CAPÍTULO 18

558 43 10
                                    


O café da manhã transcorrera normal, de uma forma peculiar. Eu não conseguia deixar de olhar para Alfonso e ouvir as palavras que certamente ecoavam em sua mente. você não a conhece de verdade. Queria poder ter o poder de sugar as palavras de volta, afinal de contas ele era só mais uma vítima de Natália, essa mesma que nem percebera o estado de seu futuro marido, distraída demais com os infinitos preparativos para o seu casamento que consumaria a relação dos dois. Mamãe também percebera o estado de Alfonso, mas se esforçava para escutar os balbucios da filha mais velha.

-Seu noivo está bem? - Cochichou ela para Natália, mas pude ouvi-la. Mas duvido que Alfonso estivesse nesse plano terrestre para sequer notar qualquer coisa.

Natália franziu a testa e olhou para o noivo, em seguida para mamãe.

-Ahn, sim? - Sua expressão era confusa- Ele deve estar ansioso pelo casamento. Todos estamos. -Concluiu e sorriu.

Mas não convenceu a ninguém.

Tomava meu café puro, esperando que Christopher respondesse minhas mensagens. Sem sucesso. Ele saíra com tanta pressa de manhã, o que fazia que não podia responder-me uma mensagem de texto? Larguei o celular sobre o balcão de mármore e tomei o último gole de café da xícara.  

-Christopher saiu com pressa hoje, até recusou o café. Diga a ela que fiquei chateada. -Disse mamãe. E desejei que não o tivesse feito.

-Está tudo bem com vocês dois? você tá com uma carinha...- Disse Natália, como se aproveitasse uma deixa.

-Está tudo ótimo. Ele só tinha um compromisso importante.-Falei.

-Não foi legal da parte dele ir embora assim depois de passar a noite aqui. -murmurou ela.

-Natália...-Mamãe a repreendeu.

-Desculpe, falei sem pensar.

Eu não sabia o que dizer. Parte de mim também concordava com ela.


***

Optei por me distrair de forma produtiva, despejando todos aqueles sentimentos bagunçados no papel e então tornando-os mais compreensíveis para mim mesma;  tornando-os poemas. Era fácil como minha mente e minha mão trabalhavam e tornavam legíveis sentimentos que até então não sabia identificar... amor, felicidade, alívio, medo, insegurança. No final, acabei por transformar tudo em uma coletânea de ambiguidade. 

Chequei o celular novamente: nada de Christopher.

Sem nenhuma atividade para fazer, me senti extremamente entediada e resolvi descer e respirar  um pouco de ar puro no jardim.  Levo um livro de contos a tiracolo, sento-me na espreguiçadeira mais afastada da casa e tento me concentrar na leitura. Em vão.

Sinto a proximidade de alguém e por instinto olho ao redor para me deparar com Alfonso, que aparentemente vinha em minha direção. 

Endireito a postura e finjo estar imersa em meu livro.

Quem sabe assim ele perceba e vá embora, pensei.

Mas quando sinto a ausência de luz em cima de mim por conta de sua proximidade, não tenho escolha senão levantar o olhar para ele. Sinto minha musculação começar a enrijecer. 

-Dulce? Posso falar com você? - Ele me fita com a expressão séria, como se houvesse algo o incomodando.

-Claro, Alfonso. - Respondo meio que a contragosto.

Ele continuou em pé e não fez menção de que iria se sentar, seu semblante o fazia parecer distante.

-ah, Dulce, pode me chamar de Poncho, por favor. -Ele fez uma careta que de longe poderia ser um sorriso, mas logo sua expressão de incômodo voltou. - Eu queria conversar...sobre o que você disse noite passada....

oh, por favor, não faça isso.

Sua fala saía hesitante, mas ele continuava.

-Confesso que não paro de pensar nisso. Talvez seja pelo nervosismo com o casamento tão próximo...mas ah, não quero que pense que não confio em Natália, eu confio e muito. Mas isso tudo é tão estranho, não vejo a relação de vocês duas como Natália tanto me contava, na verdade, é bem diferente.

Processo suas palavras enquanto formulava uma resposta em minha mente.

-Ah, eu tinha bebido um pouco demais. -Disse, desejando que ele fosse embora- Acontece que Natália e eu temos coisas pendentes, falei sem pensar, me desculpe. - Acrescentei por fim tentando soar convincente.

Ele não pareceu muito convencido.

-Creio que a distância também interferiu muito na nossa relação e, você sabe, os últimos acontecimentos.... - comecei a tagarelar sem parar. É uma mania que tenho que não consegui mudar.

Natália já carregava ódio demais de mim, eu  não poderia ser "culpada" pelo fim de seu noivado também.

No fim, Alfonso fora embora como chegara: desnorteado e sem respostas. 

Era nítido que ele notara meu nervosismo, sabe que há algo mais. Mas era estranho, contudo, que uma só fala minha o fizesse estar tão inseguro, acho que ele já havia percebido o comportamento da futura esposa. Pelo visto Alfonso era bem mais esperto do que eu pensava, mas Natália ainda continuava sendo uma sublime atriz.

Esperava de verdade que ele não saísse tão machucado quando percebesse a verdadeira face de Natália.


Do Outro Lado Da Chuva | VONDYOnde histórias criam vida. Descubra agora