O Monte e o Cálice: Parte III - A visitante do Monte

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     Névoa, luz e dentes cerrados. O que viajava mais rápido na cidade era difícil dizer. Apenas uma mulher cujas pernas recebiam a alma da neblina e a cor da cortina branca incansável de Nianda poderia dizer que aquilo não se tratava de qualquer sorte de vento.

     Kings Aderio a viu por um relance, ela adentrava o mesmo prédio que ele saíra enquanto ele se adiantava pela praça, subia por barris, agarrava-se em suportes de toldos, varandas. Perto da Universidade os murmúrios deram passagem ao barulho de janelas batendo. Vários pescoços se esticavam nas janelas à pouca luz da lua. Com tão baixa visão pouco se podia concluir ou onde. A vista não deixava de ser turva nem mesmo no lado mais alto da cidade

     Felizmente era muito fácil descobrir de onde vinha todo o movimento. Bastou ao dracus apenas seguir a direção dos gritos mais distantes que vinham do passadiço que levava ao Monte, o que andando resultaria em algumas horas de viagem, pelo menos. Mas os dracus são certa sorte de vento e em questão de minutos e saltos pelos telhados Kings Aderio já se via de frente para a ponte separando Nianda ao Monte por uma distância de mil metros. O lago, um gigante estranho que vez ou outra brilhava da nuvem espessa, observava insone oitenta metros abaixo da parte mais alta do arco da ponte. Dali, Kings Aderio ponderou a energia que dividiria entre seus braços e pernas. Guardar o máximo dela se fazia imperativo pois concluíra que sua caça era a segunda dentro de uma hierarquia muito particular.

     Os vestígios que o suposto monstro deixara para trás já tinham sido discutidos com Mangura, rei de Mangrensis há não muito tempo e com Bereor, rei da Cidadela de Berílios há menos tempo ainda. Ao redor a floresta murmurava impaciente por algo. Kings Aderio sentia isso, ainda mais quando estrondos vieram do alto do Monte fazendo a ponte tremer e pessoas se desequilibrarem. Uma queda mortal aguardava-as pacientemente debaixo da neblina. Ligeiro, Aderio correu quase sem os pés tocarem o chão e girou ao redor delas, o que as fez rodopiarem, por algum vento estranho. Era rápido demais. O grupo nada ali viu até pararem do lado oposto à entrada do castelo.

     Do mesmo lugar de onde tinham sido lançados há pouco, uma silhueta se punha petrificada contra uma ponte de pedra a se agitar com os estrondos.

     Busquem abrigo, rosnou a silhueta lá ao centro da ponte. A voz embargada de mais superioridade.

     Kings Aderio continuou sua senda torcendo para que não houvesse ninguém sobre as ameias do arco central ou giraria uma segunda vez para lançar mais pessoas de uma altura um pouco mais elevada. Desta vez eu arremesso os abastados da cidadela. Se fosse o caso, com tanta agitação, não importa quão bom fosse o guarda, ele viria abaixo conhecer a rainha do lago, como diziam em Nianda. Do outro lado da ponte se erguia o local mais rico de toda a cidade. As casas não eram enfileiradas umas sobre as outras aqui. Cada propriedade tinha um espaço delimitado e alto, as chamadas Colinas do Monte, um bairro de alta forma. As casas tinham paredes lisas. Da luminosidade dos archotes ao chão, e das luminárias pendendo nos alpendres, se refletia uma cor parecida com pele rosada, quase branca. Havia jardins e árvores se erguendo em cada enorme quinta, em busca do luar, empertigando-se do mar de névoa. Ficavam distantes da piscina do átrio de entrada do castelo, mas já ali Kings Aderio pôde observar muita destruição.

     Vendo o movimento de um único alguém contrário ao fluxo, homens trajando armadura de metal trotaram em direção ao forasteiro. Kings Aderio ouviu um silvo do ar antes da primeira voz gritar para ele. Não tiveram muito tempo para levantar duas palavras já que uma pedra do tamanho de uma das casas ao redor desceu do céu desavisada. Eles ouviram um grito de guerra, como se muitas pessoas com voz furiosa gritassem à uma só voz. O grito que não era de nenhum deles acordou algo de onde vinha o forasteiro fazendo quem ouvisse temer pela própria vida: EBERLEN!

Kings Aderio e O Sopro que Dobra a MorteOnde histórias criam vida. Descubra agora