Sobre uma tarde de conflitos

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Addison




Eu não a disse toda a verdade, como poderia?

O carro se movia pela avenida rapidamente durante aquela tarde tranquila, quase agradável. Dirigia até o colégio onde Jason estudava para obter alguma informação sobre aquela nova droga, e enquanto o meu destino estava cada vez mais próximo, cada vez menos eu me focava no caso. Por alguma razão, eu estava mais impaciente do que o normal. Aquela conversa no laboratório ainda soava em meus ouvidos tirando minha atenção de tudo; se Cavanaugh não tivesse telefonado para Meredith naquele momento, eu não sei o que poderia ter acontecido.

Minha noite, ela queria saber como foi minha noite... Foi péssima, repleta de sonhos confusos e conflitantes. As imagens do caso que viam em meus sonhos foram substituídas pela minha melhor amiga, e agora meu coração grita, afunda e já não sei o quanto isto é ruim. Sonhar com Meredith nua em seus braços era algo perto, talvez da loucura.

E no laboratório eu não consegui deixar de observa-la discretamente, observava aquele rosto delicado carregado por uma possível ressaca, ouvia sua voz e seus termos técnicos sem muito sentido para mim, até mesmo reparo em seus gestos espontâneos e isso traz de volta as imagens dos meus sonhos como se fosse um gatilho me agitando, me desorientando, me consumindo como fogo.

Será isto desejo?

Isto era bem errado, definitivamente errado... Eu não poderia ter desejos pela Meredith, não por ela! Seria um prelúdio para o fim da nossa amizade, o fim de tudo para mim.

"Estamos perto e você não disse uma única palavra desde que saímos Montgomery, não sabia que era tão silenciosa assim." Ouço a voz da detetive de nome estranho me trazendo de volta para a realidade.

"O quer que eu fale?" Indaguei totalmente com preguiça de fazer amizades ou algo do tipo. "De como você se intrometeu na minha investigação."

Ela ri baixo.

Ana Athanasiadis não possuía apenas um nome de ascendência grega, ela parecia uma daquelas deusas das estátuas que eu costumava ver em museus. Os largos cachos de seu cabelo castanho se movimentavam lentamente por cima de seus ombros enquanto o sol era refletido em seus óculos escuros. Nunca a tinha visto no departamento de polícia antes, nem sequer tinha ouvido falar sobre ela.

"Só sigo ordens superiores." A vi erguer levemente uma de suas sobrancelhas perfeitas. "E já que não há o que eu ou você possamos fazer, é mais fácil tentar deixar o ambiente mais amigável, não acha?"

"Tanto faz." Dei de ombros, enquanto virava o carro em uma esquina.

"Já que é assim vou perguntar algo que sempre me deixou curiosa." Ela continuou. "Sabe me dizer se a Dra. Grey está solteira?"

Pisei rapidamente no freio, sentindo o carro parar como uma âncora quando atinge ao chão.

"Que merda de pergunta é esta?" Questionei bruscamente. "Desculpa estragar seus planos, mas se ela é solteira ou não é uma questão dela, além disso, Meredith se interessa apenas por homens."

Athanasiadis destravou o cinto e logo após retirou os óculos escuros, foi quando percebi que ao lado de suas íris madeiradas tinha uma pequena pinta marrom.

"Acho que não só por homens." Ela disse.

"Ok, o que está insinuando? Você nem a conhece."

"E pelo visto, você também não."

Suas palavras me cortaram como o aço de uma faca; fico parada, muda a vendo descer do carro e caminhar para o colégio à frente.

Athanasiadis tinha razão, eu não conhecia Meredith, eu achava que a conhecia, mas vejo que ela possui lados que eu nunca quis saber e talvez por isto, ela nunca me mostrou. Aquilo apenas me desorienta ainda mais; primeiro Derek e, agora Ana sem contar por mim mesma.

Quando foi que Meredith se tornou a fêmea alfa de Boston?

Ao entrar no colégio a própria diretora nos recebeu com um sorriso gentil e um olhar preocupado. Entramos em sua sala, enquanto ela continuava falando das dificuldades de manter adolescentes na linha hoje em dia.

"Jason." Ela falava com a voz de senhora que possuía. "Era um garoto bom, nunca veio em minha sala, diferente de alguns dos seus colegas que estava aqui quase todos os dias. Não me lembro de os professores reclamarem dele." Vi um pequeno sorriso em seus lábios enquanto ouvia o som da caneta de Athanasiadis anotando em seu pequeno caderno.

