Capítulo vinte e quatro
Bela andou em passos rápidos, tentando esconder sua ansiedade, até o quarto em que seu pai se instalara, no hospital. Ao chegar, para na porta e observa o homem que a criou com soro nas veias, dormindo, finalmente tranquilo. Ela não conseguia se perdoar de que tinha se distraído com a mansão e não tinha nem pensado em seu pai, em como ele estaria, e no fato de que ele não sabia que ela estava feliz ali. Ela não ter pedido para o ver mais cedo. Talvez, se tivesse feito isso antes, poderia ter evitado toda essa confusão. Evitado a doença do pai, Gaspar atacando e destruindo a casa que aprendera a amar, e Adam estar lutando por sua vida em uma mesa de cirurgia.
Entrou no quarto e se sentou ao lado do leito do pai. As outras macas estavam vazias, era um dia com poucos acidentes na pequena cidade. A garota segurou as mãos do velho e deitou sua cabeça em seu leito, derramando lágrimas por tudo que tinha causado. Todas as vidas que tinha destruído. Simplesmente por agir de forma impulsiva.
— Você sabe que não é sua culpa, não é, filha? — seu pai havia acordado e piscava os olhos, atordoado, tentando entender a situação.
— Não sei.
— Gaspar... — ele começou, e pensou bem no que iria falar adiante — podemos dizer que herdou muito mais de seu pai do que o queixo quadrado. Há uma razão pra ele ter sido expulso do exército.
— Acho que o matei — a menina confessou ao pai, com lágrimas caindo de seus olhos.
— Você não seria capaz de fazer isso.
— Mas fiz — respondeu, agora com a voz forte, como se soubesse seu erro, mas já havia o aceitado. Fez isso para o bem de sua família, estava protegendo aqueles que amava.
— Espere para saber, não sofra por antecedência. Quando saí de lá, logo depois de você, muitas pessoas estavam vindo para cá também. Ele pode ser uma delas.
— Talvez...
— Você vai me largar, não vai? — o velho perguntou, encarando sua filha.
— Pai! Você sabe que nunca faria isso! — Bela responde, assustada, se afastando em um movimento brusco que faz seu pescoço doer ainda mais.
— Eu vi você, na cidade. Rindo, feliz. Muito mais feliz do que na nossa casinha — ele diz, mas não parece triste.
— Não diga isso, papai — ela responde, arrependida, se lembrando de quando estava na cidade e achou que tinha o ouvido a chamar. Se tivesse o visto, e conversado com ele ali mesmo, tudo poderia ter sido diferente.
— Tudo bem, filha, eu acho bom. Quero que você seja feliz, não que fique comigo — ele diz, apertando a mão da filha.
— Não posso ter os dois? — pergunta, novamente com lágrimas no rosto.
— Claro, mas quando tiver uma família...
— Papai! Eu só tenho 18 anos, não vou me casar e criar uma família agora! — ela se exalta, levantando a voz — e mesmo quando criar, você será avô, não um estranho. Você é minha família.
— Só, por favor, não pare seus sonhos novamente por minha causa — ele diz, encarando sua filha que tinha as mãos de Gaspar estampadas em seu rosto e pescoço, como que em um colar púrpura.
— Todos os meus sonhos tem você no meio.
— Não quero que você tenha que escolher.
—E não vou, ok? Agora descanse, você não deveria estar ficando agitado dessa forma.
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Era uma vez de novo
RomansaNessa releitura do conto clássico "A Bela e a Fera" que se passa em uma pequena cidade de colonização francesa no interior de Minas Gerais, Ana troca sua vida pela do pai devido a uma dívida, indo trabalhar em uma mansão no meio da Mata Atlântica, l...