21🥩Um fim?

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 17 anos depois 

Encaro a pilha de papéis à minha frente, impaciente.  Quando fui convidada a integrar o time da minha antiga escola como conselheira, não imaginei que teria tanto trabalho. Mas a cada dia que passa, os problemas dos alunos tornam-se meus também e me vejo no dever de ajudá-los da melhor maneira possível, isso inclui aconselhá-los além da parte acadêmica. E, com toda a experiência que adquiri como psicóloga, sinto que ajudar estes jovens é a minha missão de vida. Principalmente quando se trata de jovens que não tem o mínimo apoio da família, o que ocorre com frequência. 

Você deve estar se perguntando o que aconteceu comigo tantos anos após todo o pesadelo que vivi e bem, foram muitas coisas. E eu sei que está curioso para saber de tudo. Bem, posso começar dizendo que eu consegui realizar o sonho de me casar com o garoto que eu amo e que isso foi até rápido demais. Nos casamos assim que terminamos o ensino médio e apesar de ter sido uma decisão maluca, foi a melhor que tomei em toda minha vida. Eliza, nossa pequena menina de seis anos é o fruto dessa loucura. 

Moramos todos próximos aos nossos pais, o que resulta em uma casa cheia todo final de semana, Eliza particularmente adora. Daniel trabalha em uma empresa de marketing, como sempre sonhou e também é empresário, cuidando do marketing de outras empresas nas horas vagas.

Você deve se perguntar o que me levou a acabar sendo conselheira em uma escola de alunos do ensino médio, não é mesmo? Então, posso dizer que nunca fiz planos quanto a nenhuma profissão ou algo o qual gostaria de ser no futuro e foram as circunstâncias que me trouxeram até aqui.

Após algum tempo tentando assimilar tudo o que aconteceu e investigar mais à fundo sobre a vida de Jones, eu resolvi estudar psicologia com o objetivo de ajudar pessoas as quais passaram por algo parecido comigo. Mas não só isso. Eu queria entender aquelas pessoas que tiveram a infeliz sorte de nascer em uma família doentia e tóxica, assim como Jhon Jones. Se posso salvar o destino de alguma delas? Eu não sei. Mas pelo menos posso tentar.

A vontade de ajudar os alunos da minha antiga escola veio em seguida, quando surgiu a vaga e eu vi a oportunidade de acompanhar a rotina dos jovens um pouco mais de perto. E, quando consegui que o primeiro aluno desabafasse em minha frente sobre tudo o que sofria em casa, eu soube que aqui é o meu lugar. 

Costumo acreditar piamente nos alunos mais irrecuperáveis. Sei que disseminar a violência é inadmissível e não há desculpa nenhuma que mude isso. Mas será que não seria mais eficiente mudar esse quadro começando pelo agressor e não pela vítima? E se pudéssemos ajudar esses alunos a entenderem o que sentem e que realmente precisam de ajuda? E se mostrarmos a eles que não precisam ser o que as pessoas dizem ou o que uma família abusiva é? E se nós mostramos que eles podem ter escolhas e mostrarmos como essas escolhas podem afetá-los? Talvez a situação possa ser revertida, como talvez, não seja. Mas não saberemos se não tentarmos. Uma coisa, em vários anos de experiência eu pude constatar: noventa por cento dos problemas que os alunos têm, envolvem a família de alguma forma. 

E bem, eu como mãe sei que não é fácil criar um filho e também sei que muitos pais se esforçam para criar e educar seus filhos da melhor maneira, como também existem outros que, por algum motivo ou por pura maldade, não se dão à esse trabalho. 

Talvez, se Jones tivesse a chance de ter apoio emocional de alguém com experiência, ele pudesse ter um rumo diferente. Poderia? Nunca saberemos. O que sei é que é o meu dever ajudar cada aluno problemático que existe nessa escola.

Me arrependo de pensar isso no momento que vejo dois alunos brigando da janela de vidro da sala onde me encontro, eles estão no pátio e tem um amontoado de estudantes como platéia, como se fosse algo divertido.

 Respiro fundo, tentando manter minha postura de adulta e caminho à passos firmes até onde estão, quando chego ao pátio, me deparo com Matthew, o garoto mais encrenqueiro e complicado —, com quem eu venho tendo que lidar —, apanhando de um jovem de porte físico magro e estatura mediana, mas que batia para valer. Tratava-se de Erick, um aluno novo do segundo ano. Prendo meus lábios para não rir, Matthew meio que merecia aquilo, mas claro que não era o certo a se fazer. 

