Paroníria

Capítulo 5

Não havia nada que chamasse mais a atenção em Cristiane que seus olhos. E não era por serem verdes, mas por serem autênticos. O humor de Cristiane era algo que ela nunca conseguia esconder. Se estava feliz, seus olhos mostravam. Se estava com raiva, os olhos não escondiam. E se ela estivesse triste então, seus olhos faziam questão de denunciá-la para que outros a acalentassem com seus olhares de pena. Apesar de serem olhos belos e invejados, Cristiane nunca gostou muito deles.

Caída ali na grama, com as pernas presas pelas mãos do boneco-ovo, os olhos de Cristiane revelavam o enorme pavor que todo o seu corpo sentia. Seu pavor aumentou quando o primeiro pedaço da casca do ovo caiu fazendo-a ficar frente a frente com seus tão indesejados olhos.

Daquele buraco que a casca deixou, os olhos verdes de Cristiane penetravam com ira os olhos de pavor da Cristiane presa na grama. As mãos do boneco ganhavam mais e mais força apertando seu tornozelo de uma forma que a médica achava que iria quebrar.

A casca começou a se quebrar mais, dando forma a uma nova Cristiane, que saía ensanguentada de dentro do ovo. Foi então que a verdadeira Cristiane gritou, sendo seguida pela falsa Cristiane que soltava um berro animalesco.

Quando o ovo se quebrou de vez, a figura que saiu do ovo pareceu ainda mais bizarra. Seu corpo estava todo ensanguentado. Os braços e as pernas ainda eram de brinquedo, apenas o resto do corpo, o que saiu de dentro do ovo, era humano. As pernas estavam esquecidas na grama sem movimentação alguma. Os braços prendiam o tornozelo da sósia e tentava puxar para seu lado. O rosto ensanguentado abriu a boca, revelando dentes pontiagudos iguais a da criança do sonho anterior.

Quando avistou a criatura-Cristiane se aproximar de seu rosto com aqueles dentes todos caninos a verdadeira Cristiane fechou os punhos e levantou seus braços frente à face, formando um escudo natural e automaticamente fechou os olhos, apagando o verde de seus olhos.

Não via mais nada, apenas sentiu a pancada em seus braços e então o peso empurrando-a para trás. Sentiu o rosto da besta aproximar de seu braço escudo e então abriu a mão, pensando em empurrar aquele rosto para trás, mas antes de empurrar sentiu a dor, forçando-a a abrir os olhos. A primeira coisa que viu foi o sangue escorrendo pelo seu braço esquerdo. Muito sangue. E então sentiu a falta dos três dedos da sua mão.

Gritou. Gritou de novo. E mais uma vez. Os gritos eram seguidos, quase sem intervalo de tempo entre eles. A criatura-Cristiane, que mastigava seu polegar, indicador e seu dedo médio, encarou-a assustada com todos aqueles gritos frenéticos.

Quanto mais gritava, mais os buracos dos dedos doíam e mais sangue jorrava. Sua mente pediu por controle, mas seu corpo não queria ouvir. Gritava sem parar. De dor, de raiva, de medo, gritava. Só parou de gritar quando escutou o som de um tiro.

O tiro cessou o grito. Cristiane mexia seu pescoço para todos os lados até avistar um homem segurando uma arma na mão, não muito longe de onde ela estava. A dor latejante dos dedos fez com que ela nem chegasse a perceber que a criatura havia soltado seu tornozelo. Só percebeu que estava livre quando o homem gritou, mandando-a correr.

A criatura caída no chão começou a se debater no chão, revelando que apesar do tiro que levou, ainda continuava viva e com uma ira enorme.

Cristiane ficou de pé, tentou correr, mas caiu. Seu tornozelo doía e estava roxo de tanto serem apertados. A criatura urrou forte e jogou seu tronco para cima, mexendo de um lado para outro até conseguir se equilibrar. Seus olhos eram de ira. Levantou os braços de brinquedo e foi com tudo em direção a Cristiane. O segundo tiro foi disparado e a criatura caiu de vez no chão, com um buraco na testa.

Cristiane chorava no chão, segurando a mão de dois dedos. O homem começou a andar em sua direção, parando em frente à ela. Tinha barba e cabelo grande, uma expressão séria no rosto.