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Era a segunda noite seguida que eu entrava naquele carro depois de dar de cara com a morte. Eu realmente tinha que tomar cuidado para que aquela cena não se tornasse frequente.

Assim que me sentei no banco de passageiro, tirei o paletó e taquei o chapéu para longe pela janela, enjoada com aquele cheiro horrível. Soltei o meu cabelo, percebendo que ele também estava com um cheiro não muito agradável. O homem chegou à mesma conclusão pela minha careta, soltando uma curta risada semelhante a que ele deu de manhã.

- Urgh, vou ficar a noite inteira tentando tirar isso. Droga.

- Fica tranquila, - ele respondeu enquanto dava partida. - Em uma lavagem isso sai.

Fiquei olhando para a janela. Nunca fui tímida, mas era embaraçoso estar no mesmo lugar que o homem que havia me beijado minutos atrás. Apesar de tudo isso, uma curiosidade martelava em minha mente e eu não era de economizar perguntas.

- Como você sabia que eles não iam nos assaltar ou coisa assim?

Ele tirou os olhos da estrada rapidamente para me encarar, e coincidiu com o momento em que eu fiz o mesmo. Rapidamente, voltei para o meu estado inicial, ainda constrangida. Se ele notou, não disse ou demonstrou nada.

- Por ser advogado, já fiz amizade com alguns policiais. Alguns amigos meus me falaram sobre os Hijos del Acero uma vez. Ao que parece, o modus operandi deles não envolve abordagens banais, como assaltos ou coisas parecidas. Eles já foram renomados, e coisas assim rebaixam o grupo a simples batedores de carteiras.

Me senti um pouco idiota por não ter pensado nisso antes. Claro que a gangue ainda mantinha o seu orgulho. Era uma das poucas coisas que restavam depois da queda em Bogotá.

Isso e as motos legais, claro.

- Por isso, eles decidiram manter o trabalho mais elevado dos grupos rebaixados: agiotas. O lucro é bom, as pessoas os buscam e eles conseguem manter o status de terror quando matam seus devedores, ou até torturam, em alguns dos casos. Por isso ainda são temidos e respeitados.

Fazia o total sentido, e foi uma jogada engenhosa até. Eu entendia bem da divisão: os primeiros trabalhavam diretamente para pessoas da elite ou do governo, matando-os ou sendo contratados por eles para matar; os segindos possuiam áreas de domínio próprio, na maior parte dos casos comandavam o comércio de armas e outros produtos ilegais na região; os terceiros eram os mais comuns, tendo ligações com os segundos às vezes, e seu trabalho envolvia roubos, assaltos, grupos de agiotas, coisas que eram vistas nos jornais com frequência. Haviam boatos de que alguns dos primeiros estavam fornecendo químicas produzidas por laboratórios próprios para os segundos, responsáveis pela distribuição, mas nada comprovado.

Nem sempre Cali era tranquila de se viver, mas obviamente não era a única cidade a ter esse sistema, mesmo que implicitamente. Colômbia não era o centro de toda a violência mundial.

- Acho que agora eu tenho direito a uma pergunta, não?

Não, não tem, pensei, mas acho que eu não precisava ser tão dura com o cara que já tinha me ajudado duas vezes.

- Vá em frente. Nada íntimo ou pessoal.

- Qual é o seu nome?

Virei meu rosto para ele, um pouco surpresa com uma pergunta tão simples até perceber que até aquele momento realmente não tínhamos sido apresentados.

- Nita - liberei meu nome artístico, mas ele não estava satisfeito.

- Isso é um apelido. Eu quero saber seu nome de verdade.

Dance with me - KaiOnde histórias criam vida. Descubra agora