Cap. 1

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POV: Lucy (protagonista)

23 de agosto, 1986

Dois meses passaram rápido demais. Os lençóis fazem barulho ao tocar no colchão novo que ainda está embrulhado no plástico. Faz duas horas que deitei, mas a ansiedade não me deixa dormir. Enquanto espero meu corpo ceder a exaustão, tento forçar a minha vista a dar formas inusitadas para as silhuetas das caixas de mudança do outro lado do quarto. Minha mente devaneia pensando sobre o início das aulas daqui a duas semanas, sobre a decoração do meu quarto e sobre todas as outras mudanças na nossa rotina nesses dois últimos meses em Toronto.

Embora o choque de realidades entre o Brasil e o Canadá fosse grande, me sinto aliviada de poder deixar tudo para trás e poder começar de novo em um lugar diferente ( Seguro).

Nossa saída da capital não foi tranquila. Afinal, a burocracia para sair do país em meio a tantos conflitos é tanta que para não desistir você precisa ser ou louco, ou desesperado. Para nossa sorte, somos ambos.

A ideia da mudança não foi recente, muito menos de última hora, levou anos de planejamento e reuniões com O Ministério de Relações exteriores para que a transferência dos meus pais fosse devidamente aprovada. A decisão havia sido tomada em 1984, quando meus pais viram a possibilidade de me afastar de todos os conflitos e violências proporcionados pelo Regime civil ditatorial implantado no país ( que não tinha nada de "civil").

Meus pais são diplomatas, e por isso podem trabalhar em outro país sem atrapalhar nenhum processo no qual estiverem trabalhando, camuflando a mudança como uma simples transferência.

Os dois meses que passamos aqui no Canadá foram destinados a nossa organização e para cuidarmos de detalhes como documentação, certificado de falante da língua inglesa e etc. E esse processo demorado acabou me dando tempo o suficiente para praticar meu inglês com alguns nativos e me acostumar com a trágica mudança de clima.

Um dos muitos privilégios de ser filha de internacionalistas é ter sido alfabetizada em 4 línguas, tornando viagens e transferências menos complicadas. Poder sair do país em meio a um governo autoritário também é um privilégio, meus pais estimavam que eu tivesse uma adolescência normal, onde não precisasse me preocupar com a economia instável, censuras, opressões e medidas políticas incoerentes.

Por mais que tenha sido a escolha certa, deixar o Brasil foi umas das coisas mais difíceis que tivemos que fazer, e por mais que eu tenha nascido em 1971 (7 anos após o golpe de 64), eu amo minha pátria, e espero vê-la livre.

Quando saio do meu quarto bagunçado, noto os gritos dos meus pais tentando desempacotar nossas coisas na sala:

- Temos livros demais, Carla!

Mapeando Estrelas (Completa/ Revisando) Onde histórias criam vida. Descubra agora