Londres, 2018.
Haviam várias maneiras de começar bem o dia: um banho quente, uma bela xícara de chá e por último, mas não menos importante, escutar um trecho do álbum do Black Sabbath.
Mas comigo foi diferente.
Acordei em um quarto estranho, minha cabeça me dava a impressão de que a qualquer momento poderia escorregar do pescoço e explodir ali mesmo, havia uma garota nua deitada ao meu lado e eu, bem... eu exalava álcool pelos poros.
Com dificuldade procuro minhas roupas que estavam espalhadas pelo cômodo e dou graças a Deus quando encontro minha carteira e chaves. Saio dali tentando encontrar a porta de entrada, a casa pelo visto era maior do que eu esperava, as paredes tinham um tom de amarelo claro e haviam alguns quadros pendurados.
Suspiro fundo e massageio as têmporas antes de voltar à caça da porta perdida, quando ouço um rosnado baixo.
Congelo.
Eu era tão azarado a ponto de ser destroçado por uma fera sanguinária logo pela manhã?Os passos foram ficando mais próximos e aquele barulho aumentava gradativamente, foi assim que criei coragem para olhar por cima do ombro esquerdo. No alto da escada estava um ser pequeno e magricela, estranhamente parecia que tremia mais do que o normal para um cachorro, os dentinhos a mostra rangiam enquanto rosnava e por um momento eu quis rir de mim mesmo por ter tido medo de algo tão... mínimo?
Mas antes que eu pudesse pensar em mais alguma coisa, o cachorro corre em minha direção me obrigando a correr também. Talvez teria sido melhor se ele tivesse conseguido agarrar minhas calças ao invés do que de fato ocorreu, não me dei conta quando atropelamos a pobre mesinha de centro, ou quando o vaso de porcelana saiu voando. Foi uma perseguição digna dos filmes, e o cachorro latiu até que eu encontrasse a porta, assim como num passe de mágica ele parou quando coloquei os pés pra fora da residência. De uma coisa eu tinha certeza, ali eu não voltava mais.
"Ótimo!", pensei rolando os olhos enquanto apertava mais o casaco contra meu corpo. O dia estava frio e cinzento então me apressei até o carro e dei a partida, os pneus cantaram pela rua silenciosa quando acelerei.
Mesmo com a cabeça doendo liguei o som e Immigrant Song se faz ouvir. Bato os dedos no volante no ritmo da música e cantarolo baixinho, enquanto faço uma curva. As avenidas estranhamente tinham pouco movimento àquela hora então não achei mal furar o sinal que se aproximava, afinal, eu só queria chegar em casa e dormir, que mal faria?
Como se o universo respondesse minha pergunta me sinto ser jogado pro lado com um impacto que me pegou de surpresa, do outro lado da rua um carro também estava parado.
"Puta merda!", resmungo e coloco a mão sobre a testa, os meus dedos voltam sujos com um pouco de sangue. Mesmo ligeiramente zonzo abro a porta e saio do carro para ver o estrago, sinto vontade de chorar imediatamente porque o para-choque da Linda estava pendurado só por um lado, além de um farol quebrado.
Inspira, expira, inspira, expira.
- Com licença, você tá bem? - Escuto uma voz desconhecida e procuro ao redor para saber de onde vinha.
Um rapaz bem mais alto do que eu se encontrava parado há uns metros de distância, possuía um grande cabelo cacheado e tinha uma expressão preocupada no rosto, estava acompanhado por um outro rapaz, que talvez fosse a pessoa mais excêntrica que eu já tenha visto.
- Eu pareço bem? Olha o que aconteceu com o meu carro! - Falo com a voz um pouco esganiçada, o rosto adquirindo um leve tom avermelhado.
A expressão do mais alto passou de preocupada para indignada em menos de três segundos, o que seria engraçado se a situação não fosse trágica.
