Capítulo 9

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Laura

Eu acordei cedo e determinada a pedir desculpas, eu estou me adaptando do jeito que posso, e o mais rápido que eu consigo. Quer dizer, até estou aceitando os abraços, tentando entender a maneira dele de fazer as coisas e de pensar, quer dizer, não é normal as pessoas me presentearem e muito menos esperarem que eu aceite isso de uma maneira fácil, eu achei que quando eu o disse que eu trabalhava, ele havia entendido que ninguém me daria nada e que eu costumava conquistar as minhas coisas. Parece orgulho, mas simplesmente é medo, gostaria de não precisar me explicar, mas ao mesmo tempo sinto que devo... Ele está se tornando importante e faz pouquíssimo tempo que nos conhecemos, mesmo assim eu percebi que ele ficou triste depois da conversa de ontem, eu não imaginei que ele fosse tão sensível assim, nem sabia o que dizer quando eu percebi o que estava acontecendo e que o havia magoado.

Levantei da cama e tomei um banho rápido, vesti um short jeans e uma camiseta lisa vermelha de manga ¾ grudadinha ao corpo, um tênis branco que eu não havia guardado por falta de tempo, prendi meus cabelos em um rabo de cavalo e peguei minhas economias. Tinha o plano de fazer um café da manhã reforçado e bonito em forma de desculpas, até porque eu não tenho como comprar nada, então... Quem não tem lobo caça com cão, ou algo assim. Gostaria de poder retribuí-lo não que ele precise, mas por carinho mesmo...

Carinho? Será?

Deixei um bilhete em baixo da porta do quarto dele "Eu saí e levei a chave porque fiquei com medo de alguém entrar, mas já volto." Acho que assim ele não se assusta, se é que ele notaria a minha falta, eu notei a dele. Devo estar ficando louca...

Não penso muito nesta possibilidade e deixo o apartamento com medo de errar o número da senha do elevador que também abria o portão, não havia saído ainda e nem conhecia os arredores, mas tomei cuidado e peguei meu celular caso algo aconteça eu ao menos sei ligar. Acenei para o porteiro que não me conhecia, mas também me acenou de voltar e comecei a andar pelos arredores do condomínio.

Tudo era bonito, até o muro que separava um condomínio do outro. As pessoas costumavam andar com seus animais logo cedo e vários atletas corriam enquanto escutavam músicas tão altas que eu conseguia capitar a onda sonora ainda com alguns metros de distância. O sol estava fraquinho ainda, mas esquentava a minha pele assim como o olhar de Manoel o fazia, não importa o quanto eu tente é sempre ele quem volta para os meus pensamentos. Andando entre ruas e calçadas, eu poderia facilmente encontrar lojas de alfaiataria que logo me lembrariam Manoel em seu terno de linho preto bem engomado, ou restaurantes que me lembrariam sua felicidade ao comer qualquer coisa, ou até mesmo uma livraria que me lembraria a biblioteca dele, que me lembraria dele... Eu não quero estar apaixonada, mas ao mesmo tempo sinto que quero. Ele é como um refugio, que me negaram durante anos, mas que valeu a pena esperar.

Demorei um pouco para encontrar alguma panificadora, e por conta do local tudo ali era um pouco mais caro do que o normal, gastei tudo aquilo que eu tinha, que já não era muito, mas acredito que Manoel vá gostar, eu espero que ele aceite as minhas desculpas. Eu comprei alguns croissants, pães de queijo e sonho, eu adorava sonho e assim que eu os vi eu não aguentei, acabo comprando dois cannolis e brioche. Saio dali cheia de sacolas, mas tudo bem, o pior mesmo foi tentar encontrar o caminho de volta... Pronto Manoel, eu realmente espero que você goste de tudo no final.

Manoel

O despertador não havia apitado ainda, até porque era domingo e eu costumava dormir até acordar, mas não naquele dia. Alguém estava arrastando as cortinas da minha janela e deixando a luz do dia entrar em meu quarto comigo ainda de olhos fechados, eu sentia algumas lambidas insistentes em meu rosto e conforme eu fui despertando um cheiro maravilhoso de café quentinho e pães frescos adentrou em minhas narinas, eu me sentia sonolento e pesado, mas logo já estava abrindo os meus olhos e tentando focar no que estava acontecendo em minha frente.

