The day after.

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-Rafaella, cê tem noção do que isso pode me causar?

-Não foi culpa minha. -Sentei na cadeira com os pés para cima, cruzando os braços e evitando olhar para ela. -Ele quem sumiu.

-E você não foi atrás dele!

-Não. -Dei de ombros. -No meu contrato não tem escrito que eu tenho que ser trouxa cadelinha e ir atrás dos caras.

-Então deveríamos colocar. -Flavina me olhou e eu sabia que ela estava brava com a situação, mas eu sabia que iria passar, ela nunca ficava brava comigo por muito tempo.

-Eu na verdade não sei se quero continuar saindo com ele, mesmo com o contrato. -Falei baixinho e Flavina me encarou sentando no sofá, os olhos me encaravam esgotados e ali eu sabia que iria ouvir um sermão, tentei levantar, mas ela me puxou de volta.

-Cê sabe que isso é culpa sua, não sabe?

-Eu sei disso.

-Você procurou, você vivia bêbada, Rafaella, você ia perder todo o seu dinheiro, se eu não tivesse feito tudo isso!

-Mas eu não quero mais ter um "relacionamento". -Fiz aspas com a mão. -Não com uma pessoa que não ame e sejamos sinceras, eu nem conheço ele.

-Rafaella. -Flavina apertou o meio dos olhos. -Eu não me importo se você o ama, se você o conhece... Eu me importo com você não fazendo merda, eu me importo com você tendo alguém ao seu lado nem que seja para enganar que você está namorando...

Senti ali uma pontada de esperança. -Qualquer pessoa? -Perguntei.

-Desde que não seja casado. -Ela riu.

-Se eu arrumar alguém, que eu goste e seja uma pessoa podemos largar o... Como é mesmo o nome dele?

-Daniel Caon, Rafaella.

-Podemos largar o Daniel?

-Pode. -Flavina levantou arrumando a saia do vestido. -Agora trate de dormir, que eu preciso trabalhar.

Ela foi para o seu escritório, enquanto eu fui para a cama. Não estava com sono, minha mente voava para todos os cantos, eu ainda sentia o gosto dos lábios de Gizelly nos meus, ainda escutava sua risada alta e em meu peito ela ainda permanecia tão recente que seu perfume me imundava, em tão pouco tempo. Rodei a cama inteira antes de pegar o celular e ver a mensagem de Manu, que dizia estar no caminho, chegaria a qualquer momento agora e eu precisava pensar. Converso com ela ou deixo apenas as palavras corroerem minha garganta e guardo tudo para mim? Minha cabeça parecia que iria explodir, olhei para o meu calendário eletrônico em cima da mesa e marcava apenas o segundo dia do ano. O segundo dia do ano e eu já estava assim, com uma dor de cabeça horrível demais por coisas que achei ter deixado no passado.

Achei que todo esse assunto de eu gostar de mulheres seria algo que eu sentiria, mas guardaria para mim como a vontade de fazer uma tatuagem no rosto, inviável de existir no mundo real. Cocei a cabeça e fui para a cozinha, iria preparar um chá, qualquer coisa desde que eu faça alguma coisa, talvez até fizesse um bolo. Sim faria um bolo. Peguei todos os ingredientes e comecei a bater a massa do bolo, minha mente não estava em lugar algum para ser encontrada e meus olhos caiam mortos estáticos em minhas mãos, mas eu não conseguia ver o que fazia, estava tudo no automático.

-Rafaella? -Ouvi uma voz e acordei do transe. -Ah não Rafa, você está fazendo bolo, o que houve?

Manu me conhecia muito bem. -Só quis fazer uma surpresa pro cê.

-Não Rafa, eu sei que não é isso, vem vamos pro quarto.

Manu me pegou pela cintura, guiando-me até o meu próprio quarto de paredes brancas e plantas verdes, tantas plantas que parecia que uma floresta havia ganhado bebê aqui dentro. Manu era uma coisinha pequenina, o que não era difícil perto de mim, mas ainda assim ela era tão pequena, batia praticamente em minha cintura, com suas sardas no rosto e o cabelo curtinho tingido agora de loiro, se tivesse asas e orelhas pontudas seria facilmente confundida com uma fada sensata. Hoje ela estava simples, com uma saia vermelha e uma blusa branca, sem maquiagem ou acessórios, mas normalmente ela é sempre espalhafatosa com suas roupas e eu amava.

New Year's Day. (Girafa)Onde histórias criam vida. Descubra agora