Não era possível. Ela não estava em lugar nenhum. Eu, o Luiz e o Marcos olhamos tudo. E o apartamento nem tem muitos cômodos.
Como a Raquel pode ter sumido assim? Ela sabia que não era para sair do apartamento. Aonde ela estava?
Gritamos seu nome até pelos corredores do prédio, e nada. Eu suava frio de nervoso.
- O que foi que aconteceu? Aonde essa garota se enfiou? - Eu gritei, aflito.
O Cam latia cada vez mais com os meus gritos, mas não pude evitar.
- Calma, Flávio, nós vamos achá-la. - O Luiz tentou me acalmar. - Talvez só tenha descido para tomar um ar.
- Mas ela sabia que nem isso podia fazer!
Não dava para entender. A Raquel sabia do perigo de sair de casa na atual situação. Ela própria queria evitar ir para a rua. E naquela mesma tarde, já teríamos que sair para ir até a polícia.
- Flavião, ela acabou de sair de uma prisão e já teve que se prender de novo... Foi errado, mas eu até entendo. E sabendo dos riscos, não deve ter ido muito longe.
- A questão não é essa, Marcos! - Eu disse mais nervoso a cada palavra. - Se soubéssemos onde ela está, tudo bem! Mas você a viu quando entramos no prédio? Na rua, na garagem, em qualquer lugar? Ou a vê por aqui? Não! Isso não está tranquilo, é preocupante e eu já estou a ponto de ir parar no hospital. E nem isso eu posso fazer, porque tenho que achá-la.
Só eu sei como foi a sensação de entrar no apartamento e vê-lo vazio. O sofá-cama desarrumado, o Cam sozinho e agitado indo de um lado para o outro... E nada da Raquel.
O Cam não parava de latir, e a minha paciência acabou chegando ao limite.
- Fica quieto um pouco, caramba! - Eu gritei para ele, que se encolheu mordendo alguma coisa que achou no chão. - E tira isso da boca! - Eu peguei o que quer que ele estivesse mordendo e joguei para um canto, sem nem ver o que era.
Os meninos estavam parados feito dois bobos com cara de paisagem sem saber o que falar. E eu, que estava me irritando com qualquer coisa, falei:
- Vocês vão ficar parados aí com essa cara? A gente já sabe que ela não está aqui! Vamos procurá-la lá em baixo!
Saí sem olhar para trás, e os dois me seguiram. O Cam também resolveu vir junto...
Andamos por vários corredores do prédio gritando pelo nome dela. Não encontrando nada, descemos para o térreo e percorremos tudo. A garagem, os espaços ao ar livre, até o mini playground que tinha no prédio. Nem sinal da Raquel...
Eu não quis perder tempo. Deixamos o Cam por lá, pegamos as bicicletas, e saímos pedalando pelo bairro. Até paramos algumas pessoas e perguntamos se alguém a havia visto. Demos todas as características, mas ninguém deu uma resposta positiva.
Umas duas horas após rodarmos o bairro que nem três malucos, voltamos ao nosso prédio, decididos a ligar para a polícia.
Antes de subir, cumprimentamos o porteiro, e aí me veio um estalo. Se ela saiu de lá, com certeza passou por ele, não tinha outro jeito.
- Boa tarde, Seu Geraldo. Deixa eu te perguntar... Você se lembra daquela menina que eu trouxe aqui há dois dias? Uma loirinha, não muito alta...
- Ah, sim, me lembro! - Respondeu com certeza. - Muito bonita a sua namorada, por sinal.
Não tinha tempo para corrigi-lo e explicar que ainda não éramos namorados.
- Pois é, o senhor viu se ela saiu hoje daqui? Ela está há dois dias lá em casa, não saiu desde então. Agora voltamos da faculdade e não a encontramos mais.
- Não. Ela não saiu daqui, eu me lembraria, não saí da portaria desde a hora que eu cheguei.
Eu ia desmaiar. Meu coração não sabia mais se batia, ou se saía pela minha boca. Como essa menina não saiu do prédio? Só tem uma porta de entrada e saída.
