29- Mudança de hábito

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Alguns dias se passaram desde que Philipe abdicou do trono. Ele assinará um termo desistindo de tudo da família real e passando para Rafael a coroa. Vi seu semblante ao assinar o papel. A tristeza em seus olhos era tão notante quanto os peixes ao nadar em águas cristalinas. O mais incrível e inconsequente era vê-lo fazer aquilo por amor. Por amor a mim.

Agora não tinha mais volta. Teríamos que morar junto os plebeus. Viver sem luxo, sem riqueza, sem empregados para tudo. Não sei como Philipe irá conviver com vida simples. Rafael ainda tentou nos dá um título de nobreza, para que continuassemos vivendo as custas do palácio, mas o concelho não aprovou, pois a partir do momento em que ele assinou o termo, ele também desistiu de títulos futuros que o fizesse nobre novamente; a única que poderia ser nomeada era eu, mas eu teria que ter feito algo para merecer o título, e isso eu nunca fiz.

Mesmo assim, Rafael conseguiu nos dá uma casa próxima ao castelo e algumas moedas de prata e ouro, o suficiente para nós manter até Philipe e eu conseguirmos trabalhar em algo. Nós mudamos após uma semana. Mas antes nos casamos na capela do palácio. Uma cerimônia simples. Apenas eu, Philipe, Rafael, Aranel e o padre. Apesar de não ter sido como imaginávamos, acredito que tenha sido melhor. Nunca fiquei tão feliz quanto naquele dia.

Rafael prometeu que iria continuar as investigações para encontrar Laura. Antes de nós mudarmos, ele havia recebido uma carta do rei de Alcans lhe parabenizando pelo cargo e que queria o encontrar formalmente em sinal de paz. Um avanço estranhamente bom demais. Mas eu realmente espero que seja paz mesmo. Contudo, Rafael disse que irá contar a ele que realmente Laura havia sido sequestrada, mas não me envolveria, apenas dirá que as investigações de Philipe concluíram isso. Achei até melhor ele não envolver meu nome, não imagino como o rei reagiria ao saber que existe outra pessoa idêntica a filha dele e que ela também se casou com Philipe.

Fazem dois dias que nós mudamos. A casa é grande e bastante aconchegante. Trouxemos móveis do palácio, então não precisamos comprar nada além do necessário. Philipe já está procurando emprego, mas está difícil, pois ele não tem experiência em nada. Ele diz estar muito feliz aqui, mas percebo que ele sente falta do castelo e não sei até quando essa felicidade durará.

Agora o observo tentar contar lenha para o fogão e lareira, todo desengonçado. Rio comigo mesma olhado a cena. Ele está sem camisa, com o peitoral suado a amostra, seu cachos dourados grudados em sua testa, segurando o machado firmemente e dando golpes no ar. Vou até ele na tentativa de ajudá-lo.

— Sabe ao menos segurar uma espada? — falo sorrindo.

— É claro que sei. Sempre fui um grande guerreiro e, aí...— ele põe o machado no chão — isso é pesado demais.

— Deixa eu te ajudar. Pegue-o novamente — ele pega o machado e o coloca sobre os ombros — Agora empunhe como de fosse uma espada — o agarro por trás para lhe manusear — isso. Agora olhe para o tronco, pense que ele é um grande inimigo e você está prestes a matá-lo — Seguro suas mãos, de forma que meu corpo fica todo grudado em suas costas. — Agora é só dá o golpe.

Com força, Philipe acerta em cheio o tronco, o partindo no meio. Quero nem saber quem foi que ele imaginou no lugar do tronco.

— Ahaha, eu consegui. Obrigado, minha rainha. — ele se vira e me beija.

Sinto sua pela quente na minha e ofego rapidamente. Beijar Philipe sempre me deixa assim. Ele passa as mãos nos meus cabelos e se encaixando perfeitamente em minha nuca. Posso sentir seu desejo falando alto e meu corpo responde com arrepios. Ele para de me beijar e me olha atentamente. Afasto um pouco do seu cabelo grudado na testa como forma de carinho.

— Eu te amo tanto, não há nada que eu não faça para ficar contigo, sabia? — ele diz.

— Nem imagino. Você só largou sua família, seu reinado, seus castelo, tudo isso pra ficar comigo, uma réliz plebeia.

— Fiz tudo isso, e faria de novo e de novo e de novo, só para poder estar assim com você agora.

— Eu tenho tanto pra te agradecer, Philipe. Você foi a melhor coisa que me aconteceu. Não vejo nenhum homem no mundo fazendo tudo o que você fez por mim. Eu te amo, do fundo da minha alma, ah como eu te amo.

Por algum motivo totalmente inesperado, começamos a dançar. Ali mesmo, sem música nem nada. Só nos dois rodopiando na grama do quintal da nossa casa. Dando passos lentos enquanto eu me acomodava em seu peito. Ventos fortes fazem com que eu me encolha e ele me envolva em seus braços me protegendo do frio gelado do anoitecer. Por um momento, só por um momento, eu desejei que ficassemos assim para sempre. Sem brigas, sem preocupações, sem mortes. Só nos dois, com o nosso amor nos unido como um só.

Talvez eu tenha demorado um pouco pra entender. Fiz bastante burradas, coisas que até hoje me pergunto como fui capaz. Mas hoje sei o que sinto, sei o que Philipe sente e sinto também que seremos felizes. Só eu e ele. Na nossa casa. Na nossa pequena família.

KalliceOnde histórias criam vida. Descubra agora