquele momento, em que tinha total consciência dentro do sonho.

Os troncos das árvores eram de um marrom envelhecido, de várias formas e tamanhos e cheios de ramificações nas partes superiores onde poucas folhas secas brotavam. Um vento balançava os galhos ramificados que refletiam no chão através do vermelho do céu. Beatriz conseguia enxergar rostos e corpos naquelas sombras.

Enquanto seguia pela trilha, o vermelho do céu ia se dissipando deixando o ambiente a sua frente mais escuro. O caminho ia se abrindo mais e a quantidade de árvores diminuindo. Ao olhar para o chão já não identificava mais seus tênis. Apenas uma rápida tonalidade vermelha rodeada de lama. Olhou novamente para cima e viu todo o vermelho do céu se concentrar em um único ponto e ficar rodando lá em espiral.

Beatriz sentiu tontura com aquela espiral vermelha. Um vento frio soprou com força. A jovem olhou para trás e viu as árvores balançarem bruscamente. De cada uma delas o vento trazia o som de uma voz, e eram milhares de vozes, a maioria chorando, outras gritando. "Ainda estamos aqui" uma dizia. "Por favor, não" suplicava a outra. Tentou não dar ouvido as vozes, encostou-se em uma árvore e levou as mãos aos ouvidos, não os tampando, mas segurando a cabeça como se ela fosse cair. E esperou até aquele vento sumir, levando consigo os lamentos das árvores.

Olhou novamente para o céu e no lugar da espiral estava agora uma enorme lua cheia vermelha. Não deu tempo de vislumbrar a lua por muito tempo, pois o chão abaixo de seus pés começou a tremer. Olhou para baixo e viu a lama se afastar para os lados, revelando que abaixo de toda aquela lama havia um chão feito de tijolos. Tijolos amarelos tão reluzentes quanto ouro. A trilha de tijolos amarelos se estendeu para frente, formando um longo caminho repleto de curvas. "Eu estou indo para Oz?" Pensou antes de começar a andar pelos tijolos amarelos.

Beatriz não sentia frio, de alguma forma estranha aquela trilha de tijolos amarelos parecia aquecê-la. Não conseguia parar de pensar em outra coisa se não em Oz, o livro que tanto lera na infância e que fazia questão de passar para seus alunos, sempre tentando fazer com que seus alunos enxergassem o caminho de tijolos amarelos como uma representação para a busca de seus sonhos. Mas será que era isso que ela encontraria no final daquele caminho? Não tinha certeza de nada, apenas continuava andando cautelosamente, observando a floresta escura ao seu redor. A estrada de tijolos amarelos fazia muitas curvas e ladeiras. Por mais que andasse Beatriz não se sentia cansada, não sentia frio, muito menos calor. Não ventava e o som da floresta parecia que estava a milhares de quilômetros de distância.

Começou a andar mais tranquilamente. Foi sentindo-se segura. Parecia que se permanecesse dentro da estrada nada lhe atingia. Foi quando escutou um rugido vindo em sua direção. Olhou para a floresta e viu um enorme leão sair detrás dos galhos. Era uma figura enorme, com pelos tão dourados quanto à estrada a sua frente. O leão estava em pé, com as patas dianteiras cobrindo a parte inferior de seu corpo, como se sentisse vergonha. Beatriz se assustou e começou a recuar devagar para trás. Imaginou se o leão seria covarde como na história que tanto lera na infância, mas antes que pudesse compará-lo com o personagem do conto, o leão a sua frente levantou as patas, revelando um buraco em seu estomago que dava para o outro lado e rugiu com mais e mais força. Beatriz gritou, implorando para que a besta se afastasse, mas o leão veio com tudo na direção dela. Rugindo e atacando com suas enormes garras no ar. Beatriz deu outro passo para trás e percebeu que mais um passo estaria fora da trilha de tijolos amarelos. O que seria pior naquele momento, sair da estrada ou ser atacada pelo leão?

Não pensou duas vezes, correu com tudo para fora da estrada em direção a floresta. Seu corpo foi agredido por uma forte onda de vento, o frio veio logo em seguida. Seu tênis escorregou no piso enlameado fazendo o corpo cair de bunda no chão. Levantou rapidamente e continuou correndo para o meio das árvores. A respiração foi ficando ofegante. O cansaço começou a vim. Escondeu-se atrás de uma árvore esperando que a besta em forma de leão não a tivesse seguido. Levou as mãos em volta dos braços, numa forma de abraço para tentar se proteger do frio. Tentou espiar se a besta a perseguia, mas para sua surpresa não viu mais o animal. Agora, parado na trilha de tijolos amarelos em que estivera a pouco, estava um homem negro e alto.

Um sorriso veio a sua boca ao avistar outro ser humano ali. Será que ele afastou o leão? Não importava. Pensou em voltar correndo para a trilha de tijolos amarelos quando algo saiu detrás da árvore e atingiu seu abdômen. Seu corpo foi arremessado para longe, colidindo com outra árvore. Caiu de joelhos no chão enlameado. Sentiu na sua boca o gosto de sangue. Não fazia ideia do que tinha lhe atingido. Tentou se levantar quando novamente foi atingida. Dessa vez pôde ver o que era. Eram os galhos das árvores que a atacavam.

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