- A única pessoa que entrou e saiu hoje do seu apartamento, foi a sua madrinha.
O que? Aquele homem me confundiu com outro morador, com certeza. Primeiro, diz que a Raquel não saiu de lá. Depois me fala de madrinha?
- Quem? Seu Geraldo, você sabe quem eu sou, né? O Flávio, do apartamento trinta e dois.
- Claro que sei, meu filho. - Ele disse convicto. - É isso, sim. A sua madrinha esteve aqui. Você mesmo deixou avisado em um bilhete que ela viria enquanto estivesse fora, e que era para deixá-la subir. Veio buscar um tapete que você deixou para ela, não foi isso?
Os meninos me olharam tão assustados quanto eu. Não entendíamos o que aquilo significava. Ou talvez entendíamos e preferíamos não acreditar no pior...
- Seu Geraldo, você tem esse bilhete ainda?
- Sim, está aqui. - Ele tirou o bilhete de uma gaveta, me entregando.
Minha madrinha virá aqui nesta manhã para buscar um tapete que me emprestou. Não estarei em casa, então, quando ela chegar, pode mandá-la subir. Deixei a porta destrancada.
Ass: Flávio
Mostrei o bilhete aos meninos, nervoso, quase rasgando-o de raiva. Estávamos todos chocados, não conseguíamos emitir um som sequer.
- Quem entregou este bilhete ao senhor? - Perguntei.
- Ninguém. Quando eu cheguei hoje cedo, já estava aqui. Deve ter sido entregue ao porteiro do turno da noite... Eu, na verdade, nem tinha visto esse bilhete. Ela que comentou quando chegou, e procurando, eu encontrei.
Com certeza tinha sido a psicopata. Só podia ser. Arquitetou tudo direitinho. Deve ter dado um jeito de deixar esse bilhete falso na portaria de madrugada. Mulher diabólica!
- Ela descobriu aonde a gente mora! - Me virei aflito para os meninos que não sabiam como reagir.
- O senhor se lembra como era essa minha "madrinha"?
- Sim, era uma mulher magra, tinha um cabelo preto, liso, na altura do ombro, e um óculos vermelho.
Ok, a Heloíza não era assim. Será que mudou o visual nesse tempo foragida para dar outro golpe?
- E você disse que ela veio buscar um tapete?
- É, era isso que estava escrito. E foi o que ela disse também. Deve ter pego mesmo, eu a vi indo embora carregando um saco preto enorme de quase dois metros.
Estava explicado. Tapete coisa nenhuma. Era a Raquel dentro daquele saco. Aquela monstra conseguiu enganar todo mundo e sequestrou a Raquel!
O Cam continuou latindo desde que voltamos. Eu ignorei porque não estava com tempo para isso, mas olhando para ele, vi que ainda tinha aquele negócio na boca. Mas que cachorro teimoso!
- Caramba, Cam, eu já falei para largar isso! Você foi lá e pegou de novo? - Tirei o objeto da boca dele sem esforço.
Dessa vez, resolvi olhar para saber o que era. E me senti uma anta por não ter olhado antes... Um pedaço de uma tornozeleira arrebentada. Aproximei o pingente do rosto, e vi o nome da marca escrito. Marccoli. A mesma loja que eu fui com a Raquel em São Paulo. Que era a mesma loja que ela disse que a mãe dela frequentava antigamente...
- Marcos! Sobe, e pega a caixonavermelha que está no quarto, não tira nada de dentro! - Ordenei apressado. -Luiz, guarde as bicicletas! Eu vou ligar para a polícia. Nós temos muito o quefazer hoje. E não podemos mais bobear.
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Um Novo Conto de Rapunzel
RomansaRaquel tem um sonho: ir ao show da sua banda favorita que se apresentará pela primeira vez no Brasil, bem no dia do seu aniversário. Porém, realizá-lo não é tão fácil quando se tem uma mãe rigorosa que nunca lhe deu liberdade, proibindo-a de sair de...