Trinta & Três

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Entrar no carro de Theodoro no final das aulas tinha sido um impulso. Ultimamente eu era regida por muitos deles, o que não era bom. Mas o senhor Walter me pedira para auxiliar Antony com a questão das matérias que ele ia perder, e era melhor fazer isso de uma vez. O que séria fácil, se eu não o estivesse evitando.

Tinha se passado uma semana desde a briga. Ele tinha me ligado, me mandado mensagens, mas o deixei no escuro. Ver Antony batendo em Henri tinha sido demais para mim. Eu corri pelos corredores da Cesare perseguida por imagens de mãos ensanguentadas, gritos e pânico. Eu vomitei todo o café da manhã quando cheguei ao banheiro. Flora é quem tinha me encontrado, e levou uma hora completa para eu me acalmar o suficiente para deixar o chão do reservado e ir embora para casa.

Henri pegara suspensão de três dias por ter se envolvido em uma briga (apesar de não ter aparecido depois disso, por conta dos machucados), e Antony recebeu duas semanas de afastamento por ter começado a coisa toda, perder o controle e quase deixar Henri inconsciente. Ele ia perder toda a semana de revisões, mas isso era melhor do que ser expulso.

— Tem certeza que ele está em casa? — pergunto mais um vez, começando a vacilar na decisão.

— Claro que sim. Eu perguntei — Theo garante.

Meu estômago embrulha de nervoso.

Bom, pelo menos Theodoro não está enchendo minha paciência hoje. Ele se mantém quieto o caminho todo, até pararmos em frente a casa dos Ramone. Eu saio do carro antes que minha coragem se vá. Theo também não me dá nenhuma chance de escapatória, me lançando um tchau e indo embora sem hesitar.

Caminho até a porta da frente, com frio na barriga. Tento não pensar na ideia de que talvez ele não queira me ver depois de ter sido ignorado. Toco a companhia com um dedo trêmulo, então espero.

Perco uma batida do coração quando a porta abre, esperando encontrar Antony, mas me deparando com uma mini cópia dele. O garoto deve ter uns  treze ou quatorze anos, não mais que isso. Os cabelos são loiros, levemente mais claros que os de Antony, o formato do rosto também é igual. A única diferença visível é a cor dos olhos. Não é o tom verde ao qual me apeguei e sinto falta; os olhos do irmão dele são castanhos.

O garoto me encara com as sombrancelhas arqueadas. Deve estar me achando uma tapada, parada aqui, estática e muda. Limpo a garganta e me apresento.

— Er... Oi. Eu sou a Lia, o Antony está?

— Aaah — o garoto diz —, a namorada.

Minhas bochechas esquentam. Ele sabe sobre mim, e eu, vergonhosamente, nem sei seu nome. De fato, nunca me ocorrera peguntar.

O garoto me dá passagem e entro na casa. Não reparei em nada na última vez em que estive aqui. Primeiro porque quando Antony me trouxe estava tudo escuro, e depois, quando amanheceu, saí tão depressa que não me dei a oportunidade de olhar em volta. Era como qualquer casa desse bairro: grande e luxuosa, com móveis caros e decoração sutil.

— Ele está na cozinha — o garoto diz, apontando para a sua direita, em seguida se joga no sofá enorme, apanhando um controle de video game.

— Obrigada — eu lhe digo, mas sua atenção já está toda voltada para o jogo.

Caminho hesitante em direção a cozinha. Espero que minha vinda não seja um problema.

Paro na entrada quando vejo Antony. Ele está de frente para a ilha da cozinha, preparando um lanche. Há alguns potes, e um pacote de pão espelhados pelo tampo, enquanto ele trabalha concentrado nas fatias, retirando as bordas grossas.

Cada Vez MaisOnde histórias criam vida. Descubra agora