- Manoel – A voz era tão doce que me fez sorrir enquanto eu encarava o teto, meus olhos ardiam um pouco por conta do choro da noite anterior, mas eu me sentei na cama para encarar a ruiva dona de todos os meus pensamentos e sentimentos. Laura estava vestindo um short que deixava as suas pálidas pernas expostas, uma blusa vermelha que contrastava com os seus cabelos e como sempre descalça, ela talvez goste de sentir o frio do chão, não sabemos, mas eu lhe dei um par de chinelos. – Eu fiz café. – Ela levanta um pouco a travessa que carregava e sorri de ladinho, ela fica linda de qualquer jeito. Que absurdo. Meu coração faz festa ao vê-la, muito mais festa do que deveria fazer...

- Bom dia, é para mim? – Ela assente com a cabeça e vem até a cama, Bored pula para o seu colo assim que ela deixa a bandeja apoiada na cama e se senta cruzando as pernas me encarando. Não estávamos tão perto, mas também não estávamos longe, ela estava cheirando a creme de algodão e parecia ansiosa.

- Eu que fiz – Ela aponta para o Brioche com Mel – E também fiz o café – Eu o bebo e está como o de ontem, amargo e forte, parece que ela me conhece a anos – Eu gostaria de te pedir desculpas. – Eu a encaro com um pouco de surpresa – Eu não tinha nada para te oferecer então fui até a padaria e comprei comida, porque todo mundo gosta de comida. – Ela gastou o dinheiro dela com isso? – Porque ontem eu vi que você ficou chateado, e te olhando agora eu consigo ver que eu posso realmente ter te decepcionado. Então, me perdoa? Eu ainda estou aprendendo a dividir a minha vida, ou no caso aceitar os novos termos dela e não sabia que poderia te deixar mal – Ela parecia envergonhada. – Eu não queria que você pensasse que eu sou mal-agradecida ou que eu não ligo para os seus sentimentos. – Ela me olha com expectativa.

E eu ainda me sinto muito surpreso, ela gastou o pouco dinheiro que ela tinha, só para me pedir desculpas. Eu coloco a bandeja um pouco afastada de mim na cama e puxo seu braço para lhe abraçar, ela vem de bom grado, e eu fico feliz. A respiração dela batendo em meu peito e o seu cheiro se misturando com o aroma do café é tudo o que eu gostaria de ter todos os dias.

- Tudo bem Ferrugem, a gente pode aprender junto. – Ela sorri e me encara. Deixo um beijo em seu nariz e olho em seus olhos – Só não quero que pense que esse não é o seu lugar ou que essas não são as suas coisas, porque agora são. – Ela assente com a cabeça – E também... Não precisava ter ido comprar tudo isso. O que você tinha de dinheiro era para você.

- Ah... Então você pode gastar dinheiro comigo, mas eu não posso gastar com você? – Era a primeira vez que ela fazia algum tipo de piada ou descontração.

- Não foi bem isso que eu quis dizer – Ela sorri e deixa um beijo em minha bochecha.

- É de coração.

- Nossa, então é muito precioso. – Ela fica vermelha e sorri sem mostrar os dentes. – Você vai comer comigo? – Eu olho para a quantidade de pães e doces que haviam em cima de um refratário e a encaro.

- Não... Na verdade, eu posso pegar os sonhos? – Eu a encaro assentindo e então ela pega dois dos sonhos pequenos que estavam ali.

- Que horas são?

- Acho que um pouco antes das 10 – Eu começo a comer o brioche com mel e tento calcular o horário que ela acordou. Eu gosto de saber que ela se importou com os meus sentimentos e comigo, é muito bom saber, me sinto parte dela, assim como ela é parte de mim.

Passamos o dia conversando, descobri que ela teria prova nos próximos dias e que precisava estudar e foi isso que ela fez durante a tarde, eu sempre por perto para ajudar com o computador e perceber a sede que ela tinha de conseguir aprender. Eu a admirava sem pestanejar, ela simplesmente merece todas as palmas do mundo, mesmo enfrentando as dificuldades da vida nunca desistiu, mesmo querendo, mesmo não aguentando. Eu e Vincent costumávamos pensar que éramos fortes, mas eu me sinto um grão de areia perto de Laura, ela é um Aquiles sem calcanhar... Ou no caso, o meu calcanhar de Aquiles.

Algo dentro de mim já estava enraizado, meu coração parecia dividido, metade dela e a outra metade de Bored. Me sentia cada vez mais completo, as vezes transbordava por receber um sorriso dela, ou um olhar, Vincent teria vergonha de mim, eu me tornei uma mariquinha.

Ainda assim, gostava do pouco que eu estava conseguindo conquistar, ela estava se tornando uma parcela muito significativa em minha vida, logico que eu não ligaria de estar virando uma mariquinha. Por ela, eu me tornaria qualquer coisa...

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É... Quem quer um Manoel? Porque eu quero alguém tão boiolinha por mim como ele é por ela...

Entre Cordas & MelodiaOnde histórias criam vida. Descubra agora