— Parem com isso agora! — Digo, e vejo que o garoto sai de cima de Matthew, que tem um dos olhos roxos e está com um sangramento no nariz. 
— Ele mereceu isso, senhora Mosmann. Isso é para aprender a não mexer com quem está quieto —  fala Erick, com os cabelos totalmente molhados e desgrenhados.
— Acompanhem-me até minha sala, por favor. 

Sigo com os dois jovem que se sentam assim que chegamos a mesma. Matthew mantém os olhos sobre os quadros e troféus expostos da escola, enquanto Erick mantém os olhos sobre mim, desde o momento em que chegou. 
— Podem falar o que estava acontecendo no pátio? Vocês já sabem que nesta instituição nós repudiamos qualquer tipo de violência. E todos sabemos que não é dessa forma que resolvemos as coisas. Nem na escola e nem fora dela. — Digo e vejo quando Matthew revira os olhos, como se achasse tudo isso um saco. É, eu já fui adolescente e sei exatamente o que ele está pensando. 
— O Matthew teve o que mereceu, senhora Mosmann. Você já sabe que ele não se cansa de fazer brincadeiras sem graça e ninguém aguenta mais isso. 
— Nada a ver, pivete! Eu só disse a verdade, ué. Você é um nerd que tá se achando demais só porque entrou para o time de basquete.
— Cala sua boca! 
— Matthew, quero que vá para a sala da diretoria agora. Ele irá dizer quantas semanas de suspensão você terá, mas já aviso que dessa vez, o diretor não será mais tão tolerante com você. 

O garoto se levanta e sai, emburrado, em direção a sala da diretoria, em frente a minha. 
— Vejo que se esforça muito para ajudar pessoas como o Matthew, porque faz isso senhora Mosmann? Acho que não deveria perder seu tempo. — Diz Erick, seus olhos fitam os meus, como se estivesse me analisando.
— Não desisto tão fácil dos alunos e é meu dever fazer o possível por todos eles igualmente. 
— Admiro a dedicação que você tem com essa escola. Sabe, eu sei que você é um tipo de conselheira pedagógica, mas também sei que é formada em psicologia e talvez possa me ajudar com alguma opinião ou conselho, sei lá. 

Vi em seus olhos que ele queria falar alguma coisa, por isso, dei a liberdade para que desabafasse.

— Claro. Farei o que está ao meu alcance. Precisa de algum tipo de ajuda? 
— Na verdade, eu queria te fazer uma pergunta porque sabe, eu não tenho com quem conversar sobre coisas desse tipo...
— Pode perguntar. — Digo, minha curiosidade é aguçada pelo suspense do garoto, que demora alguns minutos até responder.
— Você já teve sonhos esquisitos ou sei lá, alguma coisa como visões de memórias que não são suas? 

Paro por um momento e me lembro da época em que as lembranças de minha vida passada eram constantes e perturbavam minha mente à todo instante. Por sorte, não tenho os mesmos pesadelos de antes, apenas lembranças não tão frequentes como antes. 

— Bom, isso é comum. Pode estar relacionado a algo que você viu ou assistiu, não se preocupe. Algo nisso te incomoda?

O garoto permanece sério por alguns segundos, o olhar vago e distante. 
— Erick, está tudo bem?
— As lembranças que eu tenho me atormentam todos os dias. Elas são terríveis e macabras — diz, o olhar fixo no nada, impaciente.
— Como o que, por exemplo? 

Ele se abaixa e aproxima seu rosto da mesa, como se estivesse contando um segredo.
— Como lembranças de um jovem arrancando um coração ainda batendo e dilacerando ele… — diz, então olha para mim, que mantenho meus olhos fixos nos seus. — dilacerando entre os dentes. Esse é um dos sonhos que tenho frequentemente.

Minha boca fica seca de repente e eu não consigo pronunciar nenhuma palavra. Lembranças de um passado o qual queria esquecer voltam à tona como uma avalanche sobre mim. Para a minha terrível surpresa, me parece que John Jones está mais vivo do que nunca. 


FIM

Não tenha medo, Ellie (COMPLETO) Onde histórias criam vida. Descubra agora