Corda bamba

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Raquel

— Por favor Raquel, me escuta! — eu ouvia Alícia quase me suplicando com os cotovelos apoiados na bancada da cozinha americana do meu apartamento enquanto ao outro lado eu abria uma garrafa de tequila e ouvia pela enésima vez a ruiva me pedindo para que eu desistisse daquela missão suicida. Enquanto ignorava minha amiga falando à minha frente e ia buscar as taças no armário, olhei o celular que estava vibrando no meu bolso. Ángel havia me mandado mais uma mensagem.

"Pensa direito Raquel...por favor..."

Todos contra mim... Ótimo... Não importa o que me dissessem, eu não queria e nem podia mudar de ideia. Essa seria a minha última missão.

— Raquel não é porque você tá desgostosa da vida que você tem que se atirar num plano suicida desses porra! Os irmãos são a máfia mais foda da Espanha e todo mundo sabe disso! Amiga, me escuta por favor! — suplicava Alícia.

— Alícia, não há nada que me faça mudar de ideia! Eu aceitei e eu vou até o fim! É a única forma do Prieto me deixar vazar! — a respondia calmamente enquanto colocava a bebida nos copinhos e ouvia uma amiga bufar levando as mãos ao rosto.

— E como você pretende fazer isso? Me fala? Porque se eu conheço o Ángel ele Nem está procurando por nada, não está travando nenhum plano, só tentando te fazer desistir da ideia! — me indagou Alícia ignorando a dose de tequila, limão e sal que empurrei em sua direção.

— Eu sei disso! Mas pra começar, hoje nós vamos bancar as atrizes... O que acha? — a respondi levantando a dose de tequila, a deixando com dúvida estampada no rosto.

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— Na boa Raquel, eu tenho um dos trabalhos mais perigosos do mundo mas eu tenho certeza que eu vou deixar esse plano numa dessas loucuras que a gente se mete! Puta merda cara! — Minha amiga dizia enquanto balançava a cabeça negativamente e eu dirigia a caminho da boate onde Ángel, em uma das poucas informações que me dera sobre o caso, disse que o homem ao qual eu deveria me envolver gerenciava às sextas feiras. Já passavam das quatro da manhã.

— Amiga, só segue o fluxo! E Finge estar bêbada igual um gambá, o resto deixa comigo, Nena! — A respondi já virando bem devagar no beco pouco iluminado daquela rua, onde já era possível ouvir um pouco do barulho abafado da música da boate.

— Isso não vai ser muito difícil já que eu bebi metade da tequila sozinha pra ver se tomava coragem pra me meter nas tuas loucuras! — Respondeu Alícia enquanto passava o olho rapidamente por todo o local, falando como se não fosse ela quem sempre me levava a fazer loucuras e agregar boas histórias à minha vida infeliz.

— Shhh, chegamos! Anda! — Disse em um tom mais baixo já desligando o carro.

Abrimos a porta do carro e eu logo pude perceber que Alícia estava verdadeiramente tonta e quase se desequilibra tentando fechar a porta do carro. Tentei segurar a risada mas não consegui, a ruiva me mostrou o dedo do meio e se pôs a caminhar o mais correto que conseguia ao meu lado enquanto eu ainda tentava controlar minha risada. Estávamos atuando, mas parecíamos definitivamente que voltávamos de uma noite de bebedeira buscando um after em outro lugar. Caminhamos entre risadas e olhadas até a entrada da boate, onde percebia o olhar de tédio e raiva de um segurança alto e forte desde que havia estacionado no local. O homem branco e barbudo caminhou devagar e tedioso desde a porta principal, onde havia um cupido em lâmpada néon, até o início da cobertura de toldo vermelho, bem ao início do tapete vinho que tinha no chão. O lugar era a combinação perfeita de "somos apenas um clube de whisky e sinuca para homens classe média e alta" com "puteiro bem aqui".

Chegamos bem na entrada do toldo de cobertura e do tapete vinho quase que na mesma hora que o segurança. O homem mastigava o canudo de um pirulito, estava todo trajado de terno e gravata e não parecia gostar muito de sorrir. Ao contrário de mim e de Alícia, que sorríamos com todos os dentes à mostra entrando no papel de bêbadas tentando não nos intimidar pela brutalidade do homem. Quando o segurança ia abrindo a boca para nos dizer qualquer coisa que fosse para cairmos fora logo dalí, a porta principal se abriu e todas as atenções foram voltadas para ela. Um homem que usava um sobretudo preto até quase os joelhos, uma calça jeans justa escura e camisa social também preta abriu a porta com uma força e uma cara nada amigável. Uma das enormes mãos abria a porta com veemência enquanto na outra segurava um copo de whisky com gelo. O cabelo escuro e grande brilhoso um pouco grudado por seu rosto pelo suor. Os óculos escuros e quadrados, juntamente com seu rosto cheio e lábios carnudos cobertos por uma barba grossa, lhe davam um charme raro e exótico. Era um homem atraente. Senti minha cabeça nublar e perdi a consciência do que estava fazendo por alguns instantes quando seus olhos pousaram sobre os meus em um misto de raiva e surpresa. O homem me olhou de cima a baixo e seus olhos demoraram um pouco na subida entre meu quadril, meu busto e quando pousou em meu rosto pareceu demorar uma eternidade em meus olhos. Não sei quanto tempo tardaríamos apenas em nos olharmos, mas aquele contato foi interrompido pela porta que se fechara atrás dele e o tirou de meus olhos em um susto, como se ele tivesse voltado novamente a realidade.

My fatal paradiseOnde histórias criam vida. Descubra agora