Capítulo 2

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Ela sentiu quando foi colocada na cama com delicadeza. Podia ter se arrastado até ali e não seria difícil depois de todas as vezes que havia feito, mas Sokka insistira que não deixaria a chefe de polícia de Cidade República rastejando como uma inválida e que não adiantava ela espernear.

Ainda estava irritada, não por ter tido os pés queimados por um dominador de lava qualquer, mas por ter sido carregada como uma criança birrenta pela rua, isso sim parecia mais degradante para a chefe de polícia do que engatinhar pelo chão de volta até a hospedaria em que estavam.

— Eu posso? — ele perguntou, o peso fazendo o colchão afundar junto aos pés dela.

— Claro, talvez você possa usar o seu bumerangue para curar as queimaduras — ela disse irônica, balançando as mãos. Talvez estivesse mais irritada do que imaginava, mas quem poderia culpá-la? Estava exausta e quase completamente cega e, muito provavelmente, estaria trancada ali até que Katara pudesse viajar. O que teria que esperar até o nascer do sol por causa das crianças.

Ela afastou os pés para perto de si, abraçando os joelhos e sentindo o incômodo do tecido grosseiro sob as solas e então resolveu apoiar apenas os calcanhares. Foi quando sentiu duas mãos pegarem seus tornozelos e puxá-los com calma.

— Sokka! o que você tá fazendo? — perguntou, lutando para se desvencilhar, mas sem qualquer sucesso. Poderia ter dobrado a terra para isso, mas nem ao menos pensou sobre o assunto.

— Katara deu um pouco de água curativa do norte para emergências — ele explicou enquanto ela sentia o líquido escorrer pelos dedos e pela planta do pé — Não é muito, mas eu espero que dê ao menos para aliviar.

Havia algo de diferente em sua voz. A raiva parecia ter atenuado bastante desde a noite anterior ou ele a estava mantendo controlada, agora ele já parecia muito mais o cara com um plano que ela havia conhecido por mais da metade da vida e muito menos com o viúvo inconsolado. Isso era bom.

Os dedos grandes passaram pelas feridas com pouca força, espalhando a água para ter certeza de que seria o suficiente. E então o incômodo das queimaduras passou para um calor confortável que se enrolava em suas pernas e se alojava no baixo ventre. Faziam ao menos 5 anos que não sentia aquilo. Na verdade, fazia muito mais, quase 31 anos que ninguém tocava em seus pés. Ela não havia deixado ninguém tocar seus pés desde o dia que saiu da casa dos pais.

— Então...— ela sabia que vinha uma pergunta, era algo social para tentar quebrar o desconforto de uma massagem nos pés — Você ainda sente falta dele?

Pergunta errada. Pergunta errada.

As duas palavras ecoaram entre os dois como um grande alerta para mudar de assunto. Sokka não precisava dizer o nome em sua mente para que soubesse de quem estavam falando, até tentou abrir a boca para se corrigir, mas de forma inocente ela lhe cortou.

— Não, eu acho que nunca senti de verdade — ela respondeu se apoiando nos cotovelos, os olhos direto para o teto — Claro que eu fiquei irritada quando ele foi embora e triste, mas foi mais pela Lin do que por mim, não era como se eu quisesse passar o resto da vida com ele.

Engraçado como ninguém nunca havia lhe feito aquela pergunta e ela nunca pensara nisso até agora.

— Nós teríamos caçado ele para você — ele disse, uma sugestão de risada enchendo o quarto, esperando pela resposta dela.

— Obrigada pela consideração, Capitão Bumerangue — ela respondeu, movendo o pé com delicadeza, sentindo os dedos deslizarem pelo calcanhar esquerdo, ele não estava queimado, mas não fazia diferença já que a água já havia até mesmo secado — Mas eu poderia fazer isso sozinha se quisesse.

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