0 I STUPID WALKING WALL

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— Você poderia acelerar, por favor? — pedi, debruçando-me pelo banco

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— Você poderia acelerar, por favor? — pedi, debruçando-me pelo banco.

O senhor me mandou um olhar meio irônico sobre o ombro. Eu até consigo imaginar o que ele poderia estar pensando. É o infernal trânsito de Nova Iorque na caótica hora do rush.

— Só se eu passasse por cima dos outros carros. — seu forte sotaque hispânico estampado em cada uma de suas palavras soou impaciente, estava tão irritado quanto eu. Provavelmente se arrependia de ter aceitado a minha corrida.  Acabei tendo certeza da minha suposição ao flagrá-lo revirando os olhos pelo retrovisor.

Retribui o mesmo gesto. Não que meu humor fosse sempre um dos melhores, mas naquele dia em específico havia esgotado a minha cota de nova iorquinos mal-educados. A verdade era que viajar a trabalho era uma tarefa superestimada e romantizada por muitos. Conseguia tirar uma boa parte do meu amor pelo que eu fazia a cada momento que recebia um encaminhamento. Aeroportos não eram legais, lidar com voos atrasados ou cancelados tampouco. E ainda tem a parte da comida. Uma pequena mordida de qualquer coisa fazia meu estômago patético expelir a bile.

Comecei a batucar as unhas no banco e chequei meu relógio. Me desesperar não tornaria o carro mais rápido ou congelar o tempo, mas isso não me impediu de ser atingida pelo pânico de imaginar que não chegaria a tempo e, consequentemente, ficaria as próximas horas sentada à espera do próximo avião.

Quase trinta minutos depois o motorista ocupa uma das vagas temporárias em frente ao LAX. Até cheguei a engolir o meu orgulho e o agradeço – apesar dele não merecer mais que três estrelas –, mas me arrependo no mesmo seguinte. Ele revira os olhos mais uma vez e posso ainda jurar que ouvi algo relacionada com a palavra ''pendeja'' – o que eu presumi não ser nenhum elogio.

A rápida viagem não necessitou que eu levasse uma bagagem, então carregar somente uma bolsa tornou as coisas um pouco mais simples. Não poderia dizer o mesmo acerca dos scarpins. Entretanto, bastou ouvir pelo alto-falante a chamada do meu voo para eu começar a correr e torcer para meu tornozelo chegar intacto até o meu portão.

Com os documentos e passagem já em mãos, fantasiei com a minha casa. Desfrutando de um demorado banho na banheira antes de deitar em minha própria cama. Estava tão compenetrada em meus próprios pensamentos que acabei não percebendo um enorme sujeito que dobrou um dos corredores. Com a cabeça voltada para baixo, estava super entretido em seu celular e não prestava a mínima atenção ao seu redor.

Tentei frear o encontro provocando um ruído agudo contra o piso minuciosamente encerado, entretanto, o resultado não foi outro. Acabei colidindo com forca em suas costas e caímos com tudo no chão.

Uma chuva de documentos, contratos e algumas fotos de carros esportivos se espalharam ao nosso redor.

— Meu Deus, você é louco? — grasno, saindo rapidamente de cima dele para juntar tudo.

Ele solta um grunhido, não de dor, mas algo próximo da incredulidade antes de falar:

— Você me atropela e eu sou o culpado?

Você tinha que prestar atenção por onde anda!

Ele se agachou ao meu lado, ajeitando minuciosamente o boné em sua cabeça. Deixou sua bagagem de lado e me ajudou com todas as folhas.

— Eu olho para frente — se defende.

Eu olho para frente. — em um ato puramente automático, o imito forçando uma voz grossa. Isso o faz soltar um riso engasgado. Ao menos pude cogitar uma resposta, pois, mais uma vez escuto os alto-falantes anunciarem o último aviso do meu voo.

Eu sussurro um xingamento, os papéis formando uma bola amassada pelo meu desespero. Levantei-me com dificuldade e encaixei um dos meus sapatos que ficou preso somente pela tira em meu tornozelo. O homem também se levanta e estende o resto dos documentos em minha direção. Ainda sem olhá-lo nos olhos, eu pego e me viro em direção ao meu destino.

A atendente, que claramente assistiu toda a cena, me encarava boquiaberta.

— Está tudo bem, senhorita?

Suspiro. Era evidente que não estava nada bem.

— Só lidando com um ''muro'' idiota ambulante.

Ela limpa a garganta, alternando sua atenção de forma desconcertada entre meu passaporte e algum ponto em cima do meu ombro. Felizmente, momentos depois eu já ocupada a minha larga poltrona. Depois de todo o estresse, trabalho burocrático, clientes insuportáveis e a infortuna colisão com um imbecil, o que me restava em algumas horas seria uma grande taça de vinho, descanso e a serenidade do meu lar.

Sorri feito uma idiota pela sensação de que tudo estava voltando aos eixos. Quando o avião atingiu o céu, voltei a pegar a minha bolsa. A viagem de volta para casa não era tão longa, mas  como nunca conseguia dormir costumava matar o tempo com os serviços de streamings.

Alcancei primeiro os meus fones, em seguida, remexi por meus pertences em procura do meu celular. A cada revirada de mãos meu sorriso diminuía e minha garganta ficava seca. Meus dedos passavam a ser tornar mais rígidos e velozes. Onde está? Foi preciso que eu a virasse em cima do meu colo para que eu me desse conta. Um flash de imagens passou diante dos meus olhos: minha corrida até a atendente; a minha colisão com o estranho; meus pertences voando da bolsa; um celular no chão.

O homem pegou... aquela maldita parede pegou o meu celular.

 aquela maldita parede pegou o meu celular

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