A caligrafia perfeita preenchia mais uma página, que antes estava em branco, registrando segredos e confissões de uma mente que trabalhava em ritmo alucinado, na tentativa de absorver tudo que estava acontecendo, dentro e fora de si. As batidas na porta, a assustaram, estava concentrada.
- Entre. – Disse guardando o grosso caderno em uma das gavetas da mesa, a trancando logo em seguida, guardando a chave em um pote que ficava sobre a mesma.
Quitéria adentrou pela biblioteca, com semblante entristecido.
- O patrão pediu pra avisa quando acabasse. Leninha já se deitou. – A negra falava parada de pé, a porta.
- Obrigado, Quitéria, pode ir se deitar. – Karla já estava caminhando para fora da biblioteca, fechando a porta atrás de si. – Boa noite. – Disse tomando as mãos da negra, deixando um beijo em cada dorso. Quitéria sorriu enrugando os cantinhos dos olhos deixando um afago no rosto de Karla.
- Boa noite, criança.
Música on: "Um amor puro" (Iza, Maria Gadú).
Indecisa, Karla ficou um tempo parada a porta do quarto de Helena, até que respirou fundo e bateu de leve.
- Helena, estas acordada? – Chamou num tom de voz baixo e receoso.
- Pode entrar.
A voz de Helena soou cansada e sonolenta, e foi exatamente o que Karla vislumbrou ao adentrar pelo quarto da morena, que encontrava-se confortavelmente deitada em seu leito, envolta numa colcha macia.
- Desculpe a incomodar em tão tarde hora, só queria saber se sente-se melhor. – Karla piscava os olhos tensa, enquanto mordia o lábio inferior e apertava os dedos.
Aquela mania de Karla, em morder o lábio inferior quando estava nervosa, causava reações desconhecidas em Helena, que apenas suspirou resignada estendendo a mão direita, num convite para que a loirinha se aproximasse. O que prontamente fez, e num movimento involuntário, capturou a mão estendida sentando na cama, ao lado da morena que piscava os olhos lentamente.
- O que tinha naquele chá que pediu a Quitéria.
Karla abriu um sorriso levado fazendo Helena negar com a cabeça.
- Algo que vais ajudar a dormir melhor. – Se limitou a responder.
- Alexandre...
- Precisas descansar, Helena. Foram dias agitados, e percebi que não tens dormido tão bem, quanto dizes. – Os olhos azuis encararam os verdes, por detrás das lentes dos óculos, numa visível repreensão.
- Lena.
- O que dissestes?
- Pode me chamar de... Lena. – A voz da morena saiu num sussurro, ao passo que seus olhos lutavam para se manterem abertos, o que não permitiu que visse o sorriso que dominou os lábios da loirinha, ao lembrar que só os amigos a chamavam assim.
- Muito bem... Lena, hora de dormir.
– Podes dormir aqui, se quiseres... – Karla ia se levantando quando foi pega desprevenida pelas mãos de Helena subindo por seu braço enquanto falava, e sentiu o coração lhe pulsar na garganta.
"Céus! O que faço agora?"
O pensamento a fez travar, e a carícia sutil em seu braço, estava causando reações indesejadas em lugares inapropriados.
Umedeceu os lábios cedendo.
Os olhos verdes travavam uma luta ferrenha para se manterem abertos, ela queria ver, mas o sono estava impiedoso. Viu "Alexandre" demorar, mas ceder a seu pedido com um aceno de cabeça e se colocar de pé desabotoando o colete, para o tirar logo em seguida e deixar dobrado sobre o encosto da cadeira, bem como as botas, que empurrou para debaixo da cama com as meias dentro enquanto retirava os óculos, o deixando sobre a mesinha de cabeceira.
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Lies | Supercorp
Fiksi PenggemarBrasil, 1886. Em meio ao progresso ferroviário, a pressão inglesa e aos movimentos abolicionistas, duas famílias firmam um acordo vantajoso para ambas. Helena (Lena) e Alexandre (Alex) iriam se casar. Envolto a trocas de cartas, tramas e complos, u...