Do Outro Lado Da Chuva | VONDY

CAPÍTULO 16

SAÍ APRESSADAMENTE DE cima do corpo de Dulce, antes de ver seus olhos se fecharem em frustração. Tentei me recompor do desejo que pesava no quarto, e acho que ela também o fazia.
Fechava os botões de minha camisa amassada com pressa, tentando desfazer os vincos que se formaram no tecido, mas sem muito resultado. Dulce também passava as mãos pelo vestido azul marinho de renda e por seus cabelos desgrenhados, e me paralisei por um momento. Acho que nunca me cansarei de olhar para ela, de admirá-la.
Percebi como estava meio trêmula, e como me fitava nervosamente.
Por fim, botei meu blazer e me sentei enquanto ela foi abrir a porta.
A voz que havia por trás dela, excedeu qualquer excitação anterior.

-Dulce. -O nome de Dulce soava estranho na voz da irmã. -Mamãe disse para descer, o jantar está servido.

. . .

Estávamos todos postos à mesa de jantar. Os pais de Dulce, Natália e seu noivo, Dulce e eu.
E vagamente me vieram as recordações de quando eu perambulava por esta casa, atrás de Dulce. Blanca e Fernando sempre representaram o carinho que pouco tive na infância, devido ao alcoolismo de meu pai e o excesso de trabalho de minha mãe. Quando entrei por aquela porta e o abraço sempre tão maternal de Blanca me envolveu, algo dentro de mim se aqueceu por saber que seu carinho não mudara comigo. Já com Fernando, eu queria poder dizer a mesma coisa. Fora algo constrangedor, pude ver o fiapo de culpa lhe corroendo pelo que havia acontecido no passado, eu queria dizer-lhe que já não importava, mas eu também não queria tocar no assunto hoje, em meio a um jantar. Já Natália não teve nada a mais a me oferecer que um "Olá, Christopher. Você parece bem." E não poderia me sentir mais grato por sua remota indiferença. Seu noivo, por sua vez, era o oposto de Natália, até engatamos numa pequena conversa antes de o jantar ser servido, e descobrimos que tínhamos muito em comum. Conscientemente me questionei do que Alfonso estaria fazendo com alguém como Natália. E depois me repreendi.

O jantar girou em volta de Natália falando dos mais pequenos detalhes de seu casamento com Alfonso, enquanto Blanca murmurava ideias de arranjos de flores. Fernando e Alfonso assentiam prestando atenção e parecendo envolvidos no assunto, ou fingindo, não sei bem ao certo. E Dulce, bem, ela não parava de comer, uma garfada atrás da outra, certamente para manter a boca ocupada com algo que não seja falar, pois ela nunca foi de comer tanto assim. E depois me lembrei de que isso podia ter mudado também.
Beberiquei o vinho em minha taça, ainda sentindo o gosto de Dulce na boca. Doce e amargo, em contraste com a bebida.

Estiquei meu braço por debaixo da mesa, e apertei a coxa de Dulce, para tranquilizá-la, como se dissesse "relaxe".

E ela apertou minha mão em resposta, a mesma ainda sobre sua coxa.

-Fiquei sabendo que você já foi editor-chefe em um renomado jornal do México, Christopher. -Blanca falou, e eu sorri.

-Sim, sim. Mas agora voltarei a trabalhar com meu pai, ele quer se aposentar. -Expliquei.

Dulce me lançou um sorriso.

-Certamente para dar mais atenção à sua jovem esposa. -Fernando murmurou. - Nunca vi Victor tão apaixonado.

Assenti, sem saber ao certo o que dizer.

Natália interrompeu.

-Ainda acho que Rosas vermelhas são tão comuns e simples, poderíamos optar por outras, mamãe. Algo diferente.

-Ora, se você...-Blanca não terminou.

-Depois falamos mais sobre seu casamento, Natália. Ainda temos tempo pra isso, por favor. -Pediu Fernando. - Desculpe, Blanca. Então, Christopher, você não pretende voltar a trabalhar no México mais?