V. Me analisando, doutora?

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POV Rafa Kalimann

Ouvir que minha filha tava somatizando as brigas que eu tinha com meu marido me deixou abalada, uma dor se formou em meu peito, aquilo era tudo que eu menos queria: ver minha filha sofrendo por causa dos meus problemas.

- Ela vai ficar boa? - perguntei olhando pra Gizelly.

- Sua filha não tá doente, ela só tá triste e guardando os sentimentos pra si. Ela precisa aprender a expressar o que sente, assim ela vai parar de descontar nos coleguinhas - ela respondeu.

- E quanto tempo isso leva? - perguntei.

- Ela vai ter que levar o tempo dela - ela disse e eu olhei para meus próprios pés - mas sua filha é incrível e muito forte, só dá tempo pra ela. Traz ela de novo pra uma nova sessão e vamos ver se ela se abre mais verbalmente. O que você acha?

- Tudo bem, se isso for ajudá-la, eu a trago - estava extremamente tensa.

- Ei, não adianta se culpar, essa tensão só vai fazer mal pra você também e você não vai poder cuidar da sua filha se não tiver bem, não é mesmo? - falou.

- Me analisando, doutora? - falei com um sorriso fraco no rosto.

- Não preciso fazer análise pra saber como você tá se sentindo, seu olhar te entregou! - a vi ficar sem jeito e desconfortável - E a sua entrevista de emprego? - mudou de assunto.

- Como? - eu disse surpresa.

- Sua entrevista de emprego, como foi? - repetiu.

- Você se lembrou? - falei ainda mais surpresa.

- Minha memória é boa - ela disse dando um sorrisinho lindo de canto de boca - então, como foi?

Senti vontade de chorar, mas sabia que não podia expressar isso, como uma desconhecida lembrou da minha entrevista de emprego e meu próprio marido nem sequer me desejou boa sorte nela? A que ponto eu cheguei nesse casamento. Concentra Rafa, você tem que respondê-la.

- Foi boa - me contive em dizer.

- Que bom, espero que consiga o emprego - ela deu um sorriso para mim e aquilo me encantou, não pude evitar, desci meu olhar até sua boca e a vi parando de rir instantaneamente, quis pedir desculpa, mas preferi ficar calada - bom, não vou mais te alugar. Novamente, me desculpa por passar da hora.

- Te devemos algo por isso? - perguntei.

- Claro que não! - ela falou como se fosse óbvio - Você pode marcar os horários das próximas consultas com Fernanda depois.

- Tudo bem, irei fazer isso depois - disse - tchau doutora.

Ela se levantou e me acompanhou até a porta, quando peguei minha filha pra ir, Mel falou:

- Vamos nos ver novamente?

- Vamos sim - Gizelly respondeu.

- Eba! E vamos jogar de novo? - Mel falou.

- Você quem vai dizer o que vamos fazer. - Gizelly falou e minha filha se animou.

Hoje, diferente da última vez que estivemos aqui, Mel estava mais falante e ainda no elevador, começou a conversar comigo.

- Mãe, eu gostei muito da Gizelly - disse sorrindo.

- Que bom filha - retribuí o sorriso.

- Ela não fica me perguntando porquê eu bati no meu colega ou porque eu fiz tudo aquilo antes - falou pensativa.

- E isso é bom? Não perguntar? - disse.

- É sim, eu não me sinto forçada a falar sobre algo que não quero. Tipo o que a senhora fez esses últimos dias pra saber o que meu colega falou pra mim - abaixou o olhar e eu entendi o que Gizelly havia dito de dar tempo ao tempo.

Não sei parar de te olharOnde histórias criam vida. Descubra agora