Capítulo 19 - As Palavras da Cigana

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O torpor foi abandonando meu corpo lentamente e eu senti que ia ficando mais desperta.

A primeira coisa que me atingiu foi a pontada em minha perna. Eu me remexi, formando uma careta em meu rosto. Aquele não era um jeito muito bom de acordar.

A segunda coisa foi que eu estava aquecida. A sensação era diferente do frio que minhas roupas molhadas e o ambiente gelado da casa de espelhos me proporcionavam. Abri os olhos devagar, me acostumando à claridade, e percebi que estava dentro do meu saco de dormir, o zíper fechado.

Notei, no mesmo olhar, que o local era o mesmo. Ainda estávamos na casa, a flor havia desaparecido dali e eu podia escutar a chuva martelando acima de nós. Vi outros sacos de dormir em minha frente e meus amigos adormecidos.

Abri o zíper do meu para ficar sentada.

— Hey... — o chamado me interrompeu.

Ergui as sobrancelhas e virei o rosto rapidamente para o outro lado, em direção a voz. Elliot estava ao meu lado, sentado com as canelas cruzadas. Eu não o tinha notado ali.

— Como você está? — perguntou ele quando recebeu minha atenção, sua expressão era tranquila e nada comparada à de quando estava sob a hipnose de seu próprio reflexo.

Me senti aliviada por ver seus olhos em foco.

— Bem… — respondi em voz baixa, mordendo o lábio quando por fim fiquei sentada e minha perna reclamou da pressão que a posição fez no ferimento. Mas eu ignorei. O olhei, analisando-o. — É tão bom ter você de volta ao normal…

Ele inclinou a cabeça, erguendo uma sobrancelha, mas sorriu para mim. Só aí eu me dei conta de que tinha dito o pensamento em voz alta e pigarreei, constrangida.

Deuses, eu só piorava tudo...

— É? — ele insistiu quando percebeu que eu não falaria mais nada, o sorriso nunca deixando seu rosto sereno e, agora, iluminado. Ele se aproximou mais, ficando a menos de um braço de distância.

Ele parecia tão satisfeito com o que eu havia dito que eu me obriguei a não desapontar aquele rosto.

— Sim… claro — murmurei, dando de ombros para tentar soar o mais casual possível, mas minha voz era nervosa. — Estou feliz por todos estarem bem. Me importo com cada um.

Elliot assentiu, mas sua expressão não desmoronou nem um pouco apesar de eu ter incluído todos do grupo e não só ele. Eu não sabia se esse era um bom ou mau sinal.

Depois desse dia eu não sabia mais de nada em relação à ele e ao Rafael. Estava tudo muito bagunçado na minha cabeça até agora e pensar tornava as idéias ainda mais emaranhadas.

Suspirei baixo, desviando o olhar e, distraída, toquei minha perfuração na coxa. Senti um curativo ali, mas depois meus dedos se moveram e percebi que minha pele estava exposta demais.

Franzi a testa.

— Elliot… — eu chamei e abaixei o olhar para a peça de roupa que eu vestia no lugar da calça. Era um short de algodão que eu havia trago, mas que depois não havia mais cogitado usar por conta do frio. Porém, lá estava ele, facilitando a visão do curativo em minha coxa. Olhei de volta para o semideus, desconfiada. — Quem me vestiu com isso?

Ele começou a rir, de meu tom sério ou da minha expressão, eu não sabia, mas eu abri bem os olhos, chocada e sentindo a vergonha aos poucos avermelhar minha expressão com a possibilidade.

— Você?…

— Calma, calma — ele me tranquilizou imediatamente agitando as mãos. — Não fui eu que troquei suas roupas, não se preocupe. Nathália e Marina colaboraram entre si para isso e o restante de nós ficou afastado. Tudo isso aconteceu depois que, infelizmente, Mackenzie e as outras duas conseguiram fugir. — explicou, me deixando mais aliviada apesar da leve frustração pela fuga das três problemáticas. Porém seu sorriso ficou preocupado. — Só que… precisei cortar sua calça para tratar do ferimento antes disso então, hã, receio que ela não esteja mais própria para uso.

Os Olhos da CorujaOnde histórias criam vida. Descubra agora