Era uma manhã de sábado. Pela tradição dos Bings, era manhã de missa. Nunca fui um católico dedicado, muito menos praticante. A igreja, para mim, era um berço de hipocrisia e ostentação de fé. Cada um sempre queria mostrar que estava mais perto de Deus para esconder seus demônios internos.
Lá eu era apenas um fiel. Quando pequeno, me escondia na barra da saia de Adrienne. Muitos me encaravam como "o filho dos velhos" ou "a criança adotada" e me olhavam com estranheza. Eu não ligava, só me escondia com medo de ser descoberto e ter que voltar para o inferno que sobrou da minha vida como um Marshall.
Eu não queria encarar meus próprios demônios.
Sempre que eu entrava na catedral de Orange Falls, as "ovelhas" direcionavam seus olhos de coiote para mim. A vontade enorme de me perguntar sobre a pacata vida que eu levava ficava estampada nos olhos dos curiosos. Era uma igreja grande, onde todos sabiam da vida de todos, menos da nossa.
Os velhos tinham um certo cuidado comigo, eles não queriam me expor. Eles diziam que, após o incidente com Phillip, os fiéis passaram a frequentar a casa deles. Não para ajudar, mas sim para pedir provisões. Frank não era sociável, não como Adrienne. A partida da minha mãe adotiva fora um fator determinante para a quebra do contato com a igreja.
A Catedral de Maria, Nossa Rainha era muito bonita e bem extensa. Seus vitrais eram coloridos e ricos, vindos da França em um século que eu não me lembro, já que não prestava muita atenção nas aulas da catequese. Em seu altar, havia uma estrutura de Jesus feita em pedra, cercada por vitrais azuis e violetas. Um órgão enorme tinha seus canos de ferro direcionados para o público. O formato côncavo da estrutura interna propagava o som de uma mosca para toda a igreja. Era uma arquitetura divina de se olhar, profanada por almas podres como chorume.
Naquela manhã, eu vesti um terno preto. Era a missa em homenagem à alma de Adrienne. A manhã foi quieta, até o fim da missa. O padre, com seu sotaque holandês, pediu que eu me aproximasse do altar. Junto aos membros falsos, desejou-me forças e disse que a essência doce de Adrienne habitaria em meu coração para sempre.
Frank nos observava do banco longo de madeira. Phillip estava vestido como eu. Seu cabelo estava preso.
Do altar, pude enxergar Susan e Crowley nos bancos perto da saída. Ela chorava esboçando dor, mas o idiota do marido dela não conseguia nem me olhar nos olhos. O filho deles fora detido na noite anterior. Só Deus conhecia a dor que os dois carregavam no peito.
A missa teve fim depois de um tempo. Todas aquelas pessoas asquerosas perguntavam como eu conseguia seguir adiante, eu nada respondia. Apenas os cumprimentei por educação. Susan, com passos rápidos, me abordou logo que cheguei à porta da igreja.
- Filho, mais uma vez eu lhe peço perdão. Se eu tivesse pulso firme para castigar o Greg, nada teria acontecido dessa maneira.
- Vi pela televisão, eu sinto muito pela sua família. Mas tem certeza que ele era traficante? Não parece a postura do Gregory. - Mesmo sabendo a verdade, eu precisava confortar o coração de Susan.
- Ele foi acusado por isso, não haviam provas de que ele era ou não. O advogado abriu recurso, alegando que os meninos foram assaltados naquele beco. Não sei o que seria do meu filho se o Chess Hoodie não o salvasse daqueles marginais!
- Parece que esse garoto encapuzado realmente se importa com a cidade. - Susan abriu uma brecha em suas lágrimas, sorriu e olhou para mim.
- Tenho uma coisa para mostrar a você. - A mulher mexeu em sua bolsa, futucando muitas coisas. Após virar e revirar inúmeros objetos, ela puxou uma foto.
VOCÊ ESTÁ LENDO
CAPUZ XADREZ (Saga Chess Hoodie)
General FictionViu sua irmã morrer queimada aos dez anos. Sobreviveu à queda de um penhasco sem maiores explicações. Não há idade certa para conhecer a dor, e a dele veio cedo demais. Seis anos depois, vivendo longe de casa, Elliot é mais uma vez confrontado por t...