- Como é? Mas foi você que furou o sinal, não tem direito algum de reclamar aqui! - Ele fala enquanto cruza os braços na altura do peito e me fuzila com o olhar.
Respiro fundo pela milésima vez ao que parece e passo a mão por entre os meus fios de cabelo rebeldes, minha cabeça lateja forte.
"Brian, ele tá sangrando, não seria melhor levá-lo ao hospital para dar um jeito naquilo? Sinceramente, estou ficando enjoado." Escuto o outro rapaz dizer ao mais alto que só suspira e se aproxima um pouco mais de mim.
- Olha, vem com a gente, você precisa dar uma checada nesse seu corte, tá bem feio. - Fala enquanto examina meu rosto, um filete de sangue escorre pela lateral. - O Freddie está ligando pra um amigo nosso vir rebocar o seu carro, ele não vai conseguir andar assim.
O encaro meio desconfiado, mas por fim decidi aceitar. Quando o reboque chegou, passei todas as informações necessárias e saímos em direção ao hospital mais próximo. O carro do tal Brian tinha amassado na porta do motorista, mas nada tão sério quanto a Linda que estava em estado de vida ou morte.
No banco de trás eu podia observar melhor aquelas duas figuras tão diferentes que podiam ser sequestradores me levando agora mesmo para algum tipo de casa no meio do nada.
O mais alto usava uma camisa branca de botões, o casaco amarrado na cintura, jeans e tênis, enquanto o outro rapaz que possuía dentes um pouco avantajados, o cabelo um pouco comprido, usava calça de couro e um casaco de pêlos. Exótico.Talvez eu tenha parado de observá-los apenas quando Brian me pegou no flagra pelo espelho retrovisor, afundei um pouco no banco tentando disfarçar e fiz a minha melhor cara de tédio. O caminho não demorou tanto e logo eu já estava sendo atendido por uma enfermeira.
Levei dois pontos e quando estava me dirigindo até a saída, vi Brian e Freddie aguardando pacientemente. Caminhei até lá e cocei a nuca.
- Eu... me desculpem, certo? A culpa foi minha, eu não devia ter furado o sinal, só queria chegar em casa mais cedo. - Olho para o mais alto que parece satisfeito com meu pedido de desculpas. - E eu vou arcar com o prejuízo do seu carro.
- Não precisa, o Deaky vai cuidar bem disso. Você quer carona? Afinal, o seu carro... 'cê sabe.
Antes mesmo que eu pudesse responder me vejo sendo arrastado pelos dois, falo meu endereço meio contrariado mas de qualquer maneira era melhor aceitar a carona do que ficar mofando no ponto de ônibus.
Quando o carro parou na frente da minha casa o relógio já marcava 11:27, meu estômago roncava e eu me sentia cansado.
- Então, obrigada pela carona, eu... nem merecia que vocês fizessem is-
- Ora darling, cale a boca, você fala demais! - Freddie disse enquanto gesticulava com as mãos. - Basta prometer que não vai ser tão imprudente no trânsito e tá tudo certo.
Encolho os ombros e dou um sorriso sem graça. - Se for assim, tudo bem então. - Ele me retribui com uma piscadela.
Abro a porta e em seguida saio do carro, me despedindo dos rapazes que continuam dentro do mesmo.
- Roger, não faça mais besteiras assim, ok? - Brian diz e sem me dar chances para responder, acelera.
Fico plantado ali na calçada por um tempo observando o carro se afastar até sumir de vista, sem dúvidas a manhã havia sido conturbada, mas algo tomava mais ainda os meus pensamentos.
Afinal de contas, como ele sabia o meu nome?
•••
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FIRST | maylor
Fanfiction[CONCLUÍDA] Depois de um trauma quando mais jovem, a vida de Roger Taylor nunca mais foi a mesma. Mas um incidente turbulento traz para sua vida não só um para-choque danificado, mas um pouco de luz no meio da sua escuridão, respostas para um pas...