"Ele nunca foi agressivo com algum colega ou professor? Não sabe se ele perdia a cabeça com facilidade ou algo do tipo?" Questionei e a diretora encarou suas próprias mãos sobre a mesa pensando sobre a minha pergunta.

"Detetive, qual adolescente de 13 anos não perde a cabeça hoje em dia?" Ela se voltou para mim com o olhar cansado. "Estou a mais de 10 anos nesta profissão e vi muita coisa, mas neste colégio tudo é motivo para se perder a cabeça."

Foi neste instante que ouvi o primeiro som, curto e abafado pelas cortinas daquela sala. Os olhos de Athanasiadis cresceram sobre mim em uma pergunta silenciosa, e novamente outro som ecoou me fazendo levantar rapidamente da cadeira buscando a minha arma guardada no coldre. Saio pela sala em silêncio direto para o local de onde aquele som, que eu conhecia muito bem, ecoou pela última vez.

Chego ao pátio e sinto um tremor em minhas pernas. A detetive da narcóticos assume a dianteira com sua arma apontada para o autor daqueles disparos. Um garoto magro e pequeno erguia um revólver diretamente para o rosto de uma aluna ajoelhada a sua frente, enquanto outros alunos se agrupavam em desespero em um dos cantos do muro.

"Céus, é o Mike!" A diretora atrás de mim sussurrou, aflita.

"Hey garoto!" Ana gritou. "Polícia de Boston, baixa a arma."

O menino chamado Mike parecia estar surdo. Não importava o quanto Athanasiadis gritasse ele continuava com toda a atenção para a garota loira ajoelhada.

"Mike?" O chamei dando alguns passos para frente "É Mike seu nome certo? Eu sou a detetive Montgomery e está é minha colega Athanasiadis, queremos conversar com você."

"Eu avisei, eu pedi que parassem, mas eles não pararam!" Mike gritou ainda ignorando a minha presença. "Mas eles continuaram... eu só quero explodir a cabeça de cada um." Ele continuava de forma tremula e agressiva e eu sabia que, a qualquer momento, ele poderia disparar outra vez.

"É eu sei, é uma droga o que fizeram eu te entendo Mike, podemos conversar melhor sobre isto não acha?"

Dei mais um passo à frente e finalmente vi o sangue escorrer do corpo deitado atrás de Mike.

"Montgomery!" Ouvi a voz de Athanasiadis atrás de mim como um aviso para eu recuar, mas eu não podia recuar. Ainda mais quando a garota de joelhos chorava sem tréguas e um garoto descontrolado estava ameaçando em explodir sua cabeça.

"Não... Não quero conversar." Mike dizia por entre os dentes apertando cada vez mais o revólver em sua mão.

"Vamos lá Mike, tem duas policiais aqui e só queremos te ouvir, então por que não baixa a arma e venha com a gente?" Tentava manter minha voz o melhor que possível, eu tentava manter minhas mãos e pernas firmes, mas por dentro, eu oscilava entre o medo e a certeza do que eu estava fazendo era o certo. Eu poderia acertar Mike e liberar a garota, ou até mesmo Ana era capaz de acerta-lo, mas eu não queria ver outro adolescente morto, não em uma mesma semana, nem naquele dia.

Finalmente, Mike olhou para mim e o que eu vi em seus olhos foi um enorme vazio se preenchendo com a fúria e ódio. Aquele garoto pequeno poderia ter a força e a motivação para derrubar um trem ou atravessar uma parede sem problemas, um garoto pequeno que com um olhar conseguiu me deixar com medo.

"Quer saber policial... Foda-se!"

Ele apontou para mim e disparou.

Por instinto apertei o meu gatilho ao mesmo tempo e imediatamente senti o cheiro da pólvora. Não apenas isso, mas algo puxou o meu braço me fazendo perder a segurança em minhas pernas me levando ao chão. Respirei cansada ouvindo a voz distante de Athanasiadis me chamar e então esperei pela dor, mas ela não veio. Apenas senti o líquido quente escorrer do meu abdômen, senti a ânsia e a sede se misturar, senti a necessidade de olhos esverdeados e um sorriso ingênuo, senti a necessidade do seu toque, do som de voz e do seu perfume.

"Mer..." Sussurrei totalmente rendida aquela onda de sentimentos.

Depois não senti mais nada.

O Elixir | MEDDISONOnde histórias criam vida. Descubra agora