Maria Luiza
— Tá olhando com essa cara de boba por que? — Fernanda disse me tirando de um devaneio intenso.
— É raiva.
— Me poupe Maria Luiza, eu não te conheço?
— Do que você tá falando Fernanda? Me erra.
— Você praticamente comeu a menina com o olho.
— Não comi ninguém não. — Senti minhas orelhas esquentarem. — Tá, eu dei uma olhadinha, mas só.
— Eu sei, você não é boa em esconder essas coisas, você lembra da Eva? Fui eu que descobri que você estava apaixonada por ela, antes mesmo de você.
Senti meu estômago embrulhar ao ouvir aquele nome de novo, já fazia tanto tempo que eu pensava as vezes que tinha sido um surto coletivo.
— Eu disse que olhei pra ela e você tá falando de sentimentos.
— Você deveria falar com ela. — Fernanda me ignorou completamente. — Eu sei que vocês brigaram mas ela é legalzinha até, não que eu seja a favor de um romance mas seria legal você ter outra amiga além de mim. E também se quiser casar com ela quem sou eu pra julgar, não é mesmo?
Dei risada, sempre me surpreendia com a sinceridade da minha amiga, mesmo conhecendo ela tão bem. Mas eu não queria um romance com a Amanda, não depois da palhaçada que ela tinha feito e do pedido de desculpas fracassado. Na realidade, se alguém me perguntasse o que eu queria da Amanda, a única resposta possível para mim seria "distância". Uma distância boa onde ela não pudesse me enxergar mas que eu pudesse sentir que ela estava por perto, sei lá, talvez porque eu fosse fã de auto sabotagem.
Nós já estávamos cansadas de procurar alguma coisa para assistir na TV, sem falar que eu tinha que acordar cedo no dia seguinte pra ir pro trabalho, o que só de pensar me deixava ainda mais cansada. Decidimos então ir para a cama, mas antes que eu conseguisse encontrar meus sapatos, vi uma sombra se aproximando pelo corredor, uma sombra de alguém muito mais alta do que qualquer moradora daquela casa.
— Posso falar com você?
Amanda me disse em um tom baixo, logo após colocar os pés na sala. Ela estava com o cabelo bagunçado, os olhos vermelhos, com uma olheira marcadinha embaixo de cada um deles. Dei uma olhada de leve para Fernanda, para pedir permissão, e ela me retribuiu com um sorrisinho.
— Eu vou pro meu quarto dormir, qualquer coisa me chama, tá bom?
— Okay amiga, eu já vou.
Fernanda acenou com a cabeça para mim e lançou um olhar maligno para Amanda, que retrocedeu dois passos, se foi por medo ou por educação, eu não saberia dizer.
Amanda foi caminhando lentamente até a frente da casa, eu a seguia em silêncio, tentando controlar o nervosismo que me pegou de repente. Depois de alguns segundos ela parou de uma vez e encostou suas costas em uma das paredes da garagem, olhando fixamente para mim, o que foi de longe o contato mais íntimo que nós tivemos desde que nos conhecemos. Eu apertava as minhas mãos e olhava para baixo, Amanda parecia muito decidida a fazer seja lá o que ela tinha vindo fazer ali, então me esforcei para parecer o mais segura possível e não dar pra ela o gostinho de me subestimar.
— Desculpe o mau jeito. — Ela começou arrumando o cabelo. — Eu estava dormindo.
— Eu percebi. Algum motivo especial pra você ter me chamado aqui... Vamos ver... Duas da manhã?
— Então Maria Luiza — Amanda fixou o olhar em mim e eu senti uma pontadinha de vontade de retribuir, mas eu não era tão segura assim. — Eu não queria te incomodar, eu não tinha a intenção, mas eu te vi ali e não consegui prestar atenção em